22/05/2020

Giorgio Fratini: "Sonno elefante é uma metáfora sobre a perda da memória de um lugar”




Passou-me por acaso pelas mãos e por isso decidi evocar aqui um livro com mais de uma dezena de anos. Intitula-se “Sonno Elefante – I muri hano orecchie” e o seu autor é o italiano Giorgio Fratini, com a curiosidade de ser uma obra sobre... a PIDE.
Para isso, recupero aqui o texto integral da entrevista que lhe fiz, publicada no Jornal de Notícias de 19 de Fevereiro de 2008, aquando da edição italiana da obra, que seria editada poucos meses depois em português, pela Campo das Letras.

BD sobre a PIDE editada em Itália
Sonno elefante é “uma metáfora sobre a perda da memória de um lugar”, disse ao JN o autor, Giorgio Fratini
Acaba de ser editada em Itália, pela editora BeccoGiallo, uma banda desenhada cuja história “roda à volta de um lugar tristemente famoso de Lisboa, a ex-sede da PIDE, na Rua António Maria Cardoso”, revelou ao JN o seu autor, o italiano Giorgio Fratini.
Nascido a 23 de Novembro de 1976, é “arquitecto, licenciado pela Faculdade de Arquitectura de Florença” e esteve em Portugal “pela primeira vez em 2000, para estudar arquitectura ao abrigo do programa Erasmus”.
A Lisboa, voltou “várias vezes” e dessas estadias nasceu “Sonno Elefante – I muri hano orecchie”, cujo título, diz, “é uma metáfora sobre a perda da memória de um lugar, de um pedaço da história”. Algo como “o sono da memória”, acrescenta Fratini, cujo traço a preto e branco, matizado de cinzentos, em que se destaca o tratamento realista dado aos edifícios, que contrasta com o tom semi-caricatural das personagens, e a agradável e multifacetada composição das páginas, não deixam adivinhar tratar-se da sua primeira obra.
O ponto de partida para a história foi a descoberta de que a antiga sede da PIDE, iria ser “remodelada, dando lugar a um conjunto de apartamentos de luxo e lojas”. Nada de especial, a acreditar nas palavras de uma personagem, logo nas primeiras páginas do livro: “E então? Um dia há uma coisa, depois outra; é normal, não é?”.
A história, resume o autor, está “ambientada poucos anos antes da Revolução dos Cravos e segue os destinos de Zé, Marisa, Leon, Maria e Afonso”, ligados àquele “palácio nefasto, como aconteceu a milhares de cidadãos portugueses comuns”. Entre eles “há quem se oponha, quem traia, quem colabore, quem se anule e quem morra. E um deles, muitos anos depois, volta àquele lugar trazendo consigo o que considera impossível cancelar: a própria história”. E recorda “o terrível passado do edifício, as crueldades que tiveram lugar dentro daquelas paredes, os gritos e lágrimas sufocados naqueles quartos, lutando, à sua maneira, contra a destruição da memória de todas as vidas ali perdidas na luta pela liberdade”, conclui o editor, Federico Zaghis.
Uma história narrada ao longo de pouco mais de uma centena de pranchas, “inspirada parcialmente em factos reais, trabalhados pela minha imaginação”, para a qual Giorgio Fratini, “para além da Internet”, teve que “fazer pesquisas no Arquivo da PIDE, na Torre do Tombo, e no Centro de Documentação 25 Abril da Universidade de Coimbra, bem como no arquivo fotográfico em linha da Câmara Municipal de Lisboa, fundamental para a iconografia dos anos 70” em que decorre boa parte de “Sonno Elefante”, para já sem edição prevista no nosso país, embora “haja alguns contactos com editoras portuguesas”, revela o autor.

As Paredes Têm Ouvidos - Sonno Elefante

Giorgio Fratini

Campo das Letras
Portugal, Abril de 2008
170 x 237 mm, 112 p., pb, capa mole com badanas
ISBN: 9789896252939

(imagens retiradas do blog do autor; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)

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