04/06/2021

Fahrenheit 451

Amor aos livros



A banda desenhada (também) vive de modas e, uma das actuais, é a adaptação de obras da literatura.
Porque os originais entraram no domínio público, porque pode ser uma forma de levar os clássicos aos mais novos ou simplesmente... porque sim.
Em Portugal, temos também assistido a este ‘fenómeno’, sendo o exemplo mais recente - mas não último - esta nova leitura do clássico de Ray Bradbury, por Tim Hamilton.

A verdade, incontornável, é que há obras mais fáceis de adaptar do que outras e se algumas podem ser contadas em BD quase sem texto, outras, pelas suas características próprias, não conseguem fugir - suficientemente…? - à escrita original. A este factor há que adicionar uma questão relevante em relação às ‘adaptações autorizadas’, como esta, que geralmente ‘carregam’ com elas a obrigação de ‘utilizar’ muito do que o romancista escreveu. A exemplo de 1984 há semanas lido por aqui. é o que acontece com este Fahrenheit 451, mas reconheço que seria difícil fazê-lo de outra forma.

A história passa-se num futuro indefinido, numa realidade distópica, em que os bombeiros se tornaram incendiários de livros, tornados objectos proibidos. Incendiários de livros, juntamente com as casas em que os encontram e os respectivos donos...

O protagonista é um desses bombeiros, Montag, que a certa altura, fruto de encontros fugazes com uma jovem, começa a questionar tudo que até aí considerava normal e a desenvolver curiosidade pelos livros que queimava - o que de certa forma o vai transformar num rebelde perante as autoridades oficiais.

Obra de ritmo geralmente lento, bastante limitada a espaços fechados recorrentes, para mais baseada em diálogos e em pensamento interior, revela nesta adaptação em BD alguma falta de ritmo, pelo menos em algumas cenas de maior acção não foi pena não terem sido melhor aproveitadas narrativamente.

Apesar disso, o traço pouco pormenorizado e esquemático de Tim Hamilton adequa-se bem ao tom sombrio e pessimista do relato, realçando-o até através da selecção de uma limitada paleta de tons e a forma como é feita a sua utilização em manchas - nas quais a abertura dos balões de diálogo a branco não foi muito feliz.

Pese embora os aspectos apontados, esta ‘adaptação autorizada’ de Hamilton revela-se uma boa porta de entrada no original de Bradbury, cultivando o seu espírito e mantendo a sua base narrativa, conseguindo realçar a importância dos livros - e da sua leitura… - da auto-determinação e do livre arbítrio, patentes progressivamente ao longo do relato e de forma especialmente emotiva no capítulo final - cuja versão em filme de 1966, da autoria de François Truffaut, que vi há décadas, nunca mais esqueci.


Fahrenheit 451
Adaptação do romance de Ray Bradbury
Tim Hamilton
Relógio D’Água
Portugal, Maio de 2021
151 x 228 mm, 168 p., cor, capa cartão, com badanas
EAN : 9789897830723
17,00 €

(imagens disponibilizadas pela Relógio D’Água; clicar neste link para apreciar outras ou nas aqui mostradas para as aproveitar em toda a sua extensão)

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