14/10/2019

Natacha Intégrale #1: Panique à bord!

Semana dos integrais (1)


Cada vez mais, as edições integrais são o melhor caminho para quem quer conhecer obras do passado - mesmo que relativamente recente - ou recordar aquelas que marcaram a sua infância ou juventude - com todos os riscos que isso acarreta!
Por isso, esta será uma semana (quase?) toda dedicada a edições integrais, aqui em As Leituras do Pedro.
Sem nenhuma razão específica, só porque foi leitura recente minha, abro com o primeiro volume de Natacha, a bela e sensual hospedeira do ar da revista Spirou.
Criação de François Walthéry - com colaborações nos argumentos de Gos, Borgers e Wasterlain - estreou-se a 26 de Fevereiro de 1970, no n.º1663 daquela revista belga. Na época, possivelmente empurrada pelos ventos de mudança que o Maio de 1968 tinham trazido à sociedade francesa, representava uma enorme mudança de paradigma no que à BD francófona - e não só - dizia respeito, uma vez que era protagonizada por uma mulher. E, mais do que isso, por uma mulher bonita, frequentemente mostrada em poses sensuais e até atrevidas - para os critério da época - o que com certeza terá dado a volta à cabeça a mais do que um adolescente borbulhento. Uma mulher que assumia o protagonismo e tomava a iniciativa, não ficando recorrentemente à espera dos parceiros masculinos para sair de situações difíceis.
Abrindo com duas histórias dentro da linha tradicional da revista, entre a aventura e o humor, este primeiro volume de Natacha ajuda a perceber a evolução as série e a estabelecer alguns dos aspectos que balizariam o seu percurso, entre os quais a profissão que lhe permite deslocar-se para as mais diversas paragens e dar mobilidade à heroína e uma galeria de secundários não muito vasta, mas onde se destaca já Walter, o assistente de bordo trapalhão e azarado que a acompanha em muitos dos voos.
Se estas duas primeiras narrativas - Hôtesse de L’air e Natacha et le Maharadjah - não se afastam muitos dos pressupostos habituais das outras séries da revista, com excepção do exibicionismo da protagonista feminina, o último relato - La mémoire de Métal - marca de certa forma um salto na evolução da série, quer devido à planificação mais cinematográfica, ao ritmo acelerado que apresenta e, principalmente, pelo tom mais violento e negro que a caracteriza, em parte devido ao falecimento recente do pai de Walthéry. Na sua essência, é um thriller de ritmo alucinante, em forma de perseguição contínua, que gira em torno da busca por diversas facções, de uma pequena caixa que parecendo apenas um elemento acessório de um esquema de tráfico de diamantes, se revela bem mais do que isso. Uma exposição mais crua da violência, um maior número de situações limite e a necessidade de tomar opções arriscadas e que contrariavam a linha moderada então assumida pelas publicações infanto-juvenis, fazem desta narrativa um caso muito curioso para a data.
As informações acessórias que me ajudaram a compor este texto, fazem parte do dossier de abertura do álbum, que ajuda a situar a obra no contexto da época, na Spirou e na carreira do(s) seu(s) autor(es). E este é outro dos aspectos que valorizam imenso a publicação de obras com (mais ou menos) anos e tornam os integrais tão apetecíveis. Quem está habituado aos de origem francesa, sabe que geralmente os da Dupuis apresentam os dossiers mais extensos e completos mas, neste caso, numa edição datada de 2007, a verdade é que ele surge algo conciso em relação ao que tem sido norma em anos mais recentes.

Natacha em português
A título de curiosidade final, refira-se que Natacha nunca teve grande sorte no nosso país. Estreada com Natacha, Hospedeira do Ar nas páginas da 2.ª série da versão nacional da Spirou, apenas dois meses após a sua publicação original, veria o segundo episódio, Natacha e o marajá, ficar interrompido devido ao encerramento da publicação após 32 números. (Porque Portugal continuava um país 'decente' e de brandos costumes?) a hospedeira do ar só chegaria à capa da revista no número 19, mas até ao seu final ainda apareceria mais três vezes.
As duas histórias referidas seriam publicadas integralmente, já na década de 1980, nas páginas do Jornal da BD, mas, curiosamente, com a ordem cronológica invertida.

Natacha Intégrale #1: Panique à bord!
François Walthéry, Gos, Borgers e Wasterlain (argumento)
François Walthéry (desenho)
Dupuis
Bélgica, Junho de 2007
300 x 218 mm, 160 p., cor, capa dura
ISBN: 9782800137889
20,95

(imagens do álbum disponibilizadas pela editora; capa portuguesa recolhida no site BDPortugal; clicar nas imagens para as aproveitar em toda a sua extensão)

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