23/01/2023

Ricardo Venâncio: “Adoro futebol e BD em níveis muito semelhantes”



Uma chama imensa, trabalho de Ricardo Venâncio, editado pela Dupuis no mercado francófono e por A Seita em Portugal, foi uma das surpresas editoriais do ano passado, pela sua temática e pela ligação à marca “Benfica”.
Isso originou uma entrevista ao autor, que esteve na base do texto publicado na edição do Jornal de Notícias de 1 de Janeiro de 2023, e cuja versão integral podem ler já a seguir.


As Leituras do Pedro - Como entraste neste projecto dedicado à história de diversos clubes europeus?

Ricardo Venâncio - A minha entrada no projecto Sport Collection deu-se graças a um desafio feito pelo Paulo Monteiro, director do Festival de BD de Beja, e também um autor de BD, que serviu de ponte entre a editora belga, Éditions Dupuis, e autores portugueses. Em 2019, o Paulo contactou vários autores nacionais para ver quem estaria interessado em concorrer a este projecto que visava ligar dois públicos que normalmente não se cruzam, o da BD e do futebol, em vários países da Europa. Eu candidatei-me, e fui um dos convidados a ter uma reunião com Denis Lapiére, o coordenador do Sport Collection, na edição desse ano do Festival de Beja. Nessa reunião, o Denis pediu-nos propostas de histórias, e de todas, as minhas foram escolhidas.


As Leituras do Pedro - Ao aceitá-lo estavas a pensar numa porta no mercado francófono que se poderia abrir para outras propostas?

Ricardo Venâncio - Para ser sincero, não foi a minha prioridade. Eu adoro futebol e BD em níveis muito semelhantes, e a ideia de fazer um livro sobre futebol, que pudesse agradar ao mesmo tempo a quem não é particularmente fã do desporto, pareceu-me um desafio interessante, ainda mais, podendo controlar o processo todo, da escrita à arte. Não vou mentir e dizer que não pensei no alcance que um projecto internacional pode ter, mas eu foquei-me mais no que eu podia explorar dentro das especificidades do projecto. Se o resultado abrir portas para outros projectos, é um bónus muito bem-vindo.


As Leituras do Pedro - Que liberdade tiveste para criar o álbum? Havia linhas orientadoras rígidas a seguir?

Ricardo Venâncio - À parte duas ou três linhas orientadoras, a liberdade foi total. Nesse aspecto, o trabalho foi bastante pacífico. Na reunião em Beja, o Denis pediu-nos propostas para três histórias relacionadas com o Benfica, e o que me surpreendeu foi o facto de ele não pedir ideias estritamente relacionadas com a história do clube, havia uma liberdade quase total nos temas, desde que o clube estivesse representado de alguma forma, nomeadamente, na aparição de jogadores e imagética do clube. Posso dizer que o livro final não foge muito da primeira ideia que saiu quase fechada na viagem de regresso de Beja.


As Leituras do Pedro - Ser o Benfica teve algum peso na tua decisão de aceitar o projecto?

Ricardo Venâncio - De certa forma, sim. Desde logo, pelo alcance da marca “Benfica”, que é um nome reconhecido mundialmente. Depois, porque há alguns valores ligados ao clube que se encaixaram bem na história que eu quis escrever. Valores como o legado familiar, o peso da história do clube para quem enverga a camisola, e a aposta na formação. Quem estiver mais atento, vai reparar que a história se passa algures em 2019, numa altura em que a formação do Benfica estava no topo mundial, e era um elemento estrutural do clube, como parece ter voltado a ser entretanto.


As Leituras do Pedro - Inspiraste-te em jogadores reais para criares as personagens do livro? Quais?

Ricardo Venâncio - Em jogadores específicos, não. Alguns são quase arquétipos de jogadores de formação, outros apareceram consoante as necessidades da história, outros são inspirados em pessoas que conheço.


As Leituras do Pedro - Quais as maiores dificuldades que enfrentaste?

Ricardo Venâncio - As maiores dificuldades que tive no processo de trabalho foram relacionadas com a história, principalmente na organização e edição das várias ideias que tinha para a narrativa. Havia muita coisa que queria incluir, alguma que acabou por não ficar no argumento final, e não foi fácil integrar tudo de maneira harmoniosa. Além disso, a pandemia, e tudo o que aconteceu durante estes últimos anos, atrapalhou um pouco todo o trabalho, obviamente.


As Leituras do Pedro - Como surgiu a oportunidade da edição portuguesa?

Ricardo Venâncio - A edição portuguesa sempre foi uma prerrogativa da Dupuis para o projecto. Não fazia muito sentido fazer um livro sobre o clube de um país e não fazê-lo chegar ao público principal, que é precisamente a massa de adeptos desse clube, por isso, essa situação estava contemplada. A única dúvida, à partida, seria qual seria a editora escolhida a publicar por cá. A minha preferência sempre foi a editora com quem trabalho, A Seita, e assim aconteceu. Estou muito contente com a edição portuguesa.


As Leituras do Pedro - Que semelhanças e diferenças há entre obras pessoais (Hanuram, o dourado), institucionais (Agá 2.0) e este Uma chama imensa?

Ricardo Venâncio - Em todos eles, há sempre algo pessoal. Obviamente, num universo como o do Hanuram, tenho total liberdade para criar o que me apetece, mas nunca trabalho em nada, especialmente BD, sem colocar algo de mim no resultado final. A grande diferenças entre projectos pessoais e as encomendas são as condicionantes das encomendas em si, tamanho, orçamento, uma história previamente estabelecida, como no caso do Agá 2.0, etc.


As Leituras do Pedro - Qual deles representa melhor o verdadeiro Ricardo Venâncio?

Ricardo Venâncio - É difícil dizer. Eu sou um pouco camaleónico, de vez em quando, gosto do desafio de trabalhar coisas diferentes, e como já referi, integro sempre algo pessoal nas histórias que escrevo, mas, em termos de realização pessoal, sem dúvida o Hanuram. É o projecto que mais mexe com todas as minhas influências e onde mais me dou permissão para me divertir a trabalhar.


As Leituras do Pedro - Qual o projecto que se segue?

Ricardo Venâncio - Voltar ao Hanuram, e encontrar maneira de trazer mais alguma coisa desse universo cá para fora, de maneira consistente. Projectos pessoais são sempre complicados de trabalhar, porque toda a responsabilidade da produção cai sobre os nossos ombros, especialmente quando se toca todos os instrumentos, como eu, e o retorno demora ou nunca chega a aparecer. Mas, se se conseguir integrar esse trabalho com outras maneiras de ganhar a vida, é sempre possível ir avançando mais um pouco.


(imagens disponibilizadas pela editora A Seita; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão; clicar no texto a cor diferente para saber mais sobre os temas destacados)

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