Elliot Caplin (argumento)
John Cullen Murphy (desenho)
Classic Comics Press (EUA, Agosto de 2010)
280 x 215 mm, 250 p., pb, brochado
Resumo
Assinalando os 60 anos da criação de Big Ben Bolt, este álbum compila as primeiras 708 tiras diárias do pugilista, correspondentes a pouco mais de dois anos de publicação.
Nele vamos conhecer o jovem Bolt que nasceu “num país cujo nome não é importante – basta dizer que não são os Estados Unidos da América. Num país de onde gostaria de escapar qualquer homem com um forte amor pela democracia e pelas suas instituições livres”, como se lê logo na primeira vinheta!
Depois, aos poucos, conhece-remos também Spider Haines, antigo pugilista e futuro manager de Bolt; Charity, a mulher por quem se vai apaixonar; os seus tios que o acolherão na América com que ele tanto sonha… E os diversos adversários que vai enfrentar – dentro e fora do ringue.
Desenvolvimento
Conheci Big Ben Bolt – na altura ainda era o “campeão português” Luís Euripo e Spider Haines dava pelo nome de Zé Gomes (!) – nas páginas do Mundo de Aventuras, mas confesso que então esta não era uma série que me enchesse as medidas.
(Re)descobri-la agora, na (longa) (re)leitura sistemática das tiras diárias publicadas ao longo de dois anos foi para mim uma agradável surpresa.
Por um lado, porque sendo o boxe o meio no qual Ben Bolt se move, as histórias vão muito para além dos simples combates em si. De uma maneira geral – a excepção é o entreacto (inacabado, pois o seu final é algo inconclusivo?) no qual Bolt conhece Eve e o seu protector - são histórias bem escritas, construídas e desenvolvidas. Os seus intervenientes são bem humanos, com os seus defeitos e qualidades, raramente correspondendo aos habituais estereótipos de “bons” ou “maus”. O próprio herói tem dúvidas, erra por vezes, hesita nas decisões s tomar. A par do boxe, Bolt tem que “enfrentar” os seus amigos, os seus sentimentos, aqueles com quem se cruza e que de uma forma ou de outra se querem aproveitar dele, seja um manager que quer controlar a sua carreira, uma corista em busca de publicidade, um gansgter em busca de vingança ou uma mulher mimada. Tanto é assim, que os diversos episódios apresentados – alguns deles bem à margem dos combates – não têm repetições nem grandes pontos em comum. Cada história é uma nova história que serve para Bolt, Spider e Charity estreitarem os seus laços e crescerem enquanto personagens credíveis e humanas.
Por outro lado, se são vários os combates mostrados neste primeiro tomo, não há dois que decorram da mesma forma, nem dois que terminem da mesma maneira. É verdade que Bolt vence (quase) todos, mas a forma como o consegue, as motivações que o movem e o levam à vitória são diversos, como diversas são as reacções dos derrotados. Por isso, também, este é um belo retrato do mundo do boxe nos EUA na década de cinquenta do século passado, com todas as suas virtudes e os seus podres. E também um belo retrato de uma época e de um tempo que hoje nos parece estranho em muitos aspectos.
Finalmente, se nunca fui adepto do boxe e me custa a compreender como é considerado um desporto, confesso que vibrei com alguns dos combates, tanto pela forma como estão (d)escritos, quer (especialmente) pela forma como Cullen Murphy os encena com uma plasticidade, uma beleza e uma elegância assinaláveis, transformando-os em algo que é ao mesmo tempo duro e violento, mas também suave e delicado, agradável de ver na graciosidade dos dois combatentes, conseguindo fazer com que cada combate durasse semanas (ou aqui páginas) sem que isso canse ou desmotive o leitor.
A reter
- Mais um “integral” para a minha biblioteca, hoje em dia, sem dúvida, a melhor forma de (re)ler os grandes clássicos da BD. Sejam eles franco-belga ou norte-americanos. Ou de outra qualquer nacionalidade, como demonstrarei em breve aqui.
- A qualidade literária das histórias.
- O magnífico traço de John Cullen Murphy, em especial na composição dos combates de boxe.
- O bom preço de $24,95, que garante várias horas de (muito) boa leitura.
Menos conseguido
- Eu sei que nem todos são como Manuel Caldas e se dedicam de alma e coração à restauração dos originais e que por vezes é difícil encontrar originais/prints/cópias de qualidade para reproduzir, mas a qualidade da impressão das tiras até 30 de Dezembro de 1950 (ou seja até à página 101 da corrente edição) é bastante fraca. Depois – milagre! – volta-se a página e o traço fino e detalhado de Murphy surge em todo o seu esplendor em praticamente todas as restantes páginas da edição.
- A falta de uma capa cartonada que valorizaria muito a edição. Mas que faria o seu preço subir dos actuais $24,95 para valores menos interessantes…
- A existência de 7 (sete) páginas em branco no final do volume que, no mínimo poderiam ter servido para publicitar melhor o próximo tomo ou as outras edições similares da Classic Comics Press: Mary Perkins on Stag e The Heart of Juliet Jones.
Curiosidades
- Eliot Caplin, o argumentista, seria também co-criador de The Heart of Juliet Jones e do Dr. Kildare, duas séries que fizeram sucesso nos jornais portugueses, respectivamente em O Primeiro de Janeiro e no Jornal de Notícias.
- John Cullen Murphy desenhou Big Ben Bolt até 1977, deixando-o para substituir Harold Foster em Prince Valiant.
- As próximas edições previstas pela Classic Comics Press são as compilação das tiras diárias de Rusty Riley, de Frank Godwin, e de outro herói que fez as delícias dos leitores portugueses, o cowboy romântico Cisco Kid, do argentino José Luís Salinas. Os respectivos volumes iniciais, correspondentes aproximadamente aos dois primeiros anos de cada série, estão previstos para o final de 2010 e a Primavera de 2011.