Melhor Álbum Português
Asteroid Fighters Tomo 1 O Início, Rui Lacas, Edições ASA
Melhor Argumento de Autor Português
Filipe Melo, As Incríveis Aventuras de Dog Mendonça e PizzaBoy, Tinta da China
Melhor Desenho de Autor Português
Filipe Andrade, BRK Tomo 1, Edições ASA
Melhor Álbum de Autor Português em Língua Estrangeira
Celibataires, Nelson Martins, Joker Editions
Melhor Álbum de Autor Estrangeiro
Os Passageiros do Vento Tomo 6 A Menina de Bois-Caiman Livro 1, Bourgeon, Edições ASA
Melhor Álbum de Tiras Humorísticas
Zits Paixão e outros usos para Hormonas em excesso, Jerry Scott e Jim Borgman, Gradiva
Melhor Ilustração para Livro Infantil
Richard Câmara, O Homem que ia contra as Portas, Everest Editora
Prémio Clássicos da 9ª Arte
Corto Maltese - Mü A Cidade Perdida, Hugo Pratt, Edições ASA
Melhor Fanzine
Cadernos Moura BD - Fernando Bento, Carlos Rico e Luiz Beira, Câmara Municipal de Moura
Troféu de Honra
António Gomes de Almeida
▼
31/10/2010
30/10/2010
Ric Hochet #78 – À la poursuite du griffon d’or
André-Paul Duchateu (argumento)
Tibet (desenho)
Éditions du Lombard (Bélgica, Outubro de 2010)
222 x 295 mm, 48 p., cor, cartonado
Se geralmente um álbum de banda desenhada é valorizado pela sua história – seja pela sua originalidade, seja pela forma como está escrito - e/ou pelo seu desenho – a sua qualidade gráfica, a sua originalidade mais uma vez, as técnicas e estilos adoptados – este 78º tomo das aventuras de Ric Hochet vale mais como um documento.
29/10/2010
Nas bancas
Títulos que já estão ou estarão em breve nas bancas portuguesas:
Panini Brasil
DC Comics
Batman #88
Superman #88
Liga da Justiça #87
Superman & Batman #56Este é o último número da revista “Superman & Batman” que chegou a ter o mix mais interessante de todas as que são distribuídas em Portugal. O seu fim está incluído nas diversas trabsformações (alteração do número de páginas, do preço e dos conteúdos) que as revistas Panini sofreram na sua origem, no Brasil, há poucos meses, como em breve poderemos comprovar nas nossas bancas.
Para já, na lista de edições previstas para o próximo mês o desaparecimento deste título não foi compensado pelo inclusão de nenhum outro.
Marvel
Homem-Aranha #99
Os Novos Vingadores #74
X-Men #99
Avante Vingadores #38
Universo Marvel #56
Wolverine #63
Turma da MónicaMônica #40
Cebolinha #40
Cascão #40
Chico Bento #40
Magali #40
Ronaldinho Gaúcho e Turma da Mônica #40
Turma da Mônica – Uma aventura no parque #40
Almanaque da Magali #20
Almanaque do Chico Bento #20
Almanaque do Penadinho #7
Turma da Mônica – Clássicos do Cinema #19 – Magalice no País das Melancias
Maurício Apresenta #9 – Turma da Mônica em todas as Copas do Mundo – parte 1
Turma da Mónica – Saiba mais #31 – Páscoa
Turma da Mônica Jovem #22
Mythos EditoraTex 460
Tex Colecção #252
Os Grandes Clássicos de Tex #22
Almanaque Tex #35
Tex Gigante – Reedição #1
Zagor Especial #25
Zagor Extra #73
Zagor #109
J. Kendall - Aventuras de uma criminóloga #66
Mágico Vento #95
Conan o Bárbaro #76 (último número)
Editora Europa
Mundo dos Super-Heróis #20
X-Men, 1988-2000, Joe Kubert , Fantasma de A a Z, Gavião Negro, Rom, Exterminador, Entrevista: Will Conrad , Heróis BR: a carreira do editor Minami Keizi , Clássicos da Era de Ouro: Stardust
Panini PortugalEspetacular Homem-Aranha #4
Panini Brasil
DC Comics
Batman #88
Superman #88
Liga da Justiça #87
Superman & Batman #56Este é o último número da revista “Superman & Batman” que chegou a ter o mix mais interessante de todas as que são distribuídas em Portugal. O seu fim está incluído nas diversas trabsformações (alteração do número de páginas, do preço e dos conteúdos) que as revistas Panini sofreram na sua origem, no Brasil, há poucos meses, como em breve poderemos comprovar nas nossas bancas.
Para já, na lista de edições previstas para o próximo mês o desaparecimento deste título não foi compensado pelo inclusão de nenhum outro.
Marvel
Homem-Aranha #99
Os Novos Vingadores #74
X-Men #99
Avante Vingadores #38
Universo Marvel #56
Wolverine #63
Turma da MónicaMônica #40
Cebolinha #40
Cascão #40
Chico Bento #40
Magali #40
Ronaldinho Gaúcho e Turma da Mônica #40
Turma da Mônica – Uma aventura no parque #40
Almanaque da Magali #20
Almanaque do Chico Bento #20
Almanaque do Penadinho #7
Turma da Mônica – Clássicos do Cinema #19 – Magalice no País das Melancias
Maurício Apresenta #9 – Turma da Mônica em todas as Copas do Mundo – parte 1
Turma da Mónica – Saiba mais #31 – Páscoa
Turma da Mônica Jovem #22
Mythos EditoraTex 460
Tex Colecção #252
Os Grandes Clássicos de Tex #22
Almanaque Tex #35
Tex Gigante – Reedição #1
Zagor Especial #25
Zagor Extra #73
Zagor #109
J. Kendall - Aventuras de uma criminóloga #66
Mágico Vento #95
Conan o Bárbaro #76 (último número)
Editora Europa
Mundo dos Super-Heróis #20
X-Men, 1988-2000, Joe Kubert , Fantasma de A a Z, Gavião Negro, Rom, Exterminador, Entrevista: Will Conrad , Heróis BR: a carreira do editor Minami Keizi , Clássicos da Era de Ouro: Stardust
Panini PortugalEspetacular Homem-Aranha #4
28/10/2010
J. Kendall #66
Giancarlo Berardi, Giuseppe De Nardo e Lorenzo Calza (argumento)
Mario Janni (desenho)
Mythos Editora (Brasil, Maio de 2010)
135 x 178 mm, 132 p., pb, brochado, mensal
Resumo
O cadáver de um jovem, encontrado no apartamento que partilhava com um amigo, leva a polícia de Garden City a recorrer mais uma vez aos préstimos da criminóloga Julia Kendall.
27/10/2010
Baron Samedi - L'enfant de la mort
Dog Baker (argumento e desenho)
(Treize étrange) (França, Outubro de 2010)
170 x 250 mm, 144 p., cor, cartonado
Resumo
Tudo começa num pequena aldeia, algures na América do Sul, num dia ensolarado, quando um casamento, cujas festividades decorrem ao som do tango, é interrompido pela chegada de mercenários ao serviço do governo francês. O seu objectivo é expulsar os moradores para explorarem uma mina de urânio no local. A recusa de saída provoca um massacre com um único sobrevivente, um rapazinho de 5 ou 6 anos.
(Treize étrange) (França, Outubro de 2010)
170 x 250 mm, 144 p., cor, cartonado
Resumo
Tudo começa num pequena aldeia, algures na América do Sul, num dia ensolarado, quando um casamento, cujas festividades decorrem ao som do tango, é interrompido pela chegada de mercenários ao serviço do governo francês. O seu objectivo é expulsar os moradores para explorarem uma mina de urânio no local. A recusa de saída provoca um massacre com um único sobrevivente, um rapazinho de 5 ou 6 anos.
26/10/2010
A Fórmula da Felicidade Vol. 2 de 2
Nuno Duarte (argumento)
Osvaldo Medina (desenho)
Gisela Martins (cor, com Ana Freitas, patrícia Furtado, Sara Ferreira e Filipe Teixeira)
Kingpin Comics (Portugal, Março de 2010)
210 x 297 mm, cor, 48 p., brochado com badanas
Resumo
Após descobrir a fórmula da felicidade instantânea, que faz efeito imediato em quem o ouvir lê-la, Victor, apesar da aparente realização pessoal e da fama que conseguiu, mergulha numa espiral descendente, cada vez mais sozinho apesar da multidão (desejosa…) que o rodeia.
Ao mesmo tempo, o planeta caminha a passos largos para uma guerra entre católicos e muçulmanos que o poderá destruir e para a qual Victor parece ser a única solução.
