12/09/2013

Lanterna Verde/Arqueiro Verde: Inocência Perdida










Super-Heróis DC Comics #10
Denny O’Neil (argumento)
Neal Adams (desenho)
Levoir/Público
Portugal, 12 de Setembro de 2013
170 x 260 mm, 176 p., cor, cartonada
8,90 €



Este é, possivelmente, um dos mais interessantes volumes da colecção que o jornal Público e a Levoir estão a disponibilizar semanalmente.
Datadas do início da década de 1970, as histórias nele contidas, originalmente publicadas na revista Green Lantern # 76, #77, #83, #85 a #87 e #89, representam um dos primeiros e maiores expoentes de realismo que os comics de super-heróis já assumiram.
Numa época em que os Estados Unidos viviam o pesadelo da derrota no Vietname e o crescimento da contestação ao racismo e tentavam superar o impacto dos assassinatos de John Keneddy e Martin Luther King, este ciclo de histórias apresentam como ponto de partida o despertar do Lanterna Verde/Hal Jordan para a realidade do seu próprio país, através de uma viagem em companhia do Arqueiro verde e de um dos Guardiões de AO, por uma América profunda, recheada de contrastes, desigualdades, injustiças, prepotência, opressão, subornos, pequenos crimes motivados pela sobrevivência, luta pela sobrevivência…
Uma viagem em busca “de respostas, fé e identidade”, como escrevia Denny O’Neil – de forma vibrante e emotiva - na introdução do segundo destes contos, para tentar traduzir a luta interior vivida pelo Lanterna Verde, habituado a ver tudo a preto e branco, a dividir o mundo entre bons e maus e a ver o mal apenas personificado em super-vilões e ameaças galácticas. Dessa forma, o até aí crédulo super-herói, parante um mundo em que impera o cinzento, passa a questionar – embora quase sempre a contragosto – autoridade e justiça, e a descobrir que polícias e juízes nem sempre estão do lado certo – e até que por vezes o lado certo não existe…

Podendo algumas das narrativas soar um pouco ingénuas nos nossos dias, 40 anos após a sua criação – nem todas envelheceram bem, até por alguma linearidade narrativa face à complexidade dos temas abordados – outras mantêm uma incómoda actualidade - e o traço dinâmico e expressivo de Adams tem um importante contributo para isso - patenteando muita da objectividade (subjectiva) e da razão de ser de quando foram criadas.
Com esta série de histórias – e outras da mesma época e calibre tiveram de ficar de fora devido às limitações de páginas do volume – O’Neil e Adams levantam – subjectivamente e em tom de denúncia – questões como as desigualdades sociais, o racismo (que vai para lá da diferença de tratamento de negros ou pele-vermelhas e afecta também os brancos desfavorecidos), a impunidade de políticos, ricos e poderosos, a oposição entre justiça e humanidade, ecologia, sobrepopulação, poluição…
Não sendo inéditas em Portugal – boa parte delas foram publicadas (corajosamente) por Jorge Magalhães no Mundo de Aventuras na década de 1980, atrevendo-se então a desafiar leitores habituados a outro tipo de registo – têm agora um tratamento gráfico mais adequado e justificam plenamente uma leitura atenta - e crítica.
Quase a terminar, duas referências: a primeira, para o facto de Adams ter dado a cara de Nixon e do seu vice-presidente aos vilões de uma das histórias; a outra para salientar a inclusão do relato em que Speedy, o parceiro juvenil do Arqueiro Verde, é mostrado como um drogado, uma das bandas desenhadas que me fez dar o salto da BD juvenil e de aventuras para registos mais adultos.

Notas finais
Este texto foi escrito com base na edição brasileira da Panini Comics, que compilou todo o arco comum ao Lanterna Verde e ao Arqueiro Verde em dois volumes da colecção Grandes Clássicos DC. Por esse motivo, algumas das referências feitas atrás podem dizer respeito a histórias não incluídas no volume da Levoir/Público.
Quanto às imagens apresentadas, são de edições norte-americanas.

