05/02/2021

Rio #4: Salve-se quem puder

Apoteose


Construída num crescendo, esta série de 4 álbuns, termina agora em grande apoteose, reunindo num volume extremamente visual todos que até agora desempenharam papeis de destaque.
Rúben, o (agora) coronel Jonas Moura, Capitu, Bakar, Luana... juntam-se uma última vez, num tomo em que redenção e queda no abismo caminham lado a lado, sob a influência de forças sobrenaturais do bem e do mal e da própria natureza.

Tal como o álbum, que abre com um dos momentos culminantes desta saga para depois recuar no tempo, deixem-me também voltar um pouco atrás.

Em Salve-se quem puder retomamos a acção sete meses depois dos acontecimentos que já conhecemos. Rúben, murou a favela de Beija-Flor, anexou algumas das favelas vizinhas, acabou com o tráfico e criou uma economia interna, simples e funcional. Para lá chegar, usou muitas vezes a força, outras tantas a persuasão, e tornou-se um líder incontestado... internamente.

Porque fora dos muros de Beija-Flor, o governador do Rio de Janeiro - e o próprio presidente da república - trabalham para destruir aquele 'estado autónomo' que tenta vingar em terras brasileiras - e põe em causa opções, políticas e promessas (nunca cumpridas). Nem que isso implique fazer o exército avançar sobre a favela, a qualquer custo.

E é neste ponto que Louise Garcia e Corentin Rouge nos fazem retomar a leitura.

Os elementos que balizaram todo o relato continuam presentes: o toque de sobrenatural proveniente dos cultos ancestrais do Brasil, as paixões e ódios que continuam latentes, a violência policial - e militar -, a corrupção, o compadrio, os (imensos) interesses à margem da lei... E as relações, nem sempre claras, nem sempre pacíficas entre os elementos mais proeminentes da história.

E tudo isto concorre para que este quarto tomo assuma uma (ainda) maior força visual - a progressão de Rouge ao longo da série é assinalável - com muitas das suas pranchas - ou vinhetas de dimensões generosas - mudas no texto que (não) ostentam ou ensurdecedoras naquilo que revelam directamente ou fazem intuir, arrastando-nos na (corrente) narrativa para o grande final.

E se, chegados a este álbum, perguntássemos a quem leu os três anteriores como terminaria este relato, duvido que muitos fossem capazes de apontar na direcção correcta. Mas - acredito também - que serão menos ainda os que ficarão desiludidos com a cavalgada apoteótica que Garcia e Rouge nos prepararam, com os homens - e as mulheres, sublinhe-se -, o sobrenatural e a Natureza (aparentemente) unidos num mesmo propósito redentor e purificador.


Nota final

Escrevi no início desta colecção sobre a mudança de paradigma (e o risco) que ela representava nas parcerias da ASA (e da Levoir) com o Público.

Para além da sua incontornável qualidade intrínseca, os ecos que foram chegando, dos sites e blogs da especialidade e das redes sociais, parecem comprovar a adesão a esta aposta. Pela diferença gráfica e temática da proposta, pela sua curta extensão que a tornou mais apetecível, (pela localização da sua acção,,,?), possivelmente pela menor oferta disponível no momento da sua edição devido à pandemia.

É evidente que, como sempre, a confirmação definitiva da validade desta experiência será dada exclusivamente pelas vendas atingidas - e o momento actual deverá ser tido em conta na sua avaliação.

Parece uma aposta que pode ser repetida - assim seja mantido o (alto) padrão de qualidade agora apresentado - e o que não falta nos catálogos franco-belgas são (mini-)séries de dimensão semelhante. O futuro dirá se este é o(utro) caminho a trilhar.


Rio #4: Salve-se quem puder
Louise Garcia (argumento)
Corentin Rouge (desenho)
ASA / Público
Portugal, 21 de Janeiro de 2021
240 x 320 mm, 64 p., cor, capa dura
10,90 €

(imagens disponibilizadas pela ASA; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)

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