Desenvolvimento
Se o primeiro tomo de A Fórmula da Felicidade foi uma das maiores surpresas da banda desenhada do final de 2008 (e dos últimos anos), este segundo tomo, se por um lado era muito aguardado, por outro era também receado. No primeiro caso, como resultado natural da expectativa que a boa qualidade de argumento e desenho do volume inicial criaram. No segundo, por se temer que a continuação (e conclusão) não estivesse à altura da primeira parte.
E a primeira constatação, é que os receios se revelaram sem fundamento e que as expectativas se cumpriram. Possivelmente porque a (re)solução encontrada por Nuno Duarte para a história se, por um lado, era a mais óbvia, por outro era também a mais coerente. Até porque a solução oposta (em termos de final) seria uma traição ao tom apesar de tudo realista desta fábula dos tempos modernos, narrada com animais antropomórficos e belas imagens, apesar do seu tom maioritariamente negro.
O “novo” Victor, transformado em guru da moda e milagreiro de trazer por casa, com todos os tiques de vedeta (mediática) daí recorrentes, devidamente explorado por uma sociedade com fins lucrativos, se por um lado se tornou o centro das atenções, por outro está cada vez mais só, procurando no sexo pago e na violência sobre as companheiras ocasionais, respostas e a felicidade (ilusória) que a sua fórmula não lhe transmite. Sexo pago e violência que se revelam apenas o equivalente à droga que a mãe consumia e ele condenava, apenas um substituto temporário e cada vez menos eficaz das suas verdadeiras necessidades: amizade, compreensão, amor. Mais, Victor afasta aqueles que, de alguma forma, ainda lhe propõem uma amizade desinteressada e isenta ao recusar-se a ouvir as (incómodas) verdades que eles têm para lhe dizer.
Com estes pressupostos, Nuno Duarte traça para Victor o inevitável percurso descendente cujo resultado só poderia ser a perda completa, se pelo meio não surgisse uma hipótese de redenção. Redenção que Victor vai ter que procurar no fundo de si próprio, não em palavras (ocas ou não) de outros. Redenção que vai ter que encontrar nas suas recordações, nos seus sentimentos, nas suas origens, mas que só vai conseguir (tarde demais?) quando consegue finalmente relacionar-se com aqueles que, de alguma forma, sempre procurou afastar, seja o pai desconhecido, os amigos ou a bela Cláudia, paixão de infância que evoca quase tantas recordações boas quanto más.
Redenção que encontra quando revela ao mundo que a felicidade não está ao alcance de todos num simples papel, livro ou pessoa – uma carapuça bem grande que tantos deveriam enfiar… - mas tem que ser conquistada, através das decisões que – consciente e responsavelmente - vamos tomando ao longo da vida.
A reter
- A forma como o argumento de Nuno Duarte correspondeu às expectativas geradas pela boa primeira parte da história.
- O excelente desenho de Osvaldo Medina, bonito no traço e na cor, eficaz na forma.
Menos conseguido
- A mudança de papel da capa da edição em relação ao primeiro tomo. O papel de gramagem superior e com textura rugosa dá uma outra consistência ao objectivo livro, valorizando-o e tornando-o até mais credível.
- Eu sei que o mercado é pequeno, que a distribuição é a praga que mata os editores, que cada vez mais há mais gente que não paga o que deve (entenda-se os livros que recebe e vende), mas uma tiragem de apenas 400 exemplares parece-me demasiado curta. Ainda para mais, numa obra com tudo o que é necessário - boa história, boa arte, boa edição - para ser comercialmente viável.
Osvaldo Medina (desenho)
Gisela Martins (cor, com Ana Freitas, patrícia Furtado, Sara Ferreira e Filipe Teixeira)
Kingpin Comics (Portugal, Março de 2010)
210 x 297 mm, cor, 48 p., brochado com badanas
Resumo
Após descobrir a fórmula da felicidade instantânea, que faz efeito imediato em quem o ouvir lê-la, Victor, apesar da aparente realização pessoal e da fama que conseguiu, mergulha numa espiral descendente, cada vez mais sozinho apesar da multidão (desejosa…) que o rodeia.
Ao mesmo tempo, o planeta caminha a passos largos para uma guerra entre católicos e muçulmanos que o poderá destruir e para a qual Victor parece ser a única solução.
Desenvolvimento
Se o primeiro tomo de A Fórmula da Felicidade foi uma das maiores surpresas da banda desenhada do final de 2008 (e dos últimos anos), este segundo tomo, se por um lado era muito aguardado, por outro era também receado. No primeiro caso, como resultado natural da expectativa que a boa qualidade de argumento e desenho do volume inicial criaram. No segundo, por se temer que a continuação (e conclusão) não estivesse à altura da primeira parte.
E a primeira constatação, é que os receios se revelaram sem fundamento e que as expectativas se cumpriram. Possivelmente porque a (re)solução encontrada por Nuno Duarte para a história se, por um lado, era a mais óbvia, por outro era também a mais coerente. Até porque a solução oposta (em termos de final) seria uma traição ao tom apesar de tudo realista desta fábula dos tempos modernos, narrada com animais antropomórficos e belas imagens, apesar do seu tom maioritariamente negro.
O “novo” Victor, transformado em guru da moda e milagreiro de trazer por casa, com todos os tiques de vedeta (mediática) daí recorrentes, devidamente explorado por uma sociedade com fins lucrativos, se por um lado se tornou o centro das atenções, por outro está cada vez mais só, procurando no sexo pago e na violência sobre as companheiras ocasionais, respostas e a felicidade (ilusória) que a sua fórmula não lhe transmite. Sexo pago e violência que se revelam apenas o equivalente à droga que a mãe consumia e ele condenava, apenas um substituto temporário e cada vez menos eficaz das suas verdadeiras necessidades: amizade, compreensão, amor. Mais, Victor afasta aqueles que, de alguma forma, ainda lhe propõem uma amizade desinteressada e isenta ao recusar-se a ouvir as (incómodas) verdades que eles têm para lhe dizer.
Com estes pressupostos, Nuno Duarte traça para Victor o inevitável percurso descendente cujo resultado só poderia ser a perda completa, se pelo meio não surgisse uma hipótese de redenção. Redenção que Victor vai ter que procurar no fundo de si próprio, não em palavras (ocas ou não) de outros. Redenção que vai ter que encontrar nas suas recordações, nos seus sentimentos, nas suas origens, mas que só vai conseguir (tarde demais?) quando consegue finalmente relacionar-se com aqueles que, de alguma forma, sempre procurou afastar, seja o pai desconhecido, os amigos ou a bela Cláudia, paixão de infância que evoca quase tantas recordações boas quanto más.
Redenção que encontra quando revela ao mundo que a felicidade não está ao alcance de todos num simples papel, livro ou pessoa – uma carapuça bem grande que tantos deveriam enfiar… - mas tem que ser conquistada, através das decisões que – consciente e responsavelmente - vamos tomando ao longo da vida.
A reter
- A forma como o argumento de Nuno Duarte correspondeu às expectativas geradas pela boa primeira parte da história.
- O excelente desenho de Osvaldo Medina, bonito no traço e na cor, eficaz na forma.
Menos conseguido
- A mudança de papel da capa da edição em relação ao primeiro tomo. O papel de gramagem superior e com textura rugosa dá uma outra consistência ao objectivo livro, valorizando-o e tornando-o até mais credível.
- Eu sei que o mercado é pequeno, que a distribuição é a praga que mata os editores, que cada vez mais há mais gente que não paga o que deve (entenda-se os livros que recebe e vende), mas uma tiragem de apenas 400 exemplares parece-me demasiado curta. Ainda para mais, numa obra com tudo o que é necessário - boa história, boa arte, boa edição - para ser comercialmente viável.
25/10/2010
War Songs
Ivan Brun (argumento e desenho)
Drugstore (França, Setembro de 2010)
215 x 293 mm, 64 p., cor, cartonado
Quais os sons que associámos à palavra ‘guerra’? Gritos de dor, raiva, medo, aflição? Estampidos de bombas, tiros, carros de combate? Assobios de balas, mísseis, aviões? Rajadas de metralhadora, tiros de pistola, disparos de tanques? War Songs é um álbum mudo.
Que imagens associamos à palavra ‘guerra’? Justas medievais? Índios contra cowboys? Combates nas trincheiras? Bombardeamentos e destruição em massa? War Songs é um álbum sobre a invasão do Iraque, sobre as guerras mediáticas e sofisticadas actuais, sobre o terrorismo e (algumas d)as suas causas.
Um álbum só com imagens, sem uma única palavra, embora haja balões com símbolos cuja leitura é universal: comida, dinheiro, alvos, destruição…
Um álbum que conta uma história – igual a tantas histórias – de alguém empurrado para o terrorismo pelas desigualdades mundiais e sociais, pela opressão de um povo, pela força do único poder que hoje em dia existe: o poder do dinheiro, o poder da economia.
