Encerradas as portas, com alguns dias de permeio para deixar
as ideias assentar, segue-se o meu balanço à Comic Con Portugal 2015.
A primeira constatação passa pela implementação do modelo e
pelo seu sucesso evidente: a edição deste ano cresceu em área – de 35 mil para
45 mil metros quadrados, de 3 para 4 pavilhões -, em expositores – que foram
mais do dobro, na área geral e na zona de gaming -, em número de convidados –
já lá vou… - e- fundamental – em número de visitantes – que arrasaram os 32.500
de 2014, pois este ano foram contabilizados mais de 53 mil!
Claro que nem tudo são boas notícias e nem tudo correu bem.
Começando pelos convidados, o principal chamariz, há a
considerar duas áreas. Na de cinema e TV, o cartaz foi sem dúvida inferior ao
do ano transacto, apesar de ter sido alargado. Quanto ao cartaz de BD, manteve em
número e qualidade, o nível de 2014. E, na verdade, será preciso recuar muitos
anos para encontrar em Portugal um evento de BD com um cartaz com o peso do da
Comic Con 2015, onde se destacavam Brian Azarello, Eduardo Risso, Juan Dias
Canales, Rúben Pellejero, Miguelanxo Prado e Carlos Pacheco. É verdade que estes
dois últimos repetiam as presenças de 2014 mas nunca vi as suas filas de
autógrafos vazias, bem longe disso.
Ambas as áreas, no entanto, sofreram de um problema
inevitável (?) neste tipo de eventos: os cancelamentos de última hora –
agravados este ano pelos recentes atentados terroristas e pelo clima de
insegurança vivido na Europa? – que impossibilitaram a presença de Jason Mamoa,
o presumível cabeça de cartaz da Comic Con, de actores da série Teen Wolf (que
mesmo assim foi possível substituir à última da hora), de elementos de vários
painéis que não chegaram a ser anunciados e dos autores Yves Sente e Iouri
Jigounov (cuja não presença nunca foi noticiada pela organização).
Nesta área ainda uma referência para as presenças de Antonio
Altarriba e Miguel Rocha, a convite da Levoir – que a organização
inexplicavelmente ignorou em termos de site e Facebook – e do dinamarquês Peter
Snejberg, a convite da G. Floy Studio. Apostas de editoras - que também apresentaram stands que se distinguiam - na Comic Con, que
mostram uma forma diferente de estar na BD e a importância que o certame (já)
granjeou. O que, no que à literatura diz
respeito, também está espelhado na presença do escritor David Durham, a convite
da Saída de Emergência.
Apesar disso – e citando o caso da BD – seria bom que em
futuras edições os nomes pudessem ser melhor adequados à realidade (editorial)
portuguesa.
As grandes áreas propostas – stands de vendas, áreas de
cinema/TV e de gaming – estiveram sempre com bastante público, em especial no
sábado em que mais uma vez a adesão do público foi impressionante. E mostrou
que, apesar dos progressos feitos, nem tudo foi devidamente acautelado. De
manhã, entrar na Exponor chegou a demorar mais de duas horas, a (muito maior)
zona de alimentação não chegou nem de perto nem de longe para as solicitações
(no sábado) e uma única caixa multibanco em toda a Exponor revelou-se –
obviamente – muito curto (apesar de ter sido recarregado a meio da tarde),
sendo constantes as longas filas para lhe acederem. Esta foi, aliás, uma queixa
recorrente por parte de muitos expositores – e em especial dos artistas
presentes na Artists’ Halley - que viram inviabilizadas muitas vendas pela
dificuldade de levantar dinheiro.
Os problemas de rede de telemóveis e de sinal de wi-fi foram
também imensos e precisam de ser resolvidos para 2016.
Um dos aspectos mais positivos do evento é a cada vez maior
adesão ao cosplay por parte dos visitantes – alguns dos fatos são ‘melhores que
os originais’! -, que contribuem com uma nota de cor e alegria e ajudam à
criação do espírito festivo pretendido.
