16/12/2019

Blueberry: A Mina do Alemão Perdido/O Espectro das Balas de Ouro

 
Viragem

Acho que será consensual dizer que este díptico de Blueberry, correspondente aos álbuns #11 e #12 da série, corresponde a um ponto de viragem nas suas aventuras e é nele que se afirma como um dos melhores westerns da banda desenhada.
Passo a explanar algumas das razões que, segundo a minha prometida releitura da série, a pretexto da colecção ASA/Público em curso, justificam aquela afirmação.
A primeira, está relacionada com a sua temática. Depois de dois ciclos de alguma forma balizados pelos seus contornos históricos - as guerras índias nos 5 primeiros álbuns e a construção do caminho de ferro que ligou os dois extremos dos Estados Unidos, na tetralogia O Cavalo de Ferro/O homem do punho de aço/A pista dos Sioux/O general “cabeça-amarela” - e do (mais) estereotipado O homem da estrela de prata, aqui Charlier aborda uma outra temática - recorrente também no género, reconheço - a busca da fortuna em minas de ouro, de uma forma bastante original.
Por um lado, porque constrói (mais uma vez, espelhando a sua imagem de marca) uma narrativa muito densa, com frequentes mudanças de orientação e constantes surpresas, em que o leitor é arrastado, como o próprio Blueberry, por um alemão de nome Prosit, na busca de uma fabulosa mina perdida. No seu rasto, com ele, atrás dele, surgem um McClure cego - semi-literalmente e pela perspectiva de fortuna -, dois caçadores de prémios e um bando de apaches, sendo que na verdade nem todos são o que parecem e nem todos tê,m os mesmos objectivos. Depois, de forma especialmente feliz, condimento a sua narrativa com um toque de sobrenatural - o tal ‘espectro’ que refere o título - que se torna uma elemento extra a despertar a curiosidade do leitor. A variação de situações e de paisagens, e o suspense constante de que o relato está imbuído, são outros elementos a considerar.
Do ponto de vista gráfico, penso poder escrever que este é o momento em que Giraud deixa definitivamente para trás as (muito boas) influências de Jijé. O seu traço revela-se mais solto e a caminho da desinibição que ostentará mais para a frente e alcançará a sua plenitude nas obras que assina como Moebius.
Em termos narrativos, o recurso frequente a apenas três tiras por página ou a quebra do esquema rígido de quatro tiras por página graças à utilização de vinhetas de grande dimensão, imprime uma maior dinâmica, permitindo ao mesmo tempo que Giraud demonstre o seu virtuosismo nos rostos, nas paisagens, nos detalhes… - e deixe os leitores a ansiar por uma edição de grande formato da obra…

Blueberry
#11 A Mina do Alemão Perdido
#12 O Espectro das Balas de Ouro
Jean-Michel Charlier (argumento)
Jean Giraud (desenho)
Relido na edição da Meribérica/Líber
Portugal, 1988
210 x 290 mm, 46/56 p., cor, capa mole

(imagens recolhidas na base de dados BD Portugal; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)

4 comentários:

  1. Sem dúvida um dos meus favoritos Blueberry/Giraud...obrigatório

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  2. Acabei de o ler à relativamente pouco tempo, e curiosamente para além da triologia dos dólares/Homem sem nome do Sergio Leone que vi na mesma altura numa reposição em cinema (a mesma busca pelo ouro) levou-me a decidir comprar a actual colecção do Público, uma vez que até ai nem era grande fã do Blueberry. Coincidências engraçadas

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  3. Para mim, pessoalmente, estes albums são mesmo de viragem artística e de legibilidade, o que não se perdeu são os grandes diálogos à moda de E. P. Jacobs que se tornam menos densos devido ao aumento das vinhetas mas não menos chatos e muitas vezes redundantes sobre as imagens que os suportam.

    Para mim Hermann com o seu Comanche e o seu Duke está a léguas, o western é americano por natureza e não francês ou belga, não tentando ser um purista estes pastiches palavrosos acabam por ser aborrecidos numa segunda leitura, sim está bem feito, é artístico, bla bla bla, mas é aborrecido.

    Blueberry é o personagem que menos visitei nas últimas décadas, agora o Incal...

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  4. Sergio Leone também fazia pastiches mas era um mestre a usar o silêncio, ele acreditava que uma imagem valia por mim palavras, Charlier não.

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