Uma história dividida por pequenos episódios, de ritmos diversificados, ao longo dos quais vamos conhecendo o protagonista, o meio em que vive, as necessidades que passa, as diferentes opções que ele e os seus conterrâneos fazem: trabalhar ou lutar, cumprir ou desobedecer…
Pequenos episódios que vão mostrando diferenças que tantas vezes tentamos esquecer: que muitos cães (literalmente) ocidentais comem mais e melhor do que seres humanos de países do terceiro mundo; que as opções correctas nem sempre são (ou parecem…) as mais certas; que são cometidas muitas injustiças quando se usam estereótipos para classificar todos por igual; que a guerra estampada nos jornais e televisões muitas vezes soa asséptica e inconsequente, fazendo esquecer que as vítimas são seres humanos como nós; que por muito bem-intencionada (se isso é possível) que seja uma invasão, quase sempre o quotidiano dos invadidos tende a ficar (bem) pior, apesar de “libertados”.
War Songs – não finalmente, mas para concluir este texto – é um álbum incómodo, que obriga a (re)leitura atenta e a meditar no que se leu, porque quase todas as suas perguntas ficam sem resposta, porque as acusações que faz – a ambos os lados, note-se – são justas e pertinentes.
A reter
- A (triste) actualidade do tema.
- A força de algumas imagens – algumas chocantes até – que incomodam e não deixam o leitor indiferente, apesar da ingenuidade aparente do traço naif com um toque de anime.
Menos conseguido
- A contextualização do álbum na invasão do Iraque o que lhe retira o impacto que uma localização “anónima” poderia ter.
- A dificuldade de interpretação de algumas das imagens (demasiado complexas) utilizadas nos balões, o que retira fluidez à leitura.
Drugstore (França, Setembro de 2010)
215 x 293 mm, 64 p., cor, cartonado
Quais os sons que associámos à palavra ‘guerra’? Gritos de dor, raiva, medo, aflição? Estampidos de bombas, tiros, carros de combate? Assobios de balas, mísseis, aviões? Rajadas de metralhadora, tiros de pistola, disparos de tanques? War Songs é um álbum mudo.
Que imagens associamos à palavra ‘guerra’? Justas medievais? Índios contra cowboys? Combates nas trincheiras? Bombardeamentos e destruição em massa? War Songs é um álbum sobre a invasão do Iraque, sobre as guerras mediáticas e sofisticadas actuais, sobre o terrorismo e (algumas d)as suas causas.
Um álbum só com imagens, sem uma única palavra, embora haja balões com símbolos cuja leitura é universal: comida, dinheiro, alvos, destruição…
Um álbum que conta uma história – igual a tantas histórias – de alguém empurrado para o terrorismo pelas desigualdades mundiais e sociais, pela opressão de um povo, pela força do único poder que hoje em dia existe: o poder do dinheiro, o poder da economia.
Uma história dividida por pequenos episódios, de ritmos diversificados, ao longo dos quais vamos conhecendo o protagonista, o meio em que vive, as necessidades que passa, as diferentes opções que ele e os seus conterrâneos fazem: trabalhar ou lutar, cumprir ou desobedecer…
Pequenos episódios que vão mostrando diferenças que tantas vezes tentamos esquecer: que muitos cães (literalmente) ocidentais comem mais e melhor do que seres humanos de países do terceiro mundo; que as opções correctas nem sempre são (ou parecem…) as mais certas; que são cometidas muitas injustiças quando se usam estereótipos para classificar todos por igual; que a guerra estampada nos jornais e televisões muitas vezes soa asséptica e inconsequente, fazendo esquecer que as vítimas são seres humanos como nós; que por muito bem-intencionada (se isso é possível) que seja uma invasão, quase sempre o quotidiano dos invadidos tende a ficar (bem) pior, apesar de “libertados”.
War Songs – não finalmente, mas para concluir este texto – é um álbum incómodo, que obriga a (re)leitura atenta e a meditar no que se leu, porque quase todas as suas perguntas ficam sem resposta, porque as acusações que faz – a ambos os lados, note-se – são justas e pertinentes.
A reter
- A (triste) actualidade do tema.
- A força de algumas imagens – algumas chocantes até – que incomodam e não deixam o leitor indiferente, apesar da ingenuidade aparente do traço naif com um toque de anime.
Menos conseguido
- A contextualização do álbum na invasão do Iraque o que lhe retira o impacto que uma localização “anónima” poderia ter.
- A dificuldade de interpretação de algumas das imagens (demasiado complexas) utilizadas nos balões, o que retira fluidez à leitura.
24/10/2010
‘Palabéns’ Cebolinha!
Foi há 50 anos já, que chegou à Rua do Limoeiro um certo Cebolinha, baixinho, com apenas cinco fios de cabelo e já com a característica dificuldade de pronunciar os “rr”. Nessa primeira aparição, ainda nas tiras protagonizadas por Bidú (o cãozinho azul nascido em Julho de 1959), saía de uma casota de cão, e revelava a tendência para ferver em pouca água que o acompanharia ao longo dos anos. Mais tarde, viria a saber-se que a sua camisa era verde, os calções negros e os sapatos castanhos, “uniforme” que usaria quase sempre.
Alguns, adivinham em ilustrações anteriores – e numa história de uma página com o seu nome – a “pré-história” (mais cabeluda) do Cebolinha, mas foi nas tiras de jornal que Maurício vendia para diversos jornais brasileiros que se viria a afirmar como uma das mais populares criações dos quadradinhos brasileiros, com direito a revista própria a partir de 1973 e participação em inúmeros filmes, desenhos animados, peças de teatro e artigos de merchandising.
Quando apareceu, não sabia ainda, mas viria a ser adepto do Palmeiras e o “dono da rua” (ou da “lua”, como ele dizia), pelo menos até uma certa Mônica, que nasceria três anos depois, assumir o protagonismo que faria com que o seu nome fosse dado por Maurício de Sousa à turma que foi desenvolvendo com ternura e humor, baseado nos filhos e naqueles que o rodeavam. Como aconteceu com Cebolinha, alter-ego de alguém que o desenhador conheceu na sua infância em Mogi das Cruzes.
Ultrapassado pela “baixinha dentuça”, depois desse dia, nada ficou igual para o Cebolinha, que, julgando-se mais inteligente do que todos, passou a ocupar o tempo a inventar planos infalíveis, iguais no objectivo – derrotar a Mônica - e no resultado – acabar derrotado, quase sempre depois de levar com Sansão, o coelho de peluche dela.
Pelo menos, até o dia em que cresceu – corria já o mês de Agosto de 2008 – tornando-se jovem como a restante turma, numa existência paralela, pois o Cebolinha “pequeno” continua a divertir os seus leitores. Deixou o colorido – na prática voltou ao preto e branco original – e, agora em estilo manga (bd japonesa), chama-se só Cebola, só troca “rr” por “ll” quando está nervoso e passou a ter como objectivo conquistar o coração da antiga “inimiga”. Com ela, como reflexo de uma nova geração que Maurício quer conquistar, vive aventuras do dia-a-dia (e também outras mais fantásticas) e até já trocou alguns beijos.
E no futuro, quem sabe, se um dia o dese-nhador, já com 75 anos, decidir criar a Turma da Mônica Idosa, Cebolinha, voltando à infância, quase careca e já muito rezingão, pouco terá a mudar!
(Versão expandida do texto publicado no Jornal de Notícias de 24 de Outubro de 2010)
Alguns, adivinham em ilustrações anteriores – e numa história de uma página com o seu nome – a “pré-história” (mais cabeluda) do Cebolinha, mas foi nas tiras de jornal que Maurício vendia para diversos jornais brasileiros que se viria a afirmar como uma das mais populares criações dos quadradinhos brasileiros, com direito a revista própria a partir de 1973 e participação em inúmeros filmes, desenhos animados, peças de teatro e artigos de merchandising.
Quando apareceu, não sabia ainda, mas viria a ser adepto do Palmeiras e o “dono da rua” (ou da “lua”, como ele dizia), pelo menos até uma certa Mônica, que nasceria três anos depois, assumir o protagonismo que faria com que o seu nome fosse dado por Maurício de Sousa à turma que foi desenvolvendo com ternura e humor, baseado nos filhos e naqueles que o rodeavam. Como aconteceu com Cebolinha, alter-ego de alguém que o desenhador conheceu na sua infância em Mogi das Cruzes.
