Étienne Davodeau
Futuropolis + Louvre Éditions
França, 24 de Outubro de 2013
195 x 265 mm, 144 p., preto,
branco e cinzento, cartonado
Se há algo que não me deixa de surpreender em Étienne Davodeau, autor que acompanha desde as suas primeiras obras, é a sua capacidade
de partir de pequenos pressupostos banais, para construir crónicas sociais, de
diversos matizes, sempre capazes de seduzir e prender o leitor.
O mesmo acontece com Le chien qui louche, que tem como ponto
de partida a questão: quem decide o que é ou não merecedor de ser exposto num
grande museu – como o Louvre que co-edita esta belíssima edição (mais uma) da
Futuropolis.
Sem atingir o nível – e a profundidade - de obras como Alguns dias com um mentiroso, Rural, Lulu femme nue ou Les Ignorants, este novo álbum, de tom mais ligeiro e divertido, revela um olhar
a um tempo atento e sarcástico, enquanto demonstra (de novo) o seu grande à
vontade no retratar de seres (verdadeiramente) humanos.
Mais do que a questão central, é a abordagem da relação, nem
sempre pacífica, de Fabien, guarda do museu do Louvre, e Mathilde Benion,
médica, que ocupa o autor. As diferenças sociais, humanas e de postura de ambos,
os pontos de contacto que os atraíram e a relação do par com os irmãos e o pai
dela, são mostrados de um modo natural e credível, graças à forma como os
diálogos fluem, como as trocas de olhares funcionam, à eloquência das cenas mudas e à dinâmica da construção da narrativa em função da gestão do tempo, fazendo-o correr, abreviando-o ou (quase) parar.
Do encontro de Fabien com a família Benion, fabricantes de
móveis, surge o pedido de expor no Louvre – local (apaixonante) que serve de palco a boa parte
da acção e que Davodeau nos faz visitar sem darmos por isso – um quadro – o que
trata o tal cão vesgo do título - de um antepassado dado às artes.
Das diferenças de posição e pontos de vista – entre o citadino,
de alguma forma culto, e os fabricantes de móveis de uma pequena vila, voluntariosos
e sem papas-na-língua – vão surgir diferentes momentos de tensão que Davodeau
retrata na perfeição, num tom mordaz, enquanto encaminha o leitor para um final
inesperado que resolve com brilhantismo a questão central.
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