07/09/2020

Random

À cacetada






Digam todos o que disseram, uma ou outra vez já tivemos vontade de fazer o mesmo que o protagonista deste Random: resolver algumas questões à cacetada, mesmo tratando-se - tantas vezes…! - de picuinhices que o momento, a (nossa) actualidade, o (nosso) contexto transformaram no (quase) desencadear da tempestade perfeita emocional.

No caso do protagonista desta história de Miguel Peres, esses momentos quotidianos de raiva e frustração - um incidente no trânsito, um espectador incómodo no cinema, a falta de educação de alguém - passaram a servir de escape recorrente de tensões e sabe-se lá bem mais o quê, acumulados numa vida em que o dia-a-dia raramente permite descontrair e descomprimir.
Num curto paralelismo com Kick-Ass - especialmente com a primeira parte do volume inicial, pois os propósitos e objectivos da criação de Millar e Romita Jr. são bem diferentes - o protagonista passa a utilizar um taco de basebol para colocar no seu lugar - no lugar em que ele acha que devem estar… - aqueles que, de alguma forma, o incomodam, utilizando, como complemento do taco, uma singular máscara para manter o seu anonimato.
Com momentos indiscutivelmente divertidos - o que não abona muito a nosso favor, leitores - Random, numa narrativa feita de avanços e recuos, vai-nos mergulhando numa espiral de violência, cujo final - (quase) inevitável dado o tom realista que prevalece no todo - aos poucos vamos adivinhando, sentindo, algures entre o aliviados e o desiludidos, que não é à ‘tacada’ que o mundo ficará melhor…
Ao lado de Miguel Peres, nesta crónica social, estreia-se o brasileiro Marcus Aquino, cujo traço revela agilidade e dinamismo, embora precise de desenvolver uma maior definição ao nível do acabamento e dos pormenores. E que, por isso mesmo, possivelmente, teria ganho se o livro tivesse um formato menor, perfeitamente aceitável para a grande maioria das páginas, quase sempre com três tiras por base, sendo frequentes vinhetas de página inteira que ajudam a pontuar os momentos de maior tensão - ou escape dela através da violência exacerbada que perpassa por grande parte das cenas que dão corpo a este ‘conceito controverso e absurdista’, como o classifica o próprio argumentista.

A edição
Lançado graças a uma subscrição em crowdfunding, Random surge agora disponível para venda em geral através do mail… porque o valor angariado permitiu a impressão de meia centena de exemplares a mais. Não demorem portanto a adquirir.
Colocando de lado a questão do formato já referida convém salientar que a edição, bem impressa e com bom papel, apresenta três outras versões diferentes de Random: as de Miguel Mendonça, que assina a capa, de Miguel Montenegro, autor da história de 4 páginas que complementa o relato principal, e de Jorge Coelho, responsável pela ilustração que encerra o volume.

Random
Miguel Peres e Miguel Montenegro (argumento)
Marcus Aquino e Miguel Montengro (desenho)
Fabi Marques (cor)
Bicho Carpinteiro
Portugal, Julho 2020
195 x 270 mm, 80 p., cor, capa mole com badanas
14,90 €

(imagens disponibilizadas pela Bicho Carpinteiro; clicar nas imagens para as aproveitar em toda a sua extensão)

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