Ultrapassado pela “baixinha dentuça”, depois desse dia, nada ficou igual para o Cebolinha, que, julgando-se mais inteligente do que todos, passou a ocupar o tempo a inventar planos infalíveis, iguais no objectivo – derrotar a Mônica - e no resultado – acabar derrotado, quase sempre depois de levar com Sansão, o coelho de peluche dela.
Pelo menos, até o dia em que cresceu – corria já o mês de Agosto de 2008 – tornando-se jovem como a restante turma, numa existência paralela, pois o Cebolinha “pequeno” continua a divertir os seus leitores. Deixou o colorido – na prática voltou ao preto e branco original – e, agora em estilo manga (bd japonesa), chama-se só Cebola, só troca “rr” por “ll” quando está nervoso e passou a ter como objectivo conquistar o coração da antiga “inimiga”. Com ela, como reflexo de uma nova geração que Maurício quer conquistar, vive aventuras do dia-a-dia (e também outras mais fantásticas) e até já trocou alguns beijos.
E no futuro, quem sabe, se um dia o dese-nhador, já com 75 anos, decidir criar a Turma da Mônica Idosa, Cebolinha, voltando à infância, quase careca e já muito rezingão, pouco terá a mudar!
(Versão expandida do texto publicado no Jornal de Notícias de 24 de Outubro de 2010)
23/10/2010
Fernando Bento em Viseu
Depois de ter passado por Moura e pela Sobreda, abre hoje ao público, na Biblioteca Municipal D. Miguel da Silva, em Viseu, a exposição retrospectiva “Fernando Bento - Centenário do seu nascimento – Vida e Obra”. Iniciativa do GICAV com o apoio da câmara local, é composta por reproduções de algumas das suas obras mais significativas e ficará patente até dia 6 de Novembro, podendo ser visitada de segunda a sexta, entre as 8h30 e as 19h00, e aos sábados, entre as 13h00 e as 19h00.
No mesmo local, ainda hoje, às 15 horas será lançado o livro “Um campeão chamado Joaquim Agostinho”, que compila pela primeira vez a biografia aos quadradinhos do ciclista português, publicada originalmente em Agosto de 1973, no “Jornal da Volta”, suplemento do extinto jornal “A Capital”. A obra traça o perfil do campeão luso, desde a sua infância até à vitória na volta de 73, que posteriormente lhe seria retirada por doping.
Nome maior da banda desenhada portuguesa, Fernando Bento destacou-se na adaptação aos quadradinhos de episódios da História de Portugal e de clássicos da literatura, publicados maioritariamente nas revistas “Diabrete” e “Cavaleiro Andante”, entre 1940 e 1960. Curiosamente, os primeiros passos de Fernando Bento como desenhador foram dados nos anos 30 no jornal “Os Sports”, onde publicou caricaturas de ciclistas e ilustrações de temática desportiva.
No mesmo local, ainda hoje, às 15 horas será lançado o livro “Um campeão chamado Joaquim Agostinho”, que compila pela primeira vez a biografia aos quadradinhos do ciclista português, publicada originalmente em Agosto de 1973, no “Jornal da Volta”, suplemento do extinto jornal “A Capital”. A obra traça o perfil do campeão luso, desde a sua infância até à vitória na volta de 73, que posteriormente lhe seria retirada por doping.
Nome maior da banda desenhada portuguesa, Fernando Bento destacou-se na adaptação aos quadradinhos de episódios da História de Portugal e de clássicos da literatura, publicados maioritariamente nas revistas “Diabrete” e “Cavaleiro Andante”, entre 1940 e 1960. Curiosamente, os primeiros passos de Fernando Bento como desenhador foram dados nos anos 30 no jornal “Os Sports”, onde publicou caricaturas de ciclistas e ilustrações de temática desportiva.
(versão expandida do texto publicado no Jornal de Notícias de 23 de Outubro de 2010)
22/10/2010
Amadora BD 2010 (II)
Abre hoje as suas portas o 21ª edição do Amadora BD - Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora, que se prolonga até ao dia 7 de Novembro. São 17 dias, dezenas de autores e centenas de pranchas que mais uma vez trazem a festa dos quadradinhos até aquela cidade pois, para além do Fórum Luís de Camões, na Brandoa, onde se situa o núcleo central do evento, há mostras espalhadas por diversos equipamentos municipais.
A edição deste ano dá um grande destaque à 9ª arte nacional, ou não fosse o recente centenário da República o seu mote. Por isso, a principal exposição, “A I República na Génese da Banda Desenhada e no Olhar do Século XXI”, traça um retrato cronológico da forma como a BD, a caricatura e o cinema de animação anteciparam e têm mostrado a República ao longo de mais de 100 anos. Com a mesma temática, há também o making of de “É de noite que faço as perguntas”, uma narrativa ficcionada dos acontecimentos que levaram à queda da monarquia, escrita por David Soares e desenhada por Richard Câmara, Jorge Coelho, João Maio Pinto, André Coelho e Daniel Silvestre Silva. A par destas duas, destaque ainda para a retros-pectiva de Richard Câmara, autor do cartaz e da imagem gráfica do festival deste ano, e para a mostra que assinala o centenário de nascimento de Fernando Bento. As obras de Bernardo Carvalho (na Casa Roque Gameiro), Cristina Sampaio, e José Carlos Fernandes e Luís Henriques, premiadas em 2009, são também tema de exposições, bem como os trabalhos de Luís Diferr (“As Viagens de Lois – Portugal”, na Galeria Municipal Luís Bual) e Paulo Monteiro (“O Amor Infinito que te Tenho e Outras Histórias“).
Curiosa é a abordagem de “Lusofonia - A Nona Arte em Língua Portuguesa”, que, a partir das obras Nuno Saraiva (Portugal), Jô Oliveira (Brasil), Lindomar Sousa (Angola) e Zorito e Machado da Graça (Moçambique ), se propõe mostrar as particularidades da língua portuguesa falada em cada um deles.
No programa deste ano, no entanto, há duas falhas significativas: mais uma vez a quase total ausência de manga (bd japonesa) e de comics norte-americanos e a falta de nomes sonantes do panorama internacional, que seriam capazes de cativar o público (em especial os mais jovens) para ir descobrir a produção portuguesa. Os belgas François Schuiten e Benoit Peeters (distinguidos em 2009 pelo álbum “A Teoria do Grão de Areia, vol. 1) e, em menor escala, o norte-americano Sean Gordon Murphy (“Joe the Barbarian”) são as parcas excepções. Ou a um outro nível, Korky Paul, autor de “A Bruxa Mimi”, que faz sucesso entre os mais pequenos.
Para este primeiro fim-de-semana estão anunciadas as presenças de Schuiten e Peeters, Aude Samama, Alfonso Azpiri, Seri Aoi, Kim Hakhyun, João Mascarenhas, Paulo
Monteiro, Richard Câmara, Fil, David Soares, Fernando Dordio, Mário Freitas, Osvaldo Medina, Nuno
Duarte, Pedro Leitão, Ricardo Cabral, Carlos Páscoa, Joana Afonso, Luís Diferr e Rui Lacas, e programadas a apresentação dos livros “O menino Triste – Punk Redux”, de João Mascarenhas , e “Agentes do C.A.O.S.: A Conspiração Ivanov”, de Fernando Dordio, Filipe Teixeira e Mário Freitas.
Veja o programa completo do festival aqui.
(Versão expandida do texto publicado no Jornal de Notícias de 22 de Outubro de 2010)
A edição deste ano dá um grande destaque à 9ª arte nacional, ou não fosse o recente centenário da República o seu mote. Por isso, a principal exposição, “A I República na Génese da Banda Desenhada e no Olhar do Século XXI”, traça um retrato cronológico da forma como a BD, a caricatura e o cinema de animação anteciparam e têm mostrado a República ao longo de mais de 100 anos. Com a mesma temática, há também o making of de “É de noite que faço as perguntas”, uma narrativa ficcionada dos acontecimentos que levaram à queda da monarquia, escrita por David Soares e desenhada por Richard Câmara, Jorge Coelho, João Maio Pinto, André Coelho e Daniel Silvestre Silva. A par destas duas, destaque ainda para a retros-pectiva de Richard Câmara, autor do cartaz e da imagem gráfica do festival deste ano, e para a mostra que assinala o centenário de nascimento de Fernando Bento. As obras de Bernardo Carvalho (na Casa Roque Gameiro), Cristina Sampaio, e José Carlos Fernandes e Luís Henriques, premiadas em 2009, são também tema de exposições, bem como os trabalhos de Luís Diferr (“As Viagens de Lois – Portugal”, na Galeria Municipal Luís Bual) e Paulo Monteiro (“O Amor Infinito que te Tenho e Outras Histórias“).
