15/09/2011

Jean-Paul Mougin (1941-2011)

Comunicado das edições Casterman:“Foi com grande tristeza que soubemos da morte de Jean-Paul Mougin, falecido na passada terça-feira, 13 de Setembro de 2011, em Bruxelas, com a idade de 70 anos.
Jornalista e editor de uma estatura excepcional, Jean-Paul Mougin foi, no final dos anos 70, o mítico fundador da revista (ÀSuivre), lançado pelas Edições Casterman, periódico de que assumiu a direcção continuamente durante 20 anos, escrevendo assim algumas das mais belas páginas da história da banda desenhada europeia. Retirado do mundo da edição há uma dúzia de anos, manteve, no entanto, um olhar atento sobre a criação em banda desenhada.
Formado na televisão, no tempo da ORTF, e expulso do serviço público na sequência do movimento de 68, muito sensível à imagem sob todas as suas formas, Jean-Paul Mougin começou nos quadradinhos na redacção do semanário Pif Gadget, onde aprendeu a reconhecer e a apreciar as grandes assinaturas da época: Jean-Claude Forest, Paul Gillon, Nikita Mandryka, Gotlib...
Teve um papel decisivo no lançamento da carreira francesa daquele que viria a tornar-se seu amigo para sempre, Hugo Pratt. Alguns anos mais tarde, o autor de Corto, cujos álbuns tinham começado a ser publicados pela Casterman, apresentou por sua vez Jean-Paul Mougin ao seu editor. O projecto (À Suivre) iria nascer desse encontro.
Lançada em Janeiro de 1978, no quinto Salão de Angoulême a (À Suivre) de imediato fez sensação no mundo da banda desenhada. A sua identidade editorial, então muito original, imaginada por Jean-Paul Mougin para este novo título – uma banda desenhada exigente adulta a preto e branco, com ambições literárias assumidas, livre das restrições de formato existentes por toda a parte – encontrou de imediato um público entusiasta, bem como uma expressão que ficou célebre, formulada no primeiro editorial da nova revista: “a (À Suivre) será a erupção selvagem da banda desenhada na literatura (...)” Durante duas décadas, Jean-PaulMougin e a sua revista mantiveram com paixão e fervor a promessa do “romance em banda desenhada”, não interditando nenhum género, nenhuma aventura, nenhuma intuição.
O número de autores assim revelados ou consagrados é demasiado grande para que façamos a sua listagem completa - Pratt e Tardi, claro, mas também Schuiten e Peeters, Ted Benoit, Sokal, Manara, Loustal e Paringaux, Comés, Muñoz e Sampayo, Ferrandez, Rochette, Geluck, Boucq, Cabanes, Baru, mais tarde, jovens talentos como Nicolas De Crécy ou Nicolas Dumontheuil, e tantos outros -, mas assemelha-se muito a um repertório dos grandes nomes da banda desenhada contemporânea. Tendo ficado míticos na memória de muitos profissionais, a (À Suivre) e Jean-Paul Mougin foram bem mais do que uma revista de sucesso e o seu talentoso redactor-chefe: eles moldaram, em parte, o que a banda desenhada é hoje.
Jean-Paul Mougin decidiu retirar-se no fim dos anos 90, ao mesmo tempo que terminava a trajectória da sua revista, em 1997. Todos aqueles que o conheceram guardam a lembrança de um ser humano envolvente e caloroso, duma grande generosidade, que prezava mais do que tudo os valores da fidelidade, da cultura e da inteligência.”

Para mim – como para muitos da minha geração – a (À Suivre) foi um marco.
Uma revista – no tempo em que elas existiam e eram fundamentais – cujo trajecto apanhei já a sua vida ia longa, mas ainda a tempo de (re)descobrir uma nova forma de ser e fazer banda desenhada, adulta, apelativa, desafiante, estimulante, nas assinaturas de Tardi, Schuiten e Peeters, Pratt e Manara, Comés, Muñoz e Sampayo, Geluck, Boucq, Bourgeon, Cabanes… Sim a lista é longa… e impressionante!
Possivelmente, a (À Suivre) foi o veículo que me permitiu continuar a ler BD, dar o salto da juventude para a idade adulta com os quadradinhos, transitar da BD de aventuras para o romance desenhado.
Por isso, o meu obrigado a Jean-Paul Mougin porque sem ele, quem sabe, talvez não estivesse hoje aqui a escrever, talvez não tivesse feito da BD o centro da minha vida profissional, talvez não tivesse mantida acesa a chama da paixão que nutro por uma forma única de expressão.

2 comentários:

  1. (À Suivre) foi uma revista que nos marcou a todos, aos que ainda eram jovens em 1978 e nos anos 80, e aos já menos jovens; foi um ponto de viragem, a charneira entre duas etapas evolutivas na maneira de fazer (e ler) BD, um «laboratório» de experiências e de infinitas possibilidades para muitos criadores que, de outra forma, tardariam a encontrar o seu caminho e a plenitude do seu discurso pessoal.
    E foi também o produto de um curioso acaso, de um encontro (fortuito) e de uma amizade entre duas figuras unidas pela mesma paixão dos quadradinhos como forma (lúdica) de arte e de literatura: Mougin e Pratt. Se um descobriu o outro, lançando-o no mundo da BD francófona e expandindo à escala universal o seu nome como criador de Corto Maltese, Pratt descobriu Mougin e a sua vocação para fundir universos paralelos, continuando em (À Suivre), com o cadinho da literatura, a moldar histórias que não poderiam ter nascido de outra maneira, autênticas BD «fleuve» que desaguavam nos oceanos do vanguardismo, da criatividade e da imaginação, para nossa surpresa e encantamento. (Já tinha havido outras, nas décadas anteriores, mas dirigidas a um público que ainda não convivia com as formas literárias).
    É pena que Mougin tenha partido tão cedo, mas a sua herança (e a de Pratt) não será esquecida... mesmo quando olhamos, com tristeza, para o panorama da BD actual e lamentamos o desaparecimento de tantas revistas que, como a (À Suivre), foram o único «palco» onde se forjaram novos laços entre os autores e o público (a capa de Tardi, no nº 239, simboliza bem essa relação).

    Jorge Magalhães

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  2. Caro Jorge magalhães,
    Obrigado pela sua participação, mais avalizada ainda por ser alguém com uma ligação tão forte às revistas de BD que hoje já não temos.
    Boas leituras!

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