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03/05/2022

Co.Br.A. Operação Goa

Viagem ao tempo da ditadura



1510. Uma expedição portuguesa comandada por Afonso de Albuquerque, conquista Goa, o mais importante porto comercial da região.
1961. 40 mil soldados indianos invadem Goa, recuperando o pequeno estado para a União Indiana. O punhado de soldados portugueses presentes no local pouca resistência opôs, contrariando as ordens expressas de Salazar. Portugal só reconheceu a perda do território após o 25 de Abril de 1974.
Poucas vezes explorada pela BD nacional, a guerra colonial nos diferentes territórios é, no entanto, matéria-prima muito rica para abordagens distintas de um período com o qual o país ainda parece ter dificuldade em lidar.

01/06/2011

Guerra Colonial

Na Banda Desenhada Portuguesa

Apesar da História pátria ter sido sempre uma temática importante na banda desenhada portuguesa, a guerra colonial (tal como o período revolucionário que se seguiu ao 25 de Abril), embora tematicamente muito rica, a vários níveis, teve uma passagem mais ou menos discreta pelos quadradinhos nacionais, reflexo sem dúvida da forma complicada como a própria sociedade lidou com o tema.
Na maior parte dos casos, as referências à guerra colonial - as suas origens, as suas consequências – limitam-se a apontamentos mais ou menos breve nas abordagens históricas à época contemporânea.
É o que acontece, com algumas nuances, na “História de Portugal em B.D.” (ASA, 1989), de José Garcês e Carmo Reis, “25 de Abril – O renascer da Esperança” (SporPress, 1999), de Manuel de Sousa e Ernesto Neves, “A Revolução desenhada” (Afrontamento, 2000), de José Carlos Fernandes, João Miguel Lameiras e João Ramalho Santos, “Memória” (Má Criação, 2004), de Cristina Sampaio e Rui Cardoso Martins ou “Salazar – Agora, na hora da sua morte” (Parceria A.M. Pereira, 2006), de Miguel Rocha e João Paulo Cotrim. Ou ainda, num registo satírico, em “O País dos Cágados” (edição de autor, 1989), de Artur Correia e António Gomes de Almeida.
O (quase) endeusamento das figuras nacionais, que caracteriza muita da BD histórica nacional, está presente nas obras anteriores ao 25 de Abril, como acontece com “O Ericeira”, a biografia de um soldado com várias comissões em África onde acaba por morrer vítima de uma explosão, da autoria de Baptista Mendes, publicada (sem surpresa) na Revista da Armada, em 1972.
Casos reais, mas de sentido oposto, bem mais humanos e pacifistas, estiveram também na origem de “7 72” (Azul BD3 #2, Jogo de Imagens, 1994), de Diniz Conefrey, que conta a morte de “um soldado que nunca disparou um tiro e ia a cantar”, e de “Angola 1971” (Visão #7, Edibanda, 1975), de Pedro Massano, que narra o abate, por engano, de uma negra e do seu filho de colo, por um soldado português.
A mesma revista “Visão” publicaria “Matei-o a 24”, logo a partir do seu primeiro número, uma das abordagens mais marcantes ao tema, apesar de ser uma história que ficou incompleta. Desenhada por Victor Mesquita, a partir de um argumento de Machado da Graça, num estilo realista, a cores, com uma planificação muito dinâmica, esta BD, é narrada na primeira pessoa por Eduardo, recém-regressado à vida civil após cumprir a sua comissão em Moçambique, com evidentes sintomas daquilo que hoje se designa por Síndroma de Guerra.