Curiosa é a abordagem de “Lusofonia - A Nona Arte em Língua Portuguesa”, que, a partir das obras Nuno Saraiva (Portugal), Jô Oliveira (Brasil), Lindomar Sousa (Angola) e Zorito e Machado da Graça (Moçambique ), se propõe mostrar as particularidades da língua portuguesa falada em cada um deles.
No programa deste ano, no entanto, há duas falhas significativas: mais uma vez a quase total ausência de manga (bd japonesa) e de comics norte-americanos e a falta de nomes sonantes do panorama internacional, que seriam capazes de cativar o público (em especial os mais jovens) para ir descobrir a produção portuguesa. Os belgas François Schuiten e Benoit Peeters (distinguidos em 2009 pelo álbum “A Teoria do Grão de Areia, vol. 1) e, em menor escala, o norte-americano Sean Gordon Murphy (“Joe the Barbarian”) são as parcas excepções. Ou a um outro nível, Korky Paul, autor de “A Bruxa Mimi”, que faz sucesso entre os mais pequenos.
Para este primeiro fim-de-semana estão anunciadas as presenças de Schuiten e Peeters, Aude Samama, Alfonso Azpiri, Seri Aoi, Kim Hakhyun, João Mascarenhas, Paulo
Monteiro, Richard Câmara, Fil, David Soares, Fernando Dordio, Mário Freitas, Osvaldo Medina, Nuno
Duarte, Pedro Leitão, Ricardo Cabral, Carlos Páscoa, Joana Afonso, Luís Diferr e Rui Lacas, e programadas a apresentação dos livros “O menino Triste – Punk Redux”, de João Mascarenhas , e “Agentes do C.A.O.S.: A Conspiração Ivanov”, de Fernando Dordio, Filipe Teixeira e Mário Freitas.
Veja o programa completo do festival aqui.
(Versão expandida do texto publicado no Jornal de Notícias de 22 de Outubro de 2010)
21/10/2010
Corto Maltese – Mü, a cidade perdida
Hugo Pratt (argumento e desenho)
Edições ASA (Portugal, Maio de 2010)
235 x 305 mm, 198 p., cor, cartonado
“Prefiro acreditar que uma coisa estranha e bela que ainda não conheço, conseguirá vencer a lógica sem piedade que tive de engolir e da qual ainda não consegui libertar-me…” (Corto Maltese, p.135)
Entre as muitas personagens emblemáticas que a banda desenhada nos deu ao longo de pouco mais de um século de existência (oficiosa), Corto Maltese ocupará sempre um lugar de destaque. Pela sua personalidade e pela forma como isso o fez saltar para lá dos limites dos quadradinhos, enfeitiçando e seduzindo (mesmo) aqueles que nutrem pouca (ou nenhuma) consideração pela 9ª arte.
Criado pelo veneziano Hugo Pratt (1927-1995) em 1967, na sublime – e para muitos inultrapassável – “A Balada do Mar Salgado”, este marinheiro romântico e errante – seguindo os passos do seu criador de quem é perfeito alter-ego –, com sede de liberdade e o horizonte como único limite, defensor de causas perdidas e de ideais utópicos – não são assim todos os ideais? -, personalizou de forma intensa e invulgar, os sonhos, paixões e ambições de gerações de leitores que, com ele, viveram realidades (oníricas?) de outra forma impossíveis de concretizar.
O presente álbum, marcou o regresso das suas aventuras às livrarias nacionais, numa nova edição, colorida – para mim um senão, porque prefiro de longe o preto e branco contrastado de Pratt -, de formato ligeiramente inferior aos álbuns originais (mas sem prejuízo de maior para o desenho), complementada com uma bela introdução de Marco Steiner, ilustrada com fotos de Marco D’Anna, sobre alguns dos mistérios da História da humanidade que ainda subsistem nos nossos dias.
Se a escolha de “Mü, a cidade perdida” para este regresso é perfeitamente justificável, por ser a única aventura de Corto que não teve distribuição comercial nas livrarias portuguesas (foi apenas integrada na colecção vendida com o Público) – ela é também, no entanto, de certa forma, o seu canto do cisne, não só por ter sido a última história escrita e desenhada por Pratt, mas também por ser uma das mais estranhas (e irreais) aventuras que o marinheiro viveu. E onde se adivinha um certo tom de celebração da série, pela reunião de algumas das personagens com quem Corto se foi cruzando ao longo do seu percurso: Rasputine, Boca Dourada, Steiner, Tristan… a par de outras que agora vai conhecer.
A história, complexa, densa, recheada de referências, combinando factos comprovados, lendas e fábulas, começa com uma discussão sobre História, com os Maias como pano de fundo, e um escafandrista – o próprio Corto – à procura, mais uma vez (sempre!), desta vez do lendário (?) continente de Mü. Se o encontrará ou não – com quem e como – cabe ao leitor descobrir, de mente e espíritos abertos, para viajar no tempo e no espaço, no mundo real e também no dos sonhos.
“- Já não distingo o sonho da realidade.
- São duas vias paralelas. Porquê limitarmo-nos a uma só?” (p.166)
Edições ASA (Portugal, Maio de 2010)
235 x 305 mm, 198 p., cor, cartonado
“Prefiro acreditar que uma coisa estranha e bela que ainda não conheço, conseguirá vencer a lógica sem piedade que tive de engolir e da qual ainda não consegui libertar-me…” (Corto Maltese, p.135)
Entre as muitas personagens emblemáticas que a banda desenhada nos deu ao longo de pouco mais de um século de existência (oficiosa), Corto Maltese ocupará sempre um lugar de destaque. Pela sua personalidade e pela forma como isso o fez saltar para lá dos limites dos quadradinhos, enfeitiçando e seduzindo (mesmo) aqueles que nutrem pouca (ou nenhuma) consideração pela 9ª arte.
Criado pelo veneziano Hugo Pratt (1927-1995) em 1967, na sublime – e para muitos inultrapassável – “A Balada do Mar Salgado”, este marinheiro romântico e errante – seguindo os passos do seu criador de quem é perfeito alter-ego –, com sede de liberdade e o horizonte como único limite, defensor de causas perdidas e de ideais utópicos – não são assim todos os ideais? -, personalizou de forma intensa e invulgar, os sonhos, paixões e ambições de gerações de leitores que, com ele, viveram realidades (oníricas?) de outra forma impossíveis de concretizar.
O presente álbum, marcou o regresso das suas aventuras às livrarias nacionais, numa nova edição, colorida – para mim um senão, porque prefiro de longe o preto e branco contrastado de Pratt -, de formato ligeiramente inferior aos álbuns originais (mas sem prejuízo de maior para o desenho), complementada com uma bela introdução de Marco Steiner, ilustrada com fotos de Marco D’Anna, sobre alguns dos mistérios da História da humanidade que ainda subsistem nos nossos dias.
Se a escolha de “Mü, a cidade perdida” para este regresso é perfeitamente justificável, por ser a única aventura de Corto que não teve distribuição comercial nas livrarias portuguesas (foi apenas integrada na colecção vendida com o Público) – ela é também, no entanto, de certa forma, o seu canto do cisne, não só por ter sido a última história escrita e desenhada por Pratt, mas também por ser uma das mais estranhas (e irreais) aventuras que o marinheiro viveu. E onde se adivinha um certo tom de celebração da série, pela reunião de algumas das personagens com quem Corto se foi cruzando ao longo do seu percurso: Rasputine, Boca Dourada, Steiner, Tristan… a par de outras que agora vai conhecer.
A história, complexa, densa, recheada de referências, combinando factos comprovados, lendas e fábulas, começa com uma discussão sobre História, com os Maias como pano de fundo, e um escafandrista – o próprio Corto – à procura, mais uma vez (sempre!), desta vez do lendário (?) continente de Mü. Se o encontrará ou não – com quem e como – cabe ao leitor descobrir, de mente e espíritos abertos, para viajar no tempo e no espaço, no mundo real e também no dos sonhos.
“- Já não distingo o sonho da realidade.
- São duas vias paralelas. Porquê limitarmo-nos a uma só?” (p.166)
20/10/2010
Snuff #1 – La mélodie du bonheur
Philippe Nihoul (argumento)
Xavier Lemmens (desenho e cor)
Delcourt (França, septembre 2010)
240 x 320 mm, 48 p., cor, cartonado)
Resumo
Ethan Fargo vive desiludido desde o acidente em que perdeu a mulher e a filha. Arrasta-se pelas ruas de Brooklyn proclamando o seu ódio aos pombos e ao golfe e tendo como único centro de interesse as comédias musicais.
Mas tudo vai mudar no dia em que, (não) por acaso, se vê envolvido roubo num estranho e violento.
