24/11/2020

Bruno Brazil: Black Program 2

A caminho da grande aventura


Aquilo que poderemos chamar 'grande aventura' - muita acção, adrenalina, situações impossíveis, volte-faces inesperados... - era, sem dúvida uma das imagens de marca de Greg e o melhor elogio que se pode fazer a este regresso (também mediático) de Bruno Brazil é que o grande argumentista belga certamente não se importaria de assinar este díptico.

O que não significa que o trabalho de Bollée (mais) e Aymond (menos) seja perfeito, mas tudo parece indicar que está no bom caminho. Tal como o trabalho editorial da Gradiva.

[Faço um ligeiro parêntesis no meu raciocínio, para recordar o que está em curso, desde o volume 1: após um atentado bem sucedido contra Ottoman, e o rapto - seguido de mutilação - de Rebelle, Bruno Brazil reúne os elementos que restam da Brigada Caimão - Gaúcho, Whip, Nómada - para investigar o sucedido. A ligação destes dois casos ao desaparecimento de um engenheiro da NASA, que foi o primeiro astronauta em Marte, pontua um percurso recheado de violência e vítimas colaterais, que ainda traz - no presente álbum - muitas surpresas aos leitores.]

A retoma de personagens - míticas, principalmente - apresenta duas opções de base, embora com múltiplas variantes intermédias: mimetização do original ou retoma livre das personagens e dos conceitos.

As Novas Aventuras de Bruno Brazil estão mais próximas da primeira. Porque arrancam no ponto crítico em que os criadores de Bruno Brazil, Greg e Vance, deixaram a série; porque utilizam as mesmas personagens; porque mantêm a época em que decorre a acção, mesmo correndo o risco de tornar fantasioso e pouco credível - hoje - o que era antecipação legítima - há 40, 50 anos, podendo por isso soar um pouco datadas...

Mesmo assim, Bollée consegue servir-nos um argumento bem estruturado, credível a partir do momento em que aceitamos os seus pressupostos - mesmo os mais megalómanos - e que, a espaços, nos faz vibrar - e 'nós', aqui, somos aqueles que lemos Bruno Brazil na adolescência. Cumpre, portanto, com o desejado. Falta-lhe - e isso nota-se - uma equipa mais numerosa - a exemplo da Brigada Caimão original - em que a individualidade de cada um possa brilhar mais e outorgar variedade ao relato - e também a concessão de mais protagonismo em cenas de acção (para já) a Brazil e Gaúcho, que praticamente são só espectadores do movimentado desfecho...

E, depois de uma narrativa com estas características, ainda consegue fechar o álbum de forma satisfatória - ao mesmo tempo que deixa tudo escancarado para uma continuação, com uma verdadeira 'bomba' que remete para o lado mais humano que Greg, indubitavelmente, introduziu nesta série.

Graficamente, é pena que o traço de Aymond não esteja à altura do desafio que lhe foi entregue - nem da prestação de Bollée. A modernização era necessária, o afastamento do grafismo característico e único de Vance era inevitável, já que a sua mimetização seria sempre desastrosa, mas o desenhador francês falha em aspectos fundamentais como o dinamismo, a face do protagonista (quase sempre um estranho esgar) e as suas limitações tornam-se mais evidentes nas vinhetas de maiores dimensões, demasiado despidas e 'pobres'.

Sendo a criação de BD um processo de aprendizagem contínua, espera-se que, apesar do escrito, a dupla - mais Aymond que Bollée, na verdade - encontre o bom caminho para satisfazer de forma mais completa os muitos leitores nostálgicos de uma série que marcou uma época, quando brilhou nas páginas da revista "Tintin".


Mais à frente

Na introdução, referi propositadamente o trabalho editorial da Gradiva, que neste segundo volume surge mais adiantada do que os autores na tal evolução que referi - que também se exige neste aspecto.

A questão - traumática - da legendagem foi corrigida - neste como em álbuns de outras séries da Gradiva - com a eliminação dos 'NN' invertidos e dos 'II' serifados.

Por outro lado, a proximidade entre a edição dos dois volumes que compõem este díptico - tal como aconteceu em relação a O Guardião - merece ser realçada, porque garante rapidamente ao leitor a obra completa, o que potencia à editora um retorno mais imediato através do reforço das vendas, e se reflecte num aumento (mesmo que inconsciente) da confiança no seu trabalho editorial.


Black Program volume 2

As Novas Aventuras de Bruno Brazil #2

Laurent-Frédéric Bollée (argumento)

Phylippe Aymond (desenho)

Gradiva

Portugal, Novembro de 2020

235 x 312 mm, 56 p., cor, capa dura

16,50 €


(imagens disponibilizadas pela Gradiva; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)

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