Nesta análise global termino com uma referência para o
incentivo da Comic Con à indústria nacional, iniciado com a criação dos
Galardões BD que, independentemente das críticas que possam ser apontadas ao
nome, ao regulamento e à orgânica, é o primeiro prémio nacional que distingue
com um prémio monetário efectivo e significativo a melhor obra do ano. A
organização tem a intenção, em edições futuras, de criar iniciativas
semelhantes noutras áreas.
Chegado aqui, quero acentuar uma questão. Vivi quase toda a (minha)
Comic Con na zona dedicada à banda desenhada, por isso, não tenho indicadores
de como correram as coisas nas restantes áreas, por isso, daqui para a frente a
análise incidirá apenas nela, mesmo sabendo que – apesar de ter estado na
génese das Comic Con – é hoje uma área menor e menos significativa.
No que respeita à BD houve mudanças sensíveis. Se foi boa a
intenção de juntar zona de autógrafos, auditórios e stands de vendas de livros,
na prática não resultou.
Nos auditórios, devido ao ruído ambiente, era extremamente
difícil, se não impossível, ouvir as conversas – algumas delas bem
interessantes. Por este motivo ou por outras razões, a verdade é que este ano a
maioria dos painéis tiveram pouca assistência., ao contrário de 2014 em que
muitas dezenas ou algumas centenas estiveram presentes nos painéis de BD no bem
mais apropriado e confortável Auditório B.
Também as filas para as sessões de autógrafos não atingiram
a dimensão das de 2014. Para isto poderá ter contribuído o facto de esta zona
estar ‘escondida’ num canto, ter havido uma divulgação menos eficaz da sua
realização e de o folheto destinado ao efeito ser ridiculamente ilegível – para
quem não soubesse antecipadamente do que se tratava, o anúncio de uma sessão de
autógrafos com “Ruban & Diaz & Brian & Risso & Peter” (sic) diz
muito pouco…
Um sistema de som eficaz onde sejam anunciados painéis,
sessões de autógrafos, exibição de filmes, etc., deve ser uma das melhorias
para 2016.
Em termos de vendas, se a maior parte dos livreiros com quem
falei estavam satisfeitos, as previsões - inflacionadas pelos bons resultados
do ano anterior… - de uma forma geral não foram atingidas, podendo para isso, a
par da má localização dos stands de BD, ter também contribuído a maior oferta
global registada este ano. E se todos – praticamente? – pensam voltar, ficou
evidente que o público da Comic Con é, por exemplo, claramente diferente do do
AmadoraBD, por isso super-heróis e manga vendem melhor que romance gráfico, obras
nacionais ou séries europeias, podendo fazer alguma diferença a presença de
autores – desde que devidamente anunciada. E, evidentemente, jogos e merchandising
vendem mais do que livros… Cada um terá de fazer as suas contas e ajustar a sua
oferta à especificidade do evento, sendo patente que alguns não se identificam
claramente com o público.
Muito positiva, em meu entender, foi a edição de alguns
títulos especialmente para a Comic Con. Batman Noir, de Brian Azarello e Eduardo
Risso, da Levoir – com os exemplares disponíveis esgotados ao início da tarde
de sábado! – é o exemplo mais relevante mas há que referir igualmente Wolverine: Logan, de Vaughan e Risso,
Southern Bastards #1 (ambos da G.
Floy Studio), Psicopatos 2 (Arcádia), de Miguel
Montenegro, e Free Lance, de Diogo Carvalho.
Quanto ao Artists’ Alley, teve este ano mais autores
presentes e esteve melhor situado, embora boa parte dos seus integrantes tenham
manifestado a vontade de estarem mais próximos da zona dos expositores.
Em resumo, se foi revelada aprendizagem da primeira para a segunda
edição, a dimensão atingida e o crescimento registado implica uma maior
profissionalização do evento, quer na sua componente organizativa, quer do
pessoal no terreno durante os três dias, onde apesar da boa vontade se registou
muito desconhecimento., para que ‘o maior evento de cultura pop português’
possa ser, plenamente e em todas as suas dimensões, a grande festa que
organização, expositores e visitantes desejam e que em muitos aspectos já é.
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