27/02/2012

Castro











Colecção écritures
Reinhard Kleist
Casterman (França, 4 de Janeiro de 2012)
173 x 241 mm, 328 p., pb, brochada com badanas
18,00 €



Resumo
Biografia aos quadradinhos do líder cubano Fidel Castro, desde a juventude até abdicar do poder, mais de quarenta anos depois.

Desenvolvimento
Esta é uma biografia na plena acepção do termo. Uma narrativa forte e intensa tal como aquele que é seu objecto, Fidel Castro, líder dos destinos de Cuba durante mais de quatro décadas e um dos mais carismáticos políticos de que há memória.
Conhecemo-lo através de Karl Mertens, um fotógrafo alemão que desembarcou na ilha em 1957 com o objectivo de o entrevistar e que, seduzido pelo seu discurso – pela sua presença, pela sua força interior, pelo seu carisma - ficou na ilha – onde casaria com uma das guerrilheiras de Fidel - e acompanhou todo o seu percurso.
Dessa forma, o também alemão Reinhard Kleist - que passou um mês em Cuba a fotografar, desenhar e fazer entrevistas e muito mais tempo a ler muito sobre Fidel na preparação deste livro - consegue humanizar o relato sem lhe retirar o rigor histórico nem o tornar demasiado pesado.
Mas sejamos justos. Se esta é uma biografia, ela é uma biografia romanceada, por assim dizer, da qual não se deve esperar imparcialidade nem isenção – se é que isso é alguma vez possível.
Por isso, numa primeira fase, o retrato fornecido por Mertens/Kleis não é inocente nem objectivo. Na primeira parte deste grosso tomo - são quase 300 páginas desenhadas - é evidente o fascínio do fotógrafo – e de Kleist – pelo governante cubano.
Por isso, esse retrato inicial é traçado por alguém rendido a um ideal consubstanciado num homem de personalidade forte e palavra fácil, capaz de lutar até ao fim por aquilo em que acredita. É dessa forma que acompanhámos o seu percurso desde o início, ainda na fazenda dos pais quando já defendia os mais desfavorecidos, passando pela guerrilha nas vertentes da Sierra Madre até ao derrube do governo vigente e à conquista do poder.
E, depois, num período breve de euforia, de confiança em dias bem melhores, de crença “em amanhãs que cantam” – é inegável o endeusamento de Fidel por tantos com quem se cruzou – segue-se- rapidamente - o estabelecimento do seu governo, os saneamentos políticos, os desvios ao programa, a supressão de liberdades, o confronto com os que lhe eram próximos, a instalação de uma ditadura de sinal contrário.
E à medida que isto se passa, que o sonho – a utopia? – começa a derrapar, enquanto o desencanto aumenta à medida que se torna evidente que, em muitos aspectos, a revolução falhou em termos de objectivos e esperanças face à dura realidade e às graves dificuldades que o povo cubano tem que enfrentar, com escassez dos bens essenciais e do cercear da própria liberdade de expressão, o mesmo acontece com o olhar de Kleist, que ganha distanciamento, que questiona e interroga, num surpreendente divergir do olhar de Mertens, o fotógrafo que – não contra todos mas contra muitos e alguns dos que lhe são mais próximos – mantém inabalável a fé em Fidel e inalterável a sua confiança nele. Naquele que é, sem dúvida, um dos pontos mais conseguidos deste belo romance, por proporcionar ao leitor a oportunidade de ponderar as duas posições e optar pelo seu próprio posicionamento, á revelia de ideias pré-concebidas.
E se a história – esta história, a história de Fidel - não é nova – não podia nem pretendia ser – surge aqui com uma roupagem pouco habitual, pois poucas vezes a BD terá biografado alguém de forma tão completa e intensa.
A par do processo narrativo já aflorado, graficamente atente-se nas pinceladas negras com que Kleist compõe as suas páginas, num traço ágil e dinâmico que também se revela bem expressivo, com o qual nos conduz com elegância e o ritmo adequado por um período fundamental e apaixonante da História do século XX que, para lá da revolução em si inclui a tentativa de invasão de Cuba pelos norte-americanos, a crise dos mísseis soviéticos que chegou a pôr em causa a sobrevivência do próprio planeta ou a relação conturbada de Fidel e Che Guevara.

A reter
- O tom intenso da narrativa, a sua força.
- A forma como muda o posicionamento do autor ao longo desta biografia romanceada, em contraste com o percurso do seu narrador, o que só aumenta o seu interesse e credibilidade.
- O dossier final que reproduz esboços e desenhos feitos por Kleist em Cuba.

Menos conseguido
- Valesse alguma coisa o acordo ortográfico que alguns impuseram – querem ainda impor? - como reflexo da existência real de um grande mercado livreiro de língua portuguesa e talvez fosse possível encontrar nas livrarias portuguesas a edição brasileira de Castro, da responsabilidade da 8inverso; como não é…
Curiosidade
- Este é mais um tomo da colecção écritures, que já diversas vezes referi aqui em As Leituras do Pedro, que no próximo mês completa 10 anos de bons serviços. Conto voltar a ela, repetidamente, nas próximas semanas.


2 comentários:

  1. Obra candidata à pior capa do ano.

    Lili

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    Respostas
    1. Olá Lili!
      Nem sempre os melhores "embrulhos" trazem os melhores presentes. Se a capa, na verdade, não é famosa, a BD é muito boa.
      Boas leituras... de livros com capas bonitas!

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