10/03/2022

Martin Mystère: Expediente Excalibur

Lenda, verdade, ficção...



Entre a grande diversidade do catálogo da Sergio Bonelli Editore, há um título que se destaca pelo seu lado culto - deixem-me escrever assim, para me facilitar a tarefa. Refiro-me a Martin Mystère, o detective do impossível, um misto, antes do tempo, de Indiana Jones e do professor Robert Langdon, que investiga lendas antigas, casos que roçam o paranormal e mesmo o extraterrestre ou os grandes mistérios da humanidade.

Assentes geralmente num fundo de verdade - ou em lendas que advêm da antiguidade - as narrativas são depois compostas com um misto de verdade e ficção, sendo apresentadas ao leitor como casos reais que o protagonista investiga e apresenta - ou não... - no seu programa televisivo. Em Martim Mystère, em especial na sua fase inicial, estamos perante argumentos muito consistentes, bem escritos e desenvolvidos, com muita informação para o leitor se sentir a par do - lado culto do - protagonista.

Ao seu lado, está sempre Java, um homem do Neanderthal que encontrou numa das suas aventuras e, muitas vezes, Diana, primeiro sua noiva eterna, depois sua esposa - sem que a mudança de estado civil tenha alterado grandemente a relação de ambos ou o peso e a importância da participação dela.

Como opositor recorrente - assim como Olrik em Blake e Mortimer - surge Sergej Orloff, antigo companheiro de Mystère que ficou desfigurado num dos seus primeiros confrontos, tendo abraçado definitivamente o lado do mal.

Em termos pessoais, sinto-me mais atraído pelos relatos baseados em lendas ou mitos que passaram de geração em geração, como a eventual existência da Atlântida, a Arca de Noé, Stonehenge ou Excalibur, a espada do Rei Artur, que está no centro da primeira das duas histórias deste (grosso) volume.

De forma interessante, Mystère coloca a mítica espada em épocas mais antigas, confere-lhe uma curiosa origem e faz dela um símbolo de poder, cobiçado por inúmeros ditadores ao longo dos tempos, entre os quais Hitler. Este passeio pela História permite ao argumentista ir saltitando entre o passado e o presente, alternando entre a maior carga informativa daquele e a acção deste, para assim agarrar o leitor e mantê-lo interessado e suspenso dos desenvolvimentos, para chegar ao fim e descobrir que afinal lhe foram contadas duas histórias.

No segundo relato, com muitos pontos de contacto com o primeiro, São Nicolau - que é como quem diz o Pai Natal - surge em destaque quando Mystère, num outro contexto, mais uma vez é arrastado para a procura daquele antigo símbolo antigo de poder e domínio

As duas histórias, pertencentes à primeira dúzia de anos do detective do impossível, considerada por muitos a fase mais criativa e original do seu argumentista e criador, Alfredo Castelli, surgem aqui com o desenho de Giancarlo Alessandrini, assente num traço fino um pouco rígido no tratamento do rosto humano, mas com toda a credibilidade para nos transportar aos sucessivos locais que o protagonista visita.

Com prefácio de Javier Serra e um posfácio em que Castelli esclarece a base dos dois argumentos e como define os limites entre a lenda, a realidade e ficção, este generoso volume quanto ao número de páginas pode ser uma boa porta de entrada num universo que aparentemente é o nosso, mas em que os limites das verdades que nos transcendem ou temos dificuldade em aceitar são bem mais estendidos.


Martin Mystère: Expediente Excalibur
Inclui: La Espada del Rey Arturo (publicado originalmente em Martin Mystère 15 e 16. 1983) e El Secreto de San Nicolás (Martin Mystère Gigante #1, 1995)
Alfredo Castelli (argumento)
Giancarlo Alessandrini (desenho)
Aleta Ediciones
Espanha, 2007
160 x 210 mm, 432 p., pb, capa cartão

(clicar nas imagens para as aproveitar em toda a sua extensão)

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