08/02/2011

L’Île aux Cent Mille Morts

Fabien Vehlmann (argumento)
Jason (desenho)
Glénat (França, 19 de Janeiro de 2011)
240 x 320 mm, 56 p., cor, cartonado, 15,00 €

Resumo
Há cinco anos, depois de partir à procura de um tesouro, após encontrar um mapa numa garrafa que deu à costa, o pai de Gweny nunca mais deu notícias.
Desde essa altura, ela deseja ir à sua procura, o que se torna possível no dia em que encontra nova garrafa na praia. Reúne uma equipagem de piratas, desejosos de se livrarem dela na primeira oportunidade, e parte em busca do lendário tesouro da Ilha dos Cem Mil Mortos.
Desconhece que as garrafas com mensagens não passam de uma artimanha para atrair curiosos à ilha onde funciona uma escola de carrascos…

Desenvolvimento
É assim que um relato que parecia ser uma história típica de piratas, com ilhas desertas, tesouros e traições a par da busca de um pai desaparecido por uma filha que “dourou” a sua imagem, resvala rapidamente para uma história negra e absurda, ao mesmo tempo que é cruel e melancólica.
Crueldade e melancolia que nem sequer o aparente final feliz (sê-lo-á mesmo?) consegue iludir, já que o cumprir de objectivos de Gweny resultam em desilusão e Tobias, o amigo e aliado que há-de encontrar no decorrer do relato, é um falhado, desiludido com a vida que leva e incapaz de a tentar mudar.
Por isso, também, realce na história para o humor, negro, por vezes muito negro, e para o absurdo que Vehlmann claramente se diverte a espalhar pelo argumento, por vezes em pequenos pormenores que, no entanto, fazem toda a diferença, pois surpreendem e dispõem bem o leitor, dispondo para seguir a leitura, mesmo que aquele ande a par de uma violência, menos gráfica do que mental mas incómoda, que, não sendo gratuita, também não conhece grandes limites. Deixo alguns exemplos: a emulação dos velhos de “Astérix na Córsega” que, comentando a acção, originam um flashback que tem por base a doença de Alzheimer! (página 4); o desentendimento entre a mãe (louca) e a filha (tão ou mais louca?) (p.5-6); a referência escatológica no diálogo de Gweny com o chefe dos piratas (p. 8); o estratagema daquela para conseguir um aliado no barco (p. 11); quase todas as “aulas” (de tortura e morte) na original “escola de carrascos”, etc., etc…
A par destes pormenores que elevam a qualidade e aumentam o interesse da narrativa, esta demonstra ainda uma grande legibilidade e uma boa cadência, pese embora a planificação tradicional de Jason, praticamente imutável no formato de 3 tiras de 3 vinhetas por prancha. O que é contrabalançado pela diversidade de pontos de vista utilizados, sem grandes audácias gráficas, sim, mas que ajudam a transmitir a sensação de movimento e “puxam” pelo leitor por páginas tornadas bastante agradáveis, devido ao uso de cores lisas cujos tons ajudam a definir os diferentes momentos e locais da acção.
Em jeito de conclusão, para que não haja ilusões: esta história deve ser lida como um (simples…) divertimento, bem conseguido, não tão ligeiro no entanto quanto (em especial o traço de Jason) pode aparentar, o que não lhe retira méritos nem ambições. Pelo contrário.

A reter
- Os pormenores negros e absurdos do relato.
- A forma divertida e inventiva como os (aparentes) pressupostos iniciais são completamente subvertidos.
- A legibilidade do conjunto.

Menos conseguido
- O olhar vazio e inexpressivo das personagens de Jason (uma das suas “marcas pessoais”), devido aos seus olhos serem completamente brancos.

Curiosidades
- A parceria entre Vehlmann, um dos argumentistas em crescendo no meio franco-belga, e o norueguês Jason, autor alternativo que é presença assídua no catálogo da Fantagraphics Books. - Esta é uma das obras que pode ser lida em entregas semanais, online, no site gratuito Comix 8.

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