Desenvolvimento
Este não é um álbum para ser levado a sério – linearmente – porque falha no argumento, que tem alguns pontos obscuros. Desde logo e principal : o que leva Ethan a ser escolhido e a aceitar a missão que lhe é proposta? Pontos obscuros que poderão vir a ser (ou não) esclarecidos nos dois restantes tomos previstos.
De qualquer forma, merece ser lido porque a sua história, desbragada e muitas vezes divertida é, antes de mais, uma homenagem/piscar de olhos a realizadores como Tarantino, ao policial negro tradicional, a uma certa cultura – actual e muito presente a diversos níveis – de hiper-violência. Por isso, preparem-se leitores para muitos tiros e cenas violentas, com destruição a rodos e cérebros, braços e pernas a explodir. Num relato que - ironia maior… - tem como base um ‘snuff movie’ - filmes, geralmente artesanais, com cenas reais de tortura e assassinato, filmados de modo cru, sem quaisquer efeitos especiais.
A emoldurar tudo isto, está uma interessante – apesar de baseada em estereótipos reconhecíveis… - galeria de personagens. O protagonista, Ethan Fargo, é alguém que bateu no fundo e não tem vontade nem motivos para voltar à superfície, que desperdiça o seu tempo lançando bolas de golfe para o mar, insultando os pombos que pousam no beiral da sua janela ou vendo comédias musicais, a única coisa que ainda o anima (e faz viver ?).
A meio do álbum, primeiro envolto num manto de mistério, depois revelando-se (ou será que o argumento ainda nos vai surpreender por aqui ?), surge Alejandro Gutierrez, ex-membro proeminente de uma ditadura da América Latina cuja filha enveredou por veredas revolucionárias e acabou como protagonista involuntária do tal snuff movie; por isso, Guttierrez, magnata sem escrúpulos, pretende contratar Ethan para o vingar, tendo começado por apagar o seu passado e dar-lhe uma nova identidade.
Ao seu serviço (será… ?) está ‘Ismael’, o assassino impiedoso e violento que fala por citações bíblicas e se apresenta como anjo protector de Ethan, desenrascando-o por mais de uma vez. E que, a espaços, parece até mais (talhado para) protagonista do que Ethan.
Em segundo plano, mas com papéis relevantes em cenas específicas, surgem dois meliantes trapalhões e pouco dotados, o dono e o amigo da loja de DVDs que Etah frequenta e um tenente da polícia da tal ditadura latina, habituado a trabalhar ao ritmo do cassetete e dos subornos.
Com eles, de forma sarcástica e mordaz, onde se multiplicam referências e piscadelas, Nihoul desenvolve uma história desenvolvida em ritmo moderado – para dar tempo para a violência crescer e o sangue jorrar?! – suficientemente divertida e interessante para dar vontade de (pelo menos) ler o próximo tomo.
O traço de Lemmens, primeiro motivo para me interessar pelo álbum, é uma linha clara dinâmica mas angulosa, que tem por base uma planificação tradicional, mas com a qual o desenhador consegue transmitir o ritmo desejado. E onde se encontram alguns bons achados como o tratamento gráfico de Ismael ou o bom trabalho ao nível da cor, baseada em tons maioritariamente frios, mesmo quando predominam os vermelhos e os amarelos, bem utilizada para definir e destacar em cada pranchas apenas os pontos fulcrais.
A reter
- Confesso-me fã deste género de traço, uma espécie de linha clara dura que evoca o grande Serge Clerc, embora sem a sua elegância.
- O humor dos diálogos, bem conseguidos.
- Posso enganar-me, mas este tríptico ainda reserva algumas reviravoltas surpreendentes.
Menos conseguido
- Pode vir a ser explicado nos dois tomos previstos para a conclusão de Snuff ou até ser desnecessário tendo em conta o espírito do relato, mas neste primeiro volume as razões para a escolha de Ethan como braço vingador e a sua aceitação da tarefa são de todo obscuras e até pouco credíveis.
Curiosidade
- É bastante estranho nos dias que correm, mas para além das (poucas) cenas em que a filha de Gutierrez é torturada e morta e de figurantes completamente anónimas que apenas servem para preencher umas poucas vinhetas, nas páginas de Snuff – até agora - não há uma única personagem feminina.
Xavier Lemmens (desenho e cor)
Delcourt (França, septembre 2010)
240 x 320 mm, 48 p., cor, cartonado)
Resumo
Ethan Fargo vive desiludido desde o acidente em que perdeu a mulher e a filha. Arrasta-se pelas ruas de Brooklyn proclamando o seu ódio aos pombos e ao golfe e tendo como único centro de interesse as comédias musicais.
Mas tudo vai mudar no dia em que, (não) por acaso, se vê envolvido roubo num estranho e violento.
Desenvolvimento
Este não é um álbum para ser levado a sério – linearmente – porque falha no argumento, que tem alguns pontos obscuros. Desde logo e principal : o que leva Ethan a ser escolhido e a aceitar a missão que lhe é proposta? Pontos obscuros que poderão vir a ser (ou não) esclarecidos nos dois restantes tomos previstos.
De qualquer forma, merece ser lido porque a sua história, desbragada e muitas vezes divertida é, antes de mais, uma homenagem/piscar de olhos a realizadores como Tarantino, ao policial negro tradicional, a uma certa cultura – actual e muito presente a diversos níveis – de hiper-violência. Por isso, preparem-se leitores para muitos tiros e cenas violentas, com destruição a rodos e cérebros, braços e pernas a explodir. Num relato que - ironia maior… - tem como base um ‘snuff movie’ - filmes, geralmente artesanais, com cenas reais de tortura e assassinato, filmados de modo cru, sem quaisquer efeitos especiais.
A emoldurar tudo isto, está uma interessante – apesar de baseada em estereótipos reconhecíveis… - galeria de personagens. O protagonista, Ethan Fargo, é alguém que bateu no fundo e não tem vontade nem motivos para voltar à superfície, que desperdiça o seu tempo lançando bolas de golfe para o mar, insultando os pombos que pousam no beiral da sua janela ou vendo comédias musicais, a única coisa que ainda o anima (e faz viver ?).
A meio do álbum, primeiro envolto num manto de mistério, depois revelando-se (ou será que o argumento ainda nos vai surpreender por aqui ?), surge Alejandro Gutierrez, ex-membro proeminente de uma ditadura da América Latina cuja filha enveredou por veredas revolucionárias e acabou como protagonista involuntária do tal snuff movie; por isso, Guttierrez, magnata sem escrúpulos, pretende contratar Ethan para o vingar, tendo começado por apagar o seu passado e dar-lhe uma nova identidade.
Ao seu serviço (será… ?) está ‘Ismael’, o assassino impiedoso e violento que fala por citações bíblicas e se apresenta como anjo protector de Ethan, desenrascando-o por mais de uma vez. E que, a espaços, parece até mais (talhado para) protagonista do que Ethan.
Em segundo plano, mas com papéis relevantes em cenas específicas, surgem dois meliantes trapalhões e pouco dotados, o dono e o amigo da loja de DVDs que Etah frequenta e um tenente da polícia da tal ditadura latina, habituado a trabalhar ao ritmo do cassetete e dos subornos.
Com eles, de forma sarcástica e mordaz, onde se multiplicam referências e piscadelas, Nihoul desenvolve uma história desenvolvida em ritmo moderado – para dar tempo para a violência crescer e o sangue jorrar?! – suficientemente divertida e interessante para dar vontade de (pelo menos) ler o próximo tomo.
O traço de Lemmens, primeiro motivo para me interessar pelo álbum, é uma linha clara dinâmica mas angulosa, que tem por base uma planificação tradicional, mas com a qual o desenhador consegue transmitir o ritmo desejado. E onde se encontram alguns bons achados como o tratamento gráfico de Ismael ou o bom trabalho ao nível da cor, baseada em tons maioritariamente frios, mesmo quando predominam os vermelhos e os amarelos, bem utilizada para definir e destacar em cada pranchas apenas os pontos fulcrais.
A reter
- Confesso-me fã deste género de traço, uma espécie de linha clara dura que evoca o grande Serge Clerc, embora sem a sua elegância.
- O humor dos diálogos, bem conseguidos.
- Posso enganar-me, mas este tríptico ainda reserva algumas reviravoltas surpreendentes.
Menos conseguido
- Pode vir a ser explicado nos dois tomos previstos para a conclusão de Snuff ou até ser desnecessário tendo em conta o espírito do relato, mas neste primeiro volume as razões para a escolha de Ethan como braço vingador e a sua aceitação da tarefa são de todo obscuras e até pouco credíveis.
Curiosidade
- É bastante estranho nos dias que correm, mas para além das (poucas) cenas em que a filha de Gutierrez é torturada e morta e de figurantes completamente anónimas que apenas servem para preencher umas poucas vinhetas, nas páginas de Snuff – até agora - não há uma única personagem feminina.
