06/06/2020

Memórias de um homem em pijama


Um autor confinado



Descobri há muitos anos Paco Roca em Rugas, emocionei-me com A (sua) Casa, percebi o seu amor pelos quadradinhos em O Inverno do Desenhador e senti a sua força narrativa no magnífico e poderoso Os Trilhos do Acaso.
Agora, com este Memórias de um homem em pijama - em que mais uma vez tive o privilégio de o traduzir - descobri outro faceta de um dos autores que me habituei a seguir: o olhar crítico e mordaz sobre si próprio, sobre os seus amigos e sobre a sociedade em geral.

Memórias de um homem em pijama nasceu há cerca de uma década de um desafio do jornal Las Provincias que entregou ao autor valenciano um espaço semanal. A opção - como ele próprio conta no prólogo desta edição, foi retratar-se e ao seu mundo. O título, explicado na primeira história, vem da concretização de um sonho: viver em casa de pijama (quase) permanentemente, o que a sua profissão lhe possibilitou.
Na prática, é um confinado - mesmo que voluntário - antes do tempo - como ele também refere no posfácio que escreveu especialmente para esta edição da Levoir e de alguma forma foi (também) isso que (oportunamente) originou esta edição.
A estrutura da obra é simples e imutável: são histórias auto-conclusivas, sem título, com 12 vinhetas verticais, todas de igual dimensão, originalmente publicadas em duas tiras com 3 vinhetas em duas páginas. Na versão da Levoir, a estrutura passou a ter 3 tiras de 3 vinhetas por página, o que torna a leitura menos intuitiva, uma vez que desapareceu a quebra lógica entre as narrativas.
Se o tom geral é divertido ou, mais do que isso, satírico e mordaz, se (nos) vamos reconhecer em muitas situações - saídas nocturnas, vida a dois, adolescência tardia, solteiros vs. casados, pais/filhos - filhos/pais, guerrinhas parvas quotidianas (reais ou não, assumidas ou não) - nesta desconstrução implacável da vida social dos trintões solteiros, o principal mérito de Roca é a forma como se despe e despoja perante o leitor. Sem pejo, com alguns excessos (?), revela as suas idiossincrasias, as suas obsessões, os seus medos e receios, a falta de qualificações para uma vida em sociedade, destruindo aquela aura que certamente os seus leitores foram erigindo face às temáticas sérias e complexas que foi abordando ao longo da sua carreira.

Memórias de um homem em pijama
Paco Roca
Levoir
Portugal, 6 Junho de 2020
220 x 270 mm, 96 p., cor, capa dura
12,90

(imagens disponibilizadas pela Levoir; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)

7 comentários:

  1. Não encontrei nos lugares habituais. Não foi distribuído?

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Também não encontrei... e procurei em vários sítios.

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  4. Foi distribuido. No entanto, o Público distribui sempre por bancas que vendam regularmente. Se uma banca vende muita bd, normalmente tem mais hipoteses de receber. Ou então pede-se por encomenda.

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  5. A Levoir diz que o Paco Roca aprovou o novo formato, mas eu acho que é um assassinato ao livro, por razões comerciais. Imaginam o que é as "estórias" começaram a meio de uma página, acabarem a meio de outra, etc, sem título nem separador? Ainda bem que tenho a edição espanhola, e é essa que vou continuar a comprar para oferecer.

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    1. Teria sido preferível optar por uma montagem de 4x3 ou 3x4 vinhetas ou, preferencialmente, assinalar o final de cada 'história' com a palavra 'fim' ou um qualquer elemento gráfico que situasse os leitores.
      Boas leituras!

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  6. @RC Precisamente,. Não se percebe a opção da Levoir em alterar o sentido original de leitura de 6 + 6 vinhetas quebrando as pranchas em 9. Parece tudo confuso e sem nexo. Só fico perplexo como o autor deu aprovação a isto...

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