25/03/2021

D.A.D.

Eram os fanzines (2/3)


Repito a introdução de ontem: 'Quando comecei a dedicar-me à banda desenhada - para além da minha posição de leitor - as publicações, grosso modo podiam dividir-se em três tipos: álbuns (segmento em crescimento), revistas (em declínio) e fanzines.
Estes últimos, tinham na época a seguinte definição (mais ou menos) consensual: 'publicação independente, sem fins lucrativos, destinada a divulgar o trabalho de novos autores'.
Hoje, tudo mudou. Os álbuns predominam, as revistas acabaram e os fanzines encontraram novas formas.' [fim de citação] Entre elas, a publicação nas redes sociais.

Tal como as edições digitais, esta tem (pelo menos) as mesmas duas grandes vantagens: (quase) não tem custos associados, logo não implica investimento financeiro do(s aspirantes a) autor(es) e pode facilmente chegar aos potenciais interessados. O sucesso - o número de likes? - será a alavanca para a publicação em livro, afinal de contas o anseio dos autores, por mais que (muitos) anunciem a morte dos livros (em papel).


É o caso de D.A.D. - Desempregado Artista Dona de casa, série de cartoons e histórias curtas sobre as desventuras de um pai solteiro com duas filhas, publicada originalmente na página do Instagram do autor, Alexandre Esgaio, e compilada em livro pela Suma de Letras.

Segundo projecto de humor nacional com esta base no catálogo da editora - depois de Vida de Adulta - D.A.D. apresenta alguns pontos comuns com o livro de Raquel Sem Interesse: um traço rápido, simples, não especialmente atractivo mas funcional q.b.; poucas explicações - na verdade desnecessárias... - para a situação retratada e uma forte ancoragem na realidade - numa certa realidade, pessoal e social. Que é, apesar de tudo, ainda excepção, embora cada vez mais habitual.

Aliás, não deixa de ser curioso que a multiplicação da situação - pais solteiros - em termos de humor ainda tenha de se servir de estereótipos - o homem a assumir 'tarefas de mulher'.

Voltando à análise comparada com Vida de Adulta, acredito que o maior ou menor sucesso destas criações tenha muito a ver com a identificação que o leitor consiga estabelecer com a sua própria realidade - mesmo que não seja pai (ou mão) solteiro(a). Porque, na verdade, o rir de si próprio através de interposta pessoa - e não directamente! - acaba por ter um efeito catártico importante - e até tornar mais leves as cargas quotidianas.

A essas situações típicas de uma determinada condição social, Alexandre Esgaio acrescenta uma série de situações divertidas ou absurdas mais genéricas, potenciando assim o alcance da sua criação numa base mais alargada de leitores.

Da conjugação de todos estes factores, resultará uma maior identificação do (potencial) leitor com D.A.D. , com a certeza que - como sucede com todas as compilações similares - é recomendada a leitura moderada de umas quantas páginas por dia, para evitar a saturação e possibilitar um melhor aproveitamento de cada momento.

...mesmo sabendo, também, que este tipo de livro tende a ser viciante.


D.A.D. - Desempregado Artista Dona de casa
Alexandre Esgaio
Suma de Letras
Portugal, 9 de Março de 2021
170 x 240 mm, 120 p., pb com aplicações de cor, capa mole com badanas
14,40

(imagens disponibilizadas pela Suma de Letras; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)

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