18/09/2018

La Mort Vivante

Boas influências




Narrativa neo-gótica de ficção-científica, que adapta o romance homónimo, de 1958, de Stefan Wul, La Mort Vivante é o novo álbum do português Alberto Varanda, onde demonstra todo o seu virtuosismo, sob a influência de grandes génios do traço.
Vamos contextualizar: estamos alguns séculos no futuro. Após confrontos que inviabilizaram praticamente a vida na Terra, a humanidade emigrou para Marte, colonizado e tornado habitável. A par dos seres humanos, aranhas gigantescas feitas animais domésticos e polvos de estranhos poderes, povoam também estes mundos, onde paira a decadência a par da incapacidade de libertação do passado.
Martha é uma antiquária e contrabandista de artefactos dos tempos antigos, que perdeu a sua filha, Lise, de apenas 10 anos, devido a uma queda num poço profundo, durante uma das suas explorações. Anos depois, o rapto (semi-voluntário) de Joachim, um biólogo caído em desgraça junto do poder devido à sua ligação à antiga ciência terrestre e ao seu amor pelos seus suportes - leia-se os livros - tem como objectivo clonar a sua própria filha para a fazer reviver.
Narrativa fechada, num universo possível com muito por explorar, La Mort Vivante combina o relato de antecipação (com clonagem e ciborgues no topo do icebergue), com o de terror, tendo por suporte um traço classicista que dá vida a uma mescla de cenários futuristas com o período vitoriano, à imagem de As Cidades Obscuras, com Varanda a brilhar a grande nível com um traço detalhado e sombrio, realista na exploração do ser humano e espetacular quando dá livre curso à imaginação ao seu virtuosismo em painéis de prancha inteira. E cuja grandiosidade pode ser melhor apreciada na edição a preto e branco de grande formato também disponível.
Para lá das questões e das respectivas implicações, técnicas e éticas - sempre latentes - sobre a vida, o seu prolongamento, a sua substituição, La Mort Vivante é um desfilar de influências - assumidas e assimiladas - quer da literatura, com Lovecraft à cabeça, quer do desenho, com Gustave Doré (e a sua técnica assente no recurso a um tracejado múltiplo), Bernie Wrightson (mestre da ilustração de horror) e François Schuiten (na combinação de passado e futuro num todo funcional) a destacarem-se.
Assumindo um tom cerebral, em que os diálogos e a narrativa interior de Joachim é que proporcionam a contextualização e os avanços, o relato de Vatine surge ao leitor incómodo e inquietante, deixando voluntariamente em suspenso questões funcionais e apresentando um final em aberto que reforça o seu desconforto geral.

La Mort Vivante
Oliver Vatine (argumento e cor)
Alberto Varanda (desenho)
Comix Buro
França, 22 de Agosto de 2018
240 x 320 mm, 72 p., cor, capa dura
15.50 €

(imagens disponibilizadas pela editora; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)

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