19/10/2010
Entre les ombres
Arnaud Boutle (argumento e desenho)
Glénat (Suíça, Setembro de 2010)
195 x 275 mm, 72 p., cor, brochado com badanas
Resumo
Após um acontecimento de contornos e origens desconhecidos, que deu origem a diversos confrontos e alterações climáticas, os seres humanos desapareceram da face da Terra, com excepção de um único homem.
Este álbum conta o seu dia-a-dia, entre a luta pela sobrevivência e as recordações e fantasmas do tempo que viveu em comunidade.
Desenvolvimento
A ter que escolher uma única palavra para definir este livro, ela seria melancolia. Este é o sentimento dominante neste relato traçado em tons esverdeados - para o tempo presente - e azuis-acizentados - para os – muitos - flashbacks que o integram; tom este que reforça o sentimento de nostalgia e perda em relação a esses tempos passados. No trabalho gráfico de Boutle, num estilo agradável embora não muito vistoso, destaca-se igualmente o uso recorrente e bem conseguido de tracejado a lápis de cor para definir volumes, texturas e superfícies, que, a par da ausência de linhas de delineação das vinhetas, dá ao todo um aspecto delicado e atraente.
Quanto à história... É a história de um homem só, numa imensa cidade deserta, onde, por um lado, tem que fazer face aos elementos adversos do clima em mudança. Factor que permite ao autor algumas belas pranchas, nomeadamente da antiga metrópole invadida por enormes plantas trepadeiras ou os efeitos das violentas tepestades de neve.
Mas a questão climática acaba por ser um problema menor para o protagonista que vive a mais profunda e absoluta solidão. Essa solidão obriga-o a uma disciplina férrea para manter a lucidez: recolha de comida – pesca, enlatados pouco mais – ou de medicamentos em espaços agora desertos e quase esgotados, com aspecto de terem sido saqueados; busca de entretenimento na recolha de livros e cds musicais, na decoração do « seu espaço », com quadros retirados do museu… Só que aos poucos, vai perdendo essa lucidez, possivelmente ao mesmo tempo que aumenta a tendência para viver cada vez mais em função do passado, das suas recordações e dos seus fantasmas, ao som das músicas que escreveu e que a sua namorada cantou... Sinónimo, talvez, de uma lenta progressão se não para a loucura, pelo menos para a perda de noção da realidade, quando as (muitas) lembranças começam a tornar-se obsessivas e a tomar cada vez mais conta dele.
A reter
- Algumas pranchas bem conseguidas.
- O peso da solidão do protagonista que emana da leitura da história.
Menos conseguido
- A falta de uma explicação para o que aconteceu ao planeta Terra e conduziu á situação presente...
- … o que conduz à sensação de que falta algo (mais?) ao relato dos 219 dias de vida do único homem restante na Terra para que a história se torna mais coerente e credível e para que o seu destino (afinal) nos interesse.
Glénat (Suíça, Setembro de 2010)
195 x 275 mm, 72 p., cor, brochado com badanas
Resumo
Após um acontecimento de contornos e origens desconhecidos, que deu origem a diversos confrontos e alterações climáticas, os seres humanos desapareceram da face da Terra, com excepção de um único homem.
Este álbum conta o seu dia-a-dia, entre a luta pela sobrevivência e as recordações e fantasmas do tempo que viveu em comunidade.
Desenvolvimento
A ter que escolher uma única palavra para definir este livro, ela seria melancolia. Este é o sentimento dominante neste relato traçado em tons esverdeados - para o tempo presente - e azuis-acizentados - para os – muitos - flashbacks que o integram; tom este que reforça o sentimento de nostalgia e perda em relação a esses tempos passados. No trabalho gráfico de Boutle, num estilo agradável embora não muito vistoso, destaca-se igualmente o uso recorrente e bem conseguido de tracejado a lápis de cor para definir volumes, texturas e superfícies, que, a par da ausência de linhas de delineação das vinhetas, dá ao todo um aspecto delicado e atraente.
Quanto à história... É a história de um homem só, numa imensa cidade deserta, onde, por um lado, tem que fazer face aos elementos adversos do clima em mudança. Factor que permite ao autor algumas belas pranchas, nomeadamente da antiga metrópole invadida por enormes plantas trepadeiras ou os efeitos das violentas tepestades de neve.
Mas a questão climática acaba por ser um problema menor para o protagonista que vive a mais profunda e absoluta solidão. Essa solidão obriga-o a uma disciplina férrea para manter a lucidez: recolha de comida – pesca, enlatados pouco mais – ou de medicamentos em espaços agora desertos e quase esgotados, com aspecto de terem sido saqueados; busca de entretenimento na recolha de livros e cds musicais, na decoração do « seu espaço », com quadros retirados do museu… Só que aos poucos, vai perdendo essa lucidez, possivelmente ao mesmo tempo que aumenta a tendência para viver cada vez mais em função do passado, das suas recordações e dos seus fantasmas, ao som das músicas que escreveu e que a sua namorada cantou... Sinónimo, talvez, de uma lenta progressão se não para a loucura, pelo menos para a perda de noção da realidade, quando as (muitas) lembranças começam a tornar-se obsessivas e a tomar cada vez mais conta dele.
A reter
- Algumas pranchas bem conseguidas.
- O peso da solidão do protagonista que emana da leitura da história.
Menos conseguido
- A falta de uma explicação para o que aconteceu ao planeta Terra e conduziu á situação presente...
- … o que conduz à sensação de que falta algo (mais?) ao relato dos 219 dias de vida do único homem restante na Terra para que a história se torna mais coerente e credível e para que o seu destino (afinal) nos interesse.
18/10/2010
Adèle Blanc-sec , vol. 1
Jacques Tardi (argumento e desenho)
ASA (Portugal, Setembro de 2010)
225 x 300 mm, 96 p., cor, cartonado
Adèle Blanc-sec é um dos casos estranhos em que a edição de banda desenhada é fértil em Portugal.
Lançada originalmente pela Bertrand, no final da década de 70 do século passado, era uma série que destoava num catálogo em que imperava a BD juvenil de aventuras, o que não impediu a edição dos quatro primeiros tomos (correspondentes aos dois primeiros arcos das aventuras de Adèle Blanc-sec) em apenas dois anos, volumes que durante muitos anos se encontravam com facilidade em livrarias e alfarrabistas.
Anos depois, em 2003, a Witloof acabada de surgir, surpreendia por voltar a apostar numa obra já editada, de um autor que não era propriamente um nome de referência no nosso país e cuja bibliografia nacional praticamente não tivera continuidade (com excepção de “A Sacanice”, surpreendentemente lançada pela Terramar em 2000, e de “Varlot Soldado”, da Polvo, em 2001). Com uma edição ligeiramente maior, com nova tradução e capas pouco diferentes, apenas com a imagem original ampliada, a Witloof ficou-se pela (re)edição dos três primeiros volumes.
Agora, é a ASA que volta a esta obra emblemática de Tardi, à boleia de um filme que - ao que parece infelizmente - não se sabe se e quando vai estrear em Portugal. A tradução e a capa (uma montagem) são novas mais uma vez, surgindo também como novidade a compilação das duas primeiras histórias (Adèle e o Monstro e O Demónio da Torre Eiffel, correspondentes ao primeiro arco) num único volume. E a certeza (tanto quanto é possível assegurá-lo neste momento) de que mais dois volumes, com os tomos 3/4 e 5/6 (estes até hoje inéditos em português) serão editados durante 2011. A faltar, para encerrar o primeiro ciclo de Adèle, ficará o álbum “Tous les Monstres”, bem como duas derivações à série: “Adieu Brindavoine” e “La fleur et le fusil”.
A verdade é que nada do que para trás fica escrito põe em causa o interesse ou a qualidade da obra de Tardi, um dos grandes nomes da BD francófona das últimas quatro décadas, quer com esta Adèle, quer com as suas adaptações de clássicos policiais franceses ou de episódios históricos. Como denominador comum a todas elas, a presença de Paris como local central da acção, uma Paris revisitada e retratada com mestria, rigor e paixão ao longo de várias épocas. Porque mesmo que o traço de Tardi seja semi-caricatural, no que ao tratamento da figura humana diz respeito, revela-se perfeito para pôr no papel os cenários reais que as personagens teriam calcorreado se tivessem realmente existido no tempo em que o autor as coloca.
Mesmo assim, no conjunto da sua obra, Adèle Blanc-sec destaca-se pelo tom fantástico e irónico que perpassa as suas páginas.
