Nos últimos meses têm-se multiplicado os livros de banda
desenhada lançados pelos próprios autores ou por pequenos selos editoriais,
enquanto se dão pequenos passos na edição online. São formas de os quadradinhos
nacionais contornarem a crise e os seus efeitos.
Face a um mercado em recessão e aos altos custos que a
distribuição acarreta, são cada vez mais os autores que optam por editarem os
seus próprios livros aos quadradinhos ou por o fazerem online ou em projectos
editoriais associativos ou de pequena dimensão. O que traz a vantagem acrescida
de terem total controle, em termos criativos e de qualidade do produto final,
algo que nem sempre acontece nas editoras tradicionais.
Inimaginável há poucos anos, isto só se tornou possível
graças às facilidades que as novas tecnologias trouxeram para a edição,
permitindo livros de boa qualidade com preços reduzidos e baixas tiragens.
Por isso, muitos dos livros de BD nacionais recentes não
passam das duas ou três centenas de exemplares, que são divulgados de
boca-em-boca ou nos sites e blogs dedicados aos quadradinhos e vendidos de mão
em mão, nas lojas especializadas ou em eventos dedicados à BD, como os
festivais de Beja ou da Amadora, que se revelam épocas por excelência para o
aparecimento deste tipo de edições.
“Biogra Fria – O pequeno outro” é apenas um dos exemplos.
Obra de tom autobiográfico, balizada pelos carros e namoradas que o autor teve,
é um lançamento de Topedro, que conta já vários títulos no seu “catálogo”
auto-editado.
O mesmo caminho seguiu o cartoonista Mário José Teixeira,
que se estreou com “’Tamos tramados”, posfaciado por Manuel Freire, que recolhe
cartoons de crítica social.
A um outro nível, registam-se os “Cadernos” de José
Abrantes, um autor com mais de duas dezenas de álbuns infanto-juvenis publicados,
que optou igualmente pela auto-edição para divulgar histórias dispersas por
diversas publicações bem como trabalhos inéditos.
Quanto a “Crónicas de Arquitectura”, de Pedro Burgos, uma recolha
de crónicas desenhadas pré-publicadas no jornal da Ordem dos Arquitectos, é o
segundo lançamento da Associação Turbina após “Diário Rasgado”, uma compilação
de obras originalmente publicadas online por Marco Mendes.
O recurso a pequenos editores, dispensa investimento
financeiro por parte dos criadores e, nalguns casos, assegura uma distribuição
mais diversificada. O principal exemplo é a Polvo, com quinze anos de vida e
quase uma centena de títulos de BD em catálogo, a maioria de autores
portugueses, cujos lançamentos mais recentes foram “Han Solo”, relato intimista
e autobiográfico de Rui Lacas, e “Há Piores 2”, com o humor mordaz de Geral e
Derradé.
A Chili Com Carne, com um trajecto já longo na área da BD
alternativa e de autor, acaba de apresentar “Kassumai”, um diário de viagem de
David Campos, que ilustra os seis meses que passou na Guiné-Bissau, num
projecto de uma O.N.G. de apoio à população local.
Quanto à Kingpin Books, tem-se destacado pelo cuidado
editorial com que cada edição é tratada, sendo “O Baile”, uma história de
zombies sob o signo da PIDE, no período da ditadura salazarista, de Nuno Duarte
e Joana Afonso, o livro mais recente.
A edição online, tem vindo a ganhar espaço. O segundo número
do “Minizine”, disponível gratuitamente é um dos casos mais recentes, combinando relatos introspectivos, de acção e de
ficção-científica.
Com cerca de quatro anos de vida, o projecto Zona,
que aposta na divulgação dos novos valores da BD nacional, tem-se destacado
pela sua dinâmica pois já leva editadas uma dezena de antologias aos
quadradinhos.
Com títulos reveladores dos conteúdos – “Zona Negra”, “Zona
Fantástica”, “Zona Gráfica”, “Zona Monstra” ou “Zona Nippon” - para editar o
“Zona Desenha” optou por recorrer ao crownfunding – algo que pode ser traduzido
como “financiamento público” (mas não institucional!) – um sistema em
crescimento que funciona como uma espécie de assinatura prévia.
O valor recebido, dependendo da dimensão do projecto, serve
para financiar a edição, distribuição e/ou o trabalho dos autores. Os
financiadores, em função do dinheiro investido (que obedece a uma tabela
prévia) recebem apenas a edição ou extras como outros livros, desenhos
autografados ou mesmo originais.
Em preparação, abertos a colaboração, estão o “Zona Nippon”
#2 e o “Zona Gráfica” #3.
São formas diversas de os autores nacionais darem largas à
criação e de conseguirem que as suas obras cheguem aos potenciais leitores que,
perante este panorama, são obrigados a uma postura mais interactiva para encontrarem
as obras que pretendem ler.