Nela, descreve como, após ter sido dado como morto na sequência de um ataque, se vê frente a frente com um guerrilheiro negro – um “turra”, como eles eram chamados em África pelos portugueses - e como conseguiram ultrapassar a rivalidade inicial para se ajudarem mutuamente. Esta BD teria apenas 12 pranchas publicadas até ao quinto número da publicação. Depois, desentendimentos internos levaram à saída do seu autor, ficando os leitores sem saber o destino de Eduardo e do parceiro, embora o título o deixasse adivinhar...
A mesma revista “Visão”, criada para divulgar de forma digna “Uma nova banda desenhada portuguesa”, claramente marcada por ideias de esquerda e pela sede de liberdade que atravessava o país, voltaria de alguma forma ao tema, ao publicar uma biografia aos quadradinhos de Amílcar Cabral, embora de origem cubana.
Publicada directamente em álbum, “Operação Óscar” (Meribérica/Líber, 2000), de José Ruy, narra a relação amorosa entre um oficial português e uma negra, abarcando o período desde 1962 até à revolução de Abril, cruzando a ficção com personagens reais como Salgueiro Maia e Otelo Saraiva de Carvalho.
“Quem vem e atravessa o rio” (Quadrado #3, 2ª série, ASIBDP, 1996) de Arlindo Fagundes e Pedro Sousa Dias, mostra em tom mordaz os efeitos da guerra a longo prazo, quando o herói, Pitanga, encontra um ex-PIDE prestes a suicidar-se na ponte Luiz I, dividido entre uma atitude racista e os remorsos do que fez em África.
E se a maior parte das abordagens da BD nacional à guerra colonial se limita à simples referência histórica ou opta pela sua condenação, “Mamassuma – Comandos ao ataque” é a excepção à regra.
Lançado em 1977, num formato entre a revista e o mini-álbum, com uma tiragem anunciada de 30 mil exemplares, é uma criação de Vassalo Miranda que surpreende pelo tom assumido, se tivermos em conta o contexto, tendo sido por muitos apodada de “fascista” e “reaccionária”

Fazendo dos comandos heróis, nos moldes tradicionais da banda desenhada clássica de aventuras, Miranda usa a sua BD para criticar abertamente a descolonização levada a efeito por “alguns traidores”, supostamente aliciados pelas “grandes potências anti-europeias” – Rússia, China, Estados Unidos – “inspiradas por monstruosa ambição”, após o terrorismo nos territórios coloniais portugueses ter sido “completamente derrotado pela resistência das populações do Ultramar e pelo Exército Português”.
A acção, ainda segundo o autor, decorre em “Angola, um país luso-africano (…) onde todos viviam em paz e segurança” pois “as arestas étnicas e sociais estavam a ser limadas”. Este paraíso idílico, no entanto, em 1961 seria “atacado por grupos terroristas (…) de marginais e paranóicos, tanto africanos como europeus – que a traição não distingue raças”.
Ao longo das seis dezenas de páginas do livro, com uma linguagem viva e bem realista os comandos têm que libertar um aviador feito prisioneiro pelos “estúpidos e drogados terroristas do M.P.L.A.”, enfrentando-os sem piedade bem como os “comunistas de m…” que constituíam a tripulação de um cargueiro russo infiltrado em território angolano.
Vassalo Miranda, ele próprio ex-comando na Guiné, voltaria ao tema com “Operação Gata Brava” e “Operação Trovão” (ed. Intermal, 1994 e 1995) a partir de argumentos de Alpoim Calvão.
Não sendo muitos, estes exemplos revelam no entanto a abordagem diversificada que a banda desenhada permite, ao nível de temáticas, técnicas narrativas e estilos gráficos.


Nota 1: Por motivos evidentes, não foram referidas neste texto as histórias publicadas ao longo de 1999 no jornal Público, no projecto “25 de Abril, 25 Anos, 25 Bandas Desenhadas”. Pelo menos duas delas, “Memória”, de Cristina Sampaio e Rui Cardoso Martins, e “Pipu” de Daniel Lima, (ambas publicadas no mini-álbum “25 de Abril Sempre!”, da Má Criação, 2004) contêm breves referências à guerra colonial, tema a que Diniz Conefrey dedicou integralmente “A Serpente”.
Fica o registo para lamentar mais uma vez que esse projecto tenha ficado inédito em livro.


Nota 2: para aprofundar o tema, sugiro a leitura do catálogo “Uma Revolução Desenhada – O 25 de Abril e a BD” (Afrontamento/Centro de Documentação 25 de Abril, 1999), da autoria de João Miguel Lameiras, João Paulo Paiva Boléo e João Ramalho Santos, que serviu de ponto de partida para este texto.








(Versão revista e aumentada do texto publicado no Jornal de Notícias de 31 de Maio de 2011, integrado numa série de artigos sobre a Guerra Colonial)
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