12/10/2021

Umbigo do Mundo #1

Ponto de partida


O arranque de qualquer série é sempre complicado. Numa série de ficção-científica, a situação agrava-se. Se como em todas as outras, não se conhecem os intervenientes, logo não há cumplicidade entre eles e o leitor, o desconhecimento dos universos fantasiosos em que geralmente se desenrolam, impossibilita qualquer identificação com eles por parte de quem lê, o que não acontece em séries contemporâneas ou historicamente datadas.
É o que acontece em alma mãe, o ponto de partida de Umbigo do Mundo, a nova série criada por Carlos Silva e Penim (Loureiro).

Ambientada num futuro distópico, em que o mundo terrestre e a sua organização social e urbanística, foram completamente alterados por uma série de acontecimentos iniciados por uma praga misteriosa responsável pela morte de grande parte das mulheres (aspecto interessante completamente omitido no seu desenvolvimento), Umbigo do Mundo apresenta-se ao leitor como uma completa incógnita.

À partida, sabemos quem são os protagonistas: Alma, uma estranha jovem que desafia a situação instalada; Caio Édipo, que lhe chama ‘mãe’; o coronel Peres Pinto, que fala com os mortos; Spiro, o génio criador de um oráculo infalível (?) que todos querem. Ao lado de Alma, surgem ainda Jiro, um andróide histriónico, e um mabeco.

Com a narrativa dividida por diferentes épocas, com a informação sobre a realidade presente e os diversos acontecimentos que conduziram a ela a ser menor do que as muitas perguntas que se levantam aos leitores, estes últimos acabam por se sentir algo perdidos, para mais sem pontos de referência reconhecíveis que lhes sirvam de conforto.

Para a sustentação da série - e a sua continuidade, sendo que já está anunciado um volume 2, do qual se vêem algumas pranchas no dossier de extras do final deste volume - será necessário que os autores comecem a esclarecer os muitos mistérios que até agora criaram, dando algum conforto e pontos de suporte a quem lê.

Desta forma, o grande trunfo de Umbigo do Mundo é, indiscutivelmente, o seu lado gráfico. Com referências (identificáveis) da BD franco-belga, tanto quanto do manga e dos comics de super-heróis, Penim criou um estilo dinâmico e desafiador, eficiente nas cenas mais pausadas, em que surgem realçados os cenários depurados mas esteticamente belos, tanto quanto nas muitas cenas de acção, em que a representação de movimento e a energia transbordante das personagens aceleram a leitura e disparam a adrenalina. A planificação variada, entre a mais tradicional e os enquadramentos bebidos nos autores americanos e japoneses, que ultrapassam os limites entre vinhetas e multiplicam a tomada de pontos de vista e os planos utilizados, bem como a utilização de um colorido suave (após alguns excessos nas páginas iniciais…) e com função narrativa, contribuem igualmente para tornar este livro visualmente apelativo e estimulante, a um nível raramente visto na banda desenhada portuguesa.


Umbigo do Mundo #1 alma mãe
Carlos Silva (argumento)
Penim (desenho)
A Seita/Comic Heart
Portugal, Setembro 2021
240 x 320 mm, 80 p., cor, capa dura
14,00

(imagens disponibilizadas por A Seita e a Comic Heart; clicar nesta ligação para ver outras pranchas ou nas aqui mostradas para as aproveitar em toda a sua extensão)

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