06/11/2016

Amadora BD 2016: um balanço




Termina hoje o Amadora BD 2016, por isso alinhavo algumas ideias sobre uma edição que considero decepcionante.
A ideia que transparece para quem está de fora, mas tem alguma proximidade do meio da BD nacional e visita o festival regularmente é que se criou na organização uma inércia que progressivamente está a ofuscar e a fazer esquecer aquilo que o festival tinha de melhor: os convidados e as exposições.

Autores? Poucos e pouco interessantes. Em termos pessoais, destaco Altarriba, Kim e Marcello Quintanilha, mas nenhum deles – ou qualquer outro dos que stiveram presentes - é um cabeça de cartaz capaz de só por si atrair (mais) visitantes. E se não são os autores a cativar…
Com todas as condicionantes que se reconhecem a uma organização camarária – mas que o Festival de Beja tem sabido contornar… - porque razão as editoras não são contactadas atempadamente (o que significa “meses de antecedência”) para proporem/convidarem autores que estão a editar? Como, por conta própria, fez este ano a Levoir com Altarriba e Kim. Com tanta variedade editorial, não se consegue encontrar 2, 3, 4 artistas que estejam presentes no festival e tenham exposição patente, para promoverem os livros que estão editados?

Exposições? Uma das imagens de marca do Amadora BD eram as mostras de originais. Este ano fazia impressão a quantidade de impressões (desculpem o trocadilho óbvio) patentes nas paredes. Eu sei que cada vez mais, nos nossos dias, não há originais, mas nalgumas exposições, entre páginas de livros, cópias e impressões, quase não se davam pelos (poucos) originais.
A par disso, as mostras do Amadora BD primavam pela cenografia. Confirmaram-no este ano – muito bem, a diferentes níveis - as consagradas a Anton Kannemeyer, Democracia, Tex/Pasquale Frisenda, Crumbs e aos ilustradores Bernardo Carvalho e Carmen Chica/Manuel Marsol. Embora as duas primeiras, pelas próprias temáticas, justificassem um melhor enquadramento que não existiu.
Juntaria a esta a de André Oliveira/André Caetano, que ilustrava vários passos do processo criativo da dupla, não estivesse tão mal localizada, escondida à vista de todos em local de passagem, tal como as de Nunsky e Jorge Coelho. Ou a de Marco Mendes, logo a abrir. Estes autores mereciam mais (respeito).
A exposição central, a um tempo pretensiosa e desafiadora, revelou-se um logro. Parcialmente encerrada no primeiro fim-de-semana – começa a tornar-se um (mau) hábito do Amadora BD - partia de pressupostos que podiam ser interessantes, a obra de Hergé, Moebius e Pratt, e a relação da BD com a música e o cinema, mas perdia-se depois no excesso de livros abertos (alguns deles repetidos lado a lado!), na falta de originais e de originais realmente ligados à temática que se pretendia ilustrar. Alguns pareciam estar lá porque não se tinham arranjado outros e Pratt, no final, pareceu pretexto para os comissários exporem os próprios desenhos (de Veneza)…!
Legendas em falta, trocadas ou erradas eram muitas, nalguns casos desvirtuando até a concepção dos comissários.
Muito penalizadora também foi a mostra dedicada ao Ado Editorial, que se limitou a espalhar por uma vasta área as edições lançadas entre a anterior edição do festival e esta, que dava a impressão de servir apenas para ocupar espaço vazio. Da forma dispersa como foi apresentada, perde-se qualquer pretensão de mostrar, comparar e explicar as tendências editoriais.

Divulgação? Desde sempre (um) calcanhar de Aquiles do festival, este ano começou por ser inexistente, omissa ou tardia, obrigando a esforços e jogo de cintura quem queria tão só divulgar o evento. A divulgação não pode ficar atida apenas ao site da câmara ou à página de Facebook do evento, locais onde também foi limitada e parcial.

Em contrapartida a Feira do Livro estava bem localizada, aberta e convidativa, embora falte muitas vezes a informação que o autor X que está a autografar tem obras à venda no stand Y. A escolha atempada de autores com obra editada, permitiria reduzir a quantidade de desenhos feitos em folhas brancas e contribuiria para promover realmente a edição de BD, a sua compra e a sua posterior leitura.

Uma nota final para os Prémios Nacionais de BD, cujas (estranhas) escolhas de um júri que se revela demasiado pequeno, parecem obedecer mais às necessidades das exposições da edição seguinte, do que propriamente à qualidade intrínseca das obras…

(fotos cedidas pela organização; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)

8 comentários:

  1. António Carvalho7/11/16 21:50

    Pedro.
    apenas um acrescento ao seu acertado comentário. Sendo visitante desde à largos anos do evento é com tristeza que verifico o declínio do mesmo em termos de relevância e interesse. Sendo (ainda) o principal evento do género em Portugal pouco se compreende o desinteresse e a vil rotinice oficial a que foi votado - o festival merecia melhor. Estará na altura de ressuscitara o Salão de BD e Ilustração de Lisboa ou outro?...

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    1. Tendo estado ligado ao Salão de BD do Porto e colaborado com o de Lisboa, acho que há um tempo próprio para este tipo de eventos e que ressuscitá-los é muito difícil. Tem que no mesmo momento haver vontade política e gente disponível e com capacidade para levar a cabo as iniciativas...
      Boas leituras!

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  2. Ontem estive a ver um filme interessante; O Making Of do livro Portugal do Cyril Pedrosa. Já no próprio livro tinha achado interessante que o ponto de partida para a criação do livro tenha sido o convite ao Cyril por parte de um festival de BD (já extinto). Festival de BD da Sobreda (quem é da margem sul, zona de Almada, saberá onde é a Sobreda. Para os outros....

    https://www.youtube.com/watch?v=KzavAGsjHr8

    Creio que será mais importante fazer-se algo com coração do que com dinheiro.

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    1. pco69,
      Só coração não chega. O dinheiro - e/ou a vontade política também são fundamentais. Hoje, o público já não compactua com fotocópias nas paredes ou má organização - veja-se o caso do Amadora BD...
      Boas leituras!

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  3. Creio que tenho mais um comentário que foi para o spam?

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  4. Foi, mas já voltou!
    Boas leituras!

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  5. Era interessante saber o orçamento deste ano. :)

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    1. Hugo,
      Infelizmente acho que não é uma questão de orçamento...
      Boas leituras!

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