4 comentários:

  1. Caro Pedro,
    Obrigado pela referência que me faz, neste seu eloquente texto, a propósito da publicação de alguns episódios de uma criação mítica no "Mundo de Aventuras" (2ª série), quando este mudou de formato, por volta do nº 500, pretendendo transformar-se numa revista melhor e direccionada para um público mais exigente, que acompanhava os progressos e a evolução da BD estrangeira, sobretudo a dos "comic books" norte-americanos.
    Foi por isso que escolhi o Lanterna Verde, do Neal Adams, e também o Swamp Thing, do Berni Wrightson, ainda que o fizesse com uma década de atraso. Infelizmente essa fase do MA durou poucos números, com muitos sobressaltos, incluindo a mudança de periodicidade, e o editor resolveu a dada altura voltar ao formato antigo, que achava mais conveniente e mais comercial, baixando o preço de capa e impondo várias restrições, entre elas a compra de material da DC e da Marvel, mais caro do que a maioria das séries europeias.
    Foi, por isso, um sonho breve, que ainda continuou, com alguns fulgores, noutras revistas, como as "Selecções do MA", até se esgotar o material americano que tínhamos em carteira. E não sei honestamente se a experiência valeu a pena, pois não houve, quanto a ela, muitos "feedbacks" por parte dos leitores, na sua maioria, julgo eu, ainda mal preparados para tão drástica "mudança de ares".
    Mas, por um breve instante – isto é, durante alguns meses –, o MA pôde enfeitar-se de novas galas, até de um suplemento a cores, exercendo outra vez o seu papel de pioneiro. Depois lá voltaram as séries do costume, com o Mandrake, o Fantasma, o X-9 e outros heróis típicos, cuja popularidade continuava a garantir boas vendas... embora a tiragem, nessa fase, já não se comparasse com a dos anos 70, quando ainda rondava os 25.000 exemplares.
    Tenho a convicção, ainda hoje, de que se pudéssemos ter mantido o formato de magazine (idêntico ao do MA Especial), com o mesmo conteúdo mais "sério", doseado com alguns heróis tradicionais, do agrado geral, teríamos feito "história", criando mais um marco na longa existência do "Mundo de Aventuras". Mas todos os sonhos são uma incógnita... Este acabou cedo, como se já prenunciasse um fim atribulado, dentro de poucos anos.
    Um grande abraço do
    Jorge Magalhães

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    1. Olá Jorge,
      Obrigado pela resposta à minha provocaçãozinha.
      Coleccionei o MA deste o #47 até quase ao seu final e essa curta fase que refere, com formato maior, páginas a cores e oferta (de qualidade) mais variada, na verdade agradou-me bastante, apesar dos problemas de impressão da cor. Relembro, em especial, "Aquele que morreu duas vezes", do Derib, um excelente western de tom humano, na linha do que o autor suíço sempre fez.
      Por isso, o regresso ao pequeno formato e o desaparecimento de muitas das séries que eu apreciava custou ainda mais...
      Até onde poderia ter ido o MA se o editor mantivesse a aposta mais algum tempo, é algo que nunca terá resposta. Infelizmente.

      Um grande abraço e boas leituras!

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  2. Olá, Pedro, mais uma vez... e faço-o com todo o prazer neste seu espaço de consulta obrigatória.
    O caderno a cores que o MA oferecia nessa fase e que foi, aliás, um dos meus objectivos concretizados ao cabo de muitos esforços e de muita teimosia, teve vários problemas relacionados com a selecção de histórias e com a impressão, pois infelizmente a gráfica que imprimia a revista (e muitas outras publicações da APR) não estava devidamente preparada para os trabalhos a cores. No caso do MA, acresce que esse caderno era impresso no mesmo papel das restantes páginas, quando devia ter sido escolhido um papel melhor, como o das capas. Mas assim não aconteceu, por decisão do editor, que queria poupar nas despesas, tal como hoje acontece em muitas áreas. Mais ou menos na mesma altura, se bem me lembro, foi lançado um Almanaque – o primeiro e único no historial do MA – que enfermou do mesmo defeito, pois embora o "miolo" fosse todo a preto e branco, o que "encolheu" as despesas, escolheram para a capa, ainda por cima com lombada, um papel de qualidade inferior. Apesar de tudo, esse Almanaque vendeu-se bem, mas houve leitores que "refilaram" por causa disso... e tinham razão. Até o impressor lamentou que o papel da capa fosse aquele.
    Esse tipo de decisões erradas, a meu ver, que me transcendiam e que eu não tinha hipóteses de ultrapassar, contribuíram também, entre muitas outras, para o fim da APR, poucos anos depois. Nem sempre é no poupar que está o ganho!...

    Um grande abraço do
    Jorge Magalhães

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    1. Olá Jorge,
      Obrigado por mais esta achega que confirma o que já aqui tenho escrito: um livro com essas e outras histórias da sua vida aos quadradinhos impõe-se!

      Boas leituras!

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