Gradiva (Portugal, Julho de 2006)
225 x 225 mm, 48 p., pb, brochado, 9,00 €
Como se escrevia há sensivelmente uma década na revista "Quadrado" #2 (2ª série), quando os Simpsons foram as vedetas do Salão Internacional de Banda Desenhada do Porto, "para muitos, o nome de Matt Groening é apenas o terceiro a aparecer na ficha técnica da série de animação "The Simpsons", juntamente com Sam Simon e com o conhecido James L. Brooks".
Mas na realidade, se este norte-americano, nascido a 15 de Fevereiro de 1954, em Portland, no Oregon, se iria tornar mundialmente célebre com aquela série animada televisiva, a verdade é que o seu humor corrosivo e sem tabus já se tinha mostrado em "Life in Hell", um cartoon que ele criou em 1977 em páginas fotocopiadas e que começou a vender para jornais em 1980, graças à notoriedade que alcançou, apesar de se mover na cena alternativa.
Foi a partir dele, aliás, que os Simpsons nasceram, diz a anedota, no quarto de hora que Groening esperou para ser recebido na Fox, original-mente com o objectivo de transformar em desenhos animados os protagonistas de "Life in Hell". Mas com medo de perder os direitos sobre as suas criações, Matt Groening remodelou-os graficamente, transformando-os naquela que é hoje, possivelmente, a mais conhecida família da TV.
Inspirado na sua experiência de vida em Los Angeles, cidade que o autor detestava, "Life in Hell" chega agora [em Julho de 2006] às livrarias portuguesas, através do seu primeiro volume - "O amor é um inferno" - no qual Matt Groening, utiliza quer cartoons, (muito) verborreicos ou completamente mudos, quer bandas desenhadas (que podem chegar às 16 vinhetas), igualmente com ou sem texto.
Através deles vai dissecando especial-mente o amor e a vida amorosa, sempre numa perspec-tiva de nos demons-trar que qualquer que seja o caminho para lá chegar, qualquer que seja o momento de lá chegar, qualquer que seja o tempo que lá se esteja, o amor - e todo o tipo de relações a ele associadas - conduz sempre, inexoravelmente, a uma vida de frustrações que se revela um autêntico inferno, do qual não há salvação possível.
Com o evoluir da série, Matt Groening vai-se soltando - quer gráfica, quer tematicamente - utilizando Sheba ou Binky, o casal de coelhos antropomórficos que protagoniza quase todo o livro, a que se juntam, por vezes, entre outros, Bongo, o filho ilegítimo de Binky, ou o próprio Groening, como um coelho com barba, para explorar diversos outros aspectos da vida dos comuns mortais: o sexo, o trabalho, as férias, as crianças, os (malditos) críticos ou a inevitabilidade da morte. Ou seja, tudo aquilo que contribui sobremaneira para infernizar a vida.
O humor desenvolvido em "The Simpsons" está já aqui, são estas as suas origens, embora talvez um pouco mais cru, menos refinado, mas já iconoclasta e irreverente, não convidando ao riso desbocado, mas obrigando a sorrir, mesmo quando o riso pode ser incómodo, por tocar nos nossos pontos sensíveis, quando nos reconhecemos na pele de Sheba ou Binky.
Graficamente, o traço de Matt Groening é rápido, simples e pouco pormenorizado - fundamentalmente ao serviço das ideias que pretende expor - mas especialmente expressivo, e os protagonistas lembram bastante os "futuros" Simpsons, nomeadamente pelos olhos arregalados e salientes e o seu aspecto "feio", quase se podendo escrever que lhes falta apenas a cor amarela para serem seus parentes afastados.(texto publicado originalmente no Jornal de Notícias de 27 de Agosto de 2006)