08/11/2018

Primavera del 68

Desdobramentos




Se há algo que se tem de reconhecer à actual direcção da Sergio Bonelli Editore, é a capacidade de diversificar a sua linha editorial, sem trair os seus princípios e as suas linhas mestras.
Os resultados, vão-se multiplicando à vista de todos.
[E o crossover com a DC Comics, anunciado há dias em Lucca, cujas hostilidades abrirão em 2019 com a parceria entre Zagor e Flash (!), é apenas mais um passo.]
O predomínio de Tex mantém-se, seguro nas bancas - tanto quanto é possível nos dias que correm -, omnipresente em sucessivas colecções com jornais e invadindo paulatinamente as livrarias em edições cuidadas que, se de alguma forma renegam as origens e o espírito populares do ranger, por outro fazem jus à arte - escrita e desenhada - que o suporta e satisfazem o gosto de leitores que (outr)os hábitos de leitura tornaram mais exigentes.
Ao mesmo tempo, há uma aposta concreta e definida numa diversificação temática, quer em publicações regulares de banca, quer em edições soltas.
Desta forma - desdobrando-se na forma, no estilo e no(s) conteúdo(s) - a Bonelli tem chegado a outros públicos e, também a outros países. Acolecção que a Levoir editou este ano em Portugal - fora dosparâmetros ‘tradicionais’ da casa italiana - é um exemplo; as diferentes editoras que no Brasil vão editando os seus heróis é outro; a recém-criação de um ‘selo’ Bonelli pela Panini espanhola pode ser um terceiro modelo.
Este último acaba de se estrear, em edições (muito) cuidadas, com fartos extras, de formato similar à colecção da Levoir, em capa (mais) dura e papel de boa (e melhor) gramagem (que aquela) - apontando claramente às livrarias e a leitores com outras exigências quanto ao ‘objecto’ de leitura. E desdobra-se numa temática dual, apresentando por um lado o mais ‘popular’ Dragonero - a que voltarei em breve - e por outro um one-shot que parte de uma base histórica - como o muito interessante Le Storie: Sangue e Gelo - como sustentáculo da ficção que o preenche.

Primavera del 68 - com edição original italiana de Maio deste ano - tem a assinatura - na ideia base, na concepção e no argumento - de Gianfranco Manfredi - a quem volto mais cedo do que esperava - e está segmentada em duas partes distintas. Na primeira, passada na tal Primavera de 1968, acompanha a participação, mais ou menos empenhada, por razões díspares, de seis jovens - Lina, Margherita, Paolo, Armando, Milo y Turi - nas manifestações e movimentos que tiveram lugar em Milão, a exemplo do modelo que chegava de França.
Na segunda, vinte anos mais tarde, um fotógrafo que os retratara numa das manifestações, tenta descobrir o que foi feito deles, no que se tornaram, como os sonhos e expectativas de então se concretizaram - ou não - nas suas vivências actuais.
Estimulante na sua ideia base, Primavera del 68 sofre pelo facto de ter sido confinado apenas a um volume único e não ter originado, por exemplo, uma mini-série - (mais ou menos extensa) a exemplo de Face Oculta, outra criação de Manfredi - pois no final da quase centena e meia de pranchas deste volume fica a sensação de que ficou por narrar muito dos percursos - com opções, incidentes e acidentes - que levaram cada um deles a ser o que são no presente (do relato).
Os condicionalismos do início, a força de vontade de cada um, a sua condição social e financeira, os ideais - ou a falta deles -, as relações, o oportunismo, a dedicação, a entrega, a capacidade de reagir às derrotas, a vontade de impor - e de se impor -, os encontros e desencontros ficam maioritariamente à imaginação do leitor, com a certeza que ‘nada ficou como dantes’ depois da vivência daquelas semanas intensas, vistas aqui sob uma outra óptica, mais humana, à margem de condicionalismos sociais e políticos.

Primavera del 68
Gianfranco Manfredi (argumento)
Luca Casalanguida (desenho)
Panini Comics
Espanha, 25 de Outubro de 2018
195 x 259 mm, 144 p., cor, capa dura
16,00 €

(imagens disponibilizadas pelo editora; clicar nelas para as aproveitar em toda sua extensão)

2 comentários:

  1. "[E o crossover com a DC Comics, anunciado há dias em Lucca, cujas hostilidades abrirão em 2019 com a parceria entre Zagor e Flash (!), é apenas mais um passo.]"

    Parece um crossover "para apanhar boleia" na popularidade no Flash desde a Tv em animaçao e imagem Real ou Cinema.

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  2. A nova direção da Bonelli aposta em produtos extremamente atraentes do ponto de vista literário e histórico, referindo-se a temas inerentes à Itália 🇮🇹 do século XX mas também a uma revisão do próprio Western, o qual é um género cultivado aqui na Europa e aqui ainda muito vivo tanto na BD como nalgum cinema. Vale a pena estarmos atentos a uma produção de extrema qualidade!

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