As Leituras do Pedro: Living Will #1 a #7

Cinco anos depois

Cinco anos depois, chega ao seu termo um projecto único na banda desenhada portuguesa: Living Will, um romance gráfico escrito por André Oliveira, publicado sob a forma de fascículos.

Valeu a pena a espera para ter completa este drama humano, aguarda-se agora a (merecida) publicação em livro.

Will - não o do título, que é (só) um conseguido jogo de palavras - é o protagonista desta história. Ainda (muito) abalado pelo falecimento da companheira de muitos anos, sofre o golpe final - talvez não… - quando morre o cão que pertenceu a ambos. Possivelmente o último elo que o ligava aos tempos felizes que viveu com eles.

Desanimado, deprimido, com alguns fantasmas na consciência, decide pôr em ordem a sua vida e corrigir algumas situações - pelo menos tentar explicá-las e desculpar-se delas - que o seu feitio, nem sempre fácil, e as suas opções provocaram ao longo da vida.

Se este é o ponto de partida, se é mesmo o mote dos capítulos iniciais, aos poucos André Oliveira, partindo de Will, alargando-se aos seus conhecidos, aproveita para tecer uma teia mais abrangente em que vamos conhecendo pedaços da/de vida daqueles com quem Will se foi cruzando. E descobrindo, aos poucos, como essas interacções (mais ou menos) pontuais ou recorrentes foram afectando o protagonista - e os outros.

É uma história de vida, de vidas, contada em tom sereno, com muito de introspectivo, densa, com múltiplas ramificações que revelam outras tantas vidas com outras tantas histórias, que nos levam, quase sem dar por isso, a espreitar, tangencialmente, lugares comuns da nossa sociedade: a cumplicidade de alguns casais, a solidão da velhice, o retrato distorcido dos famosos que a popularidade transmite, as dependências, o viver para si mesmo em oposição ao viver para os outros, a imigração, as dificuldades de integração...

Tudo isto, em doses variáveis, está presente neste drama humano que André Oliveira nos serviu com a cumplicidade gráfica de Joana Afonso e Pedro Serpa - este último entrado a meio para manter o ritmo e com um esforço assinalável para se aproximar do estilo bem peculiar daquela.

Numa história descoberta aos poucos, cujo retrato global exibe uma outra dimensão e abre novas perspectivas, apesar de algum pessimismo latente - ou talvez apenas realismo… - há afinal uma mensagem de (algum) optimismo, porque a vida que vivemos e aquilo que deixamos depende só - ou pelo menos em grande parte… - de nós.