29/12/2011

Há 60 anos, o fim de O Diabrete

A 29 de Dezembro de 1951, um sábado, chegava ao fim mais uma das grandes aventuras do jornalismo infanto-juvenil em Portugal: tinha por título “Diabrete” e durante uma década tinha sido “o grande camaradão” da pequenada, como se lia no seu cabeçalho.
O seu primeiro número surgiu à venda por 50 centavos, a 4 de Janeiro de 1941, sendo propriedade da Empresa Nacional de Publicidade e tendo como director Artur Urbano de Castro. Na sua capa, pouco atractiva para os padrões actuais, apenas se destacava o cabeçalho desenhado por Fernando Bento (um dos muitos que fez para a revista).
O desenhador português, que foi um dos grandes pilares da publicação – o principal no que à BD diz respeito - assinava também as aventuras de “Béquinhas, Beiçudo e Barbaças”, história aos quadradinhos cómica que merecia honra de primeira página e seria publicada ininterruptamente até ao nº 255.
No “Diabrete”, Fernando Bento deixaria uma marca indelével, assinando inúmeras adaptações de clássicos de aventuras, com Júlio Verne à cabeça, sendo sem dúvida o grande nome da publicação onde também se distinguiu Vítor Péon e Fernandes Silva com o detective “O Ponto”.
A primeira grande revolução na revista, que marcaria todo o seu percurso posterior, e que contribuiu decisivamente para a saudável rivalidade que alimentou com “O Mosquito” ao longo da sua existência, aconteceu logo no vigésimo número, quando Adolfo Simões Müller assumiu efectivamente a sua direcção e também grande parte da sua produção literária, a par de Maria Amélia Barça. Como era então habitual, o “Diabrete” incluiu separatas e construções de armar, organizou concursos e espectáculos e editou romances destacáveis e alguns mini-álbuns, entre os quais “O Dragão Teimoso”, de Walt Disney.
Ainda no que diz respeito a autores estrangeiros, destaque para os irmãos Jesus, Adriano e Alejandro Blasco, e para as estreias em Portugal de “Tarzan”, de Burne Hogarth, “Rusty Riley”, de Frank Godwin, “Bob e Bobette” de Willy Vandersteen, e “Quick e Flupke” (rebaptizados Trovão e Relâmpago), de Hergé. O “Diabrete” também publicou o “Agente secreto X-9”, de Alex Raymond, e, já na sua fase final, na esteira do encerramento de “O Papagaio”, três aventuras de “Tintin”, a última das quais deixada incompleta com o fim da revista, no número 887, no final de 1951.
Uma semana depois, os leitores reencontravam o célebre repórter e outros dos heróis do “Diabrete” no número inaugural do “Cavaleiro Andante”. Mas isso, foi outra aventura. 

Nota: Àqueles que queiram aprofundar a história desta revista, aconselho a monografia “Diabrete – O grande camaradão de todos os sábados”, da autoria de José Azevedo e Menezes. 

(Versão expandida do texto publicado no Jornal de Notícias de 29 de Dezembro de 2011)

3 comentários:

  1. A leitura deste seu texto sobre o "Diabrete" fez-me viajar no tempo até ao dia 5 de Janeiro de 1952 (um sábado, precisamente), em que fiquei, cheio de ansiedade, à espera que o jornaleiro que todos os dias nos trazia o "Diário de Notícias", aparecesse também com o "Cavaleiro Andante". Eu lia o "Diabrete" sem grande interesse, na sua última fase, e como outros rapazes não lamentei a notícia do seu desaparecimento, pois o anúncio da revista que vinha substituí-lo prometia grandes e sensacionais novidades.
    Ora, o jornaleiro trouxe mesmo o nº 1 do "Cavaleiro Andante" e, nas semanas seguintes, o deslumbramento foi contínuo, sobretudo com as maravilhosas aventuras desenhadas por Franco Caprioli, que se tornou o desenhador favorito dos meus colegas de liceu, que também liam a revista e comentavam com entusiasmo o seu conteúdo.
    É estranho como há momentos que se tornam especiais e ficam indelevelmente gravados na nossa memória, como esse dia em que estive horas à janela da minha casa, em Lisboa, ansioso por ver aparecer o homem dos jornais ao fundo da rua.
    Com as voltas e reviravoltas da vida, acabei por perder esse 1º número do "Cavaleiro Andante" e outras revistas de que fui leitor assíduo e até assinante (como "O Mosquito"), mas a sensação de expectativa e de regozijo que senti naquele sábado, há quase 60 anos, é ainda hoje tão viva como a de outros momentos especiais também ligados à banda desenhada.
    Votos de bom Ano Novo e um abraço do
    Jorge Magalhães

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  2. Belo testemunho, o do Jorge Magalhães!

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  3. Caro Jorge Magalhães,
    Faço minhas as palavras do Anónimo, a quem dou as boas-vindas: obrigado por mais esta bela partilha das suas recordações ligadas às revistas infanto-juvenis portuguesas.
    Pessoalmente, as minhas memórias começam mais tarde, com o "seu" "Mundo de Aventuras", que me levou a percorrer muitos dos quiosques do Porto onde então morava, esperando que lá a carrinha da distribuição já tivesse chegado...
    Um óptimo 2012 também para si, a Catherine e todos os que são importantes para si.

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