Ainda a pretexto dos 40
anos de Alack Sinner, recupero aqui o texto “O regresso de Alack Sinner”,
que publiquei originalmente no Jornal de Notícias de 15 de Fevereiro de 2000.
Alack Sinner, personagem emblemática criado pelos argentinos
José Muñoz e Carlos Sampayo, está de regresso.
Ele é um ex-polícia, que abandonou a profissão após a
violação da irmã, desiludido com a investigação que se seguiu, que mostrou uma
corporação mais preocupada consigo e com proveitos ilegais do que com a lei.
Decidiu então tornar-se detective privado, dando origem a
uma mão-cheia de histórias na linha dos grandes clássicos policiais, como
Chandler ou Hammett.
Uma mudança de vida que se seguiu a uma mudança de atitude,
pois Muñoz e Sampayo rapidamente mostraram que os seus interesses iam mais além
dos policiais e das referências ao cinema negro americano.
“A nossa personagem é uma parte das nossas emoções, do nosso
olhar à nossa volta”, dirão, e, por isso, Sinner tornou-se numa consciência
crítica do sistema, do racismo, da injustiça, interessado em combater o que via
de errado no mundo, à sua maneira, quase sempre sozinho, numa cruzada
impossível, em que perdeu mais vezes do que ganhou.
Histoires Privées,
que tem por base o preto e branco do traço agressivo e cada vez ais estilizado
de Muñoz, começa quando Sinner recebe uma chamada para socorrer a filha,
Cheryl, acusada de um assassínio que não nega nem confirma.
A investigação leva-o a conhecer um haitiano, ligado a
negócios escuros, que sabe mais do que o que diz. Resolvido o caso, descobre
que a sua irmã foi sequestrada por um desenhador desequilibrado, numa trama que
se vai complicando e desdobrando em novos enigmas, que o fazem correr de local
para local.
É um Sinner que continua inadaptado à sociedade (e de certa
forma à vida), incapaz de conviver com os seus sentimentos, que continua a
querer mudar o sistema e denunciar o que acha errado, mas a vontade (e a
capacidade) de reagir são cada vez menores.
É cada vez mais só um peão (e um peão só), perdido no meio de
gente sórdida e egoísta. Como há tanta no mundo.
E se é o mesmo Sinner que (re)encontramos agora, a idade
deixou marcas que não se podem esconder: usa óculos, o vigor não é o de outros
tempos, está envelhecido e sabe-o.
Na cama, com Sophie, uma das suas ex-mulheres, é ele quem
pensa que ela procura um homem que já não existe…
Alack Sinner: Histoires privées
Carlos Sampayo (argumento)
José Muñoz (desenho)
Casterman
França, Janeiro de 2000
220 x 295 mm, 80 p., pb, brochado
Adorava que a Levoir tivesse escolhido este para editar, em vez do Billie Holliday.
ResponderEliminarAnti-Herói,
EliminarTambém prefiro Alack Sinner, sem dúvida, mas a lógica do Billie Holiday - que marca a estreia - para continuar? - da Levoir na edição de BD fora de colecções, o que me parece importante, é assinalar uma data redonda e ter dessa forma um destaque extra para a edição.
Boas leituras!