Fantástico, porque na origem destas rocambolescas histórias está um pterodáctilo ressuscitado por pseudo-cientistas e uma seita de adoradores de um demónio assírio, em pleno coração da França. E uma trama longa e retorcida (e pontualmente difícil de acompanhar, tantas são as personagens envolvidas e as peripécias apresentadas), repleta de referências, em que abundam conspirações, perseguições e tiros.
Irónico, porque a par daquela trama densa, Tardi diverte-se – nitidamente – a criticar de forma mordaz polícias e políticos, a guerra e a ciência, autores (como ele próprio) e (os seus) heróis, de forma bem conseguida e irresistível. Ao mesmo tempo que brinca com a (sua) história e as situações, numa narrativa que adopta o estilo dos folhetins do início do século XX, o que a torna a um tempo estranha mas também apetecível e, por isso, bastante recomendável, sendo sem dúvida uma bela homenagem à literatura popular!
Como (triste) nota final, fica a confirmação que a edição de “integrais” em Portugal (que, ao contrário da maior parte das edições similares de clássicos francófonos ou americanos, continuam a ter custos relativos a tradução e balonagem e a pagar direitos de autor) é financeiramente pouco vantajosa para o leitor, apesar do preço do actual tomo com dois álbuns (21,70 €) ficar abaixo do que custariam dois livros isolados.
ASA (Portugal, Setembro de 2010)
225 x 300 mm, 96 p., cor, cartonado
Adèle Blanc-sec é um dos casos estranhos em que a edição de banda desenhada é fértil em Portugal.
Lançada originalmente pela Bertrand, no final da década de 70 do século passado, era uma série que destoava num catálogo em que imperava a BD juvenil de aventuras, o que não impediu a edição dos quatro primeiros tomos (correspondentes aos dois primeiros arcos das aventuras de Adèle Blanc-sec) em apenas dois anos, volumes que durante muitos anos se encontravam com facilidade em livrarias e alfarrabistas.
Anos depois, em 2003, a Witloof acabada de surgir, surpreendia por voltar a apostar numa obra já editada, de um autor que não era propriamente um nome de referência no nosso país e cuja bibliografia nacional praticamente não tivera continuidade (com excepção de “A Sacanice”, surpreendentemente lançada pela Terramar em 2000, e de “Varlot Soldado”, da Polvo, em 2001). Com uma edição ligeiramente maior, com nova tradução e capas pouco diferentes, apenas com a imagem original ampliada, a Witloof ficou-se pela (re)edição dos três primeiros volumes.
Agora, é a ASA que volta a esta obra emblemática de Tardi, à boleia de um filme que - ao que parece infelizmente - não se sabe se e quando vai estrear em Portugal. A tradução e a capa (uma montagem) são novas mais uma vez, surgindo também como novidade a compilação das duas primeiras histórias (Adèle e o Monstro e O Demónio da Torre Eiffel, correspondentes ao primeiro arco) num único volume. E a certeza (tanto quanto é possível assegurá-lo neste momento) de que mais dois volumes, com os tomos 3/4 e 5/6 (estes até hoje inéditos em português) serão editados durante 2011. A faltar, para encerrar o primeiro ciclo de Adèle, ficará o álbum “Tous les Monstres”, bem como duas derivações à série: “Adieu Brindavoine” e “La fleur et le fusil”.
A verdade é que nada do que para trás fica escrito põe em causa o interesse ou a qualidade da obra de Tardi, um dos grandes nomes da BD francófona das últimas quatro décadas, quer com esta Adèle, quer com as suas adaptações de clássicos policiais franceses ou de episódios históricos. Como denominador comum a todas elas, a presença de Paris como local central da acção, uma Paris revisitada e retratada com mestria, rigor e paixão ao longo de várias épocas. Porque mesmo que o traço de Tardi seja semi-caricatural, no que ao tratamento da figura humana diz respeito, revela-se perfeito para pôr no papel os cenários reais que as personagens teriam calcorreado se tivessem realmente existido no tempo em que o autor as coloca.
Mesmo assim, no conjunto da sua obra, Adèle Blanc-sec destaca-se pelo tom fantástico e irónico que perpassa as suas páginas.
Fantástico, porque na origem destas rocambolescas histórias está um pterodáctilo ressuscitado por pseudo-cientistas e uma seita de adoradores de um demónio assírio, em pleno coração da França. E uma trama longa e retorcida (e pontualmente difícil de acompanhar, tantas são as personagens envolvidas e as peripécias apresentadas), repleta de referências, em que abundam conspirações, perseguições e tiros.
Irónico, porque a par daquela trama densa, Tardi diverte-se – nitidamente – a criticar de forma mordaz polícias e políticos, a guerra e a ciência, autores (como ele próprio) e (os seus) heróis, de forma bem conseguida e irresistível. Ao mesmo tempo que brinca com a (sua) história e as situações, numa narrativa que adopta o estilo dos folhetins do início do século XX, o que a torna a um tempo estranha mas também apetecível e, por isso, bastante recomendável, sendo sem dúvida uma bela homenagem à literatura popular!
Como (triste) nota final, fica a confirmação que a edição de “integrais” em Portugal (que, ao contrário da maior parte das edições similares de clássicos francófonos ou americanos, continuam a ter custos relativos a tradução e balonagem e a pagar direitos de autor) é financeiramente pouco vantajosa para o leitor, apesar do preço do actual tomo com dois álbuns (21,70 €) ficar abaixo do que custariam dois livros isolados.
16/10/2010
Dinis Conefrey na Mundo Fantasma
A Galeria Mundo Fantasma inaugura hoje, às 17 horas, a exposição Memórias Topográficas, com a presença do autor Dinis Conefrey, para uma conversa com os visitantes e sessão de autógrafos.
Composta por 22 originais, metade ilustrações soltas de temáticas distintas e a outra metade pranchas do álbum “Arquipélagos”, cujo argumento é baseado em dois textos do poeta Herberto Hélder, a mostra, segundo o autor, é “uma exposição de imagens saídas do tempo em que as ideias tomaram forma; planos interceptados por linhas, texturas, cores que dão corpo e luz à interpretação dos sonhos”.
Nascido em Lisboa, em 1965, Conefrey tem feito ilustração para livros e publicações periódicas e, no que à banda desenhada diz respeito, participou em diversos álbuns colectivos, destacando-se, na sua bibliografia a solo, o já citado “Arquipélagos” (Íman, 2001) e também ”O Livro dos Dias” (publicado pela Devir, em 2003, em Portugal e Espanha) e realizado com uma bolsa de criação literária do Instituto Português do Livro e das Bibliotecas.
Com um estilo muito pessoal, no qual a cor tem um papel fundamental na definição de ambientes, ensações e volumes, nos últimos anos Dinis Conefrey tem dedicado particular atenção ao México, tendo, em 2005, recebido uma bolsa do estado mexicano que lhe permitiu trabalhar por 6 meses naquele país preparando o segundo tomo de “O Livro dos Dias”.
A exposição de Dinis Conefrey estará patente na Mundo Fantasma, no Centro Comercial Brasília, no Porto, até 14 de Novembro. Como é habitual estará à venda um giclée assinado e numerado pelo autor, que reproduz a ilustração que abre este post.
(Versão revista do texto publicado no Jornal de Notícias de 16 de Outubro de 2010)
Composta por 22 originais, metade ilustrações soltas de temáticas distintas e a outra metade pranchas do álbum “Arquipélagos”, cujo argumento é baseado em dois textos do poeta Herberto Hélder, a mostra, segundo o autor, é “uma exposição de imagens saídas do tempo em que as ideias tomaram forma; planos interceptados por linhas, texturas, cores que dão corpo e luz à interpretação dos sonhos”.
Nascido em Lisboa, em 1965, Conefrey tem feito ilustração para livros e publicações periódicas e, no que à banda desenhada diz respeito, participou em diversos álbuns colectivos, destacando-se, na sua bibliografia a solo, o já citado “Arquipélagos” (Íman, 2001) e também ”O Livro dos Dias” (publicado pela Devir, em 2003, em Portugal e Espanha) e realizado com uma bolsa de criação literária do Instituto Português do Livro e das Bibliotecas.
Com um estilo muito pessoal, no qual a cor tem um papel fundamental na definição de ambientes, ensações e volumes, nos últimos anos Dinis Conefrey tem dedicado particular atenção ao México, tendo, em 2005, recebido uma bolsa do estado mexicano que lhe permitiu trabalhar por 6 meses naquele país preparando o segundo tomo de “O Livro dos Dias”.
A exposição de Dinis Conefrey estará patente na Mundo Fantasma, no Centro Comercial Brasília, no Porto, até 14 de Novembro. Como é habitual estará à venda um giclée assinado e numerado pelo autor, que reproduz a ilustração que abre este post.
(Versão revista do texto publicado no Jornal de Notícias de 16 de Outubro de 2010)