Um dos maiores flagelos que afecta o continente africano serve
de tema a este livro: os meninos-soldados.
A minha leitura de uma obra forte e chocante, já de seguida.
Le ventre de la hyène
é a história – ficcionada mas em que se adivinha uma sólida pesquisa, até pelos
inúmeros pontos de contacto com casos reais recentes – de dois irmãos, Talino e
Anouar, separados no início da adolescência, quando o tio e tutor deles vendeu o
mais velho a um grupo de mercenários. Para providenciar sustento para a
(restante) família… e também para afastar o menino que acreditava possuído pelo
demónio.
Esse foi o início de um percurso iniciático e difícil - a entrada na vida adulta - dos dois irmãos que
o (malfadado) destino viria a reunir novamente, mudando-os, transformando (potenciais)
vítimas em (ferozes) algozes, numa espiral de violência com um percurso
sangrento e término brutal, acentuado pelo traço duro e expressivo, sem
contemplações de Alliel.
Um percurso sinuoso, em nome de quem paga – ou diz que paga
- que os arrastou de país em país, até à europeia Marselha (onde a realidade, a
vários níveis, não é assim tão díspar…), e que levou a que a relação fraternal
entre os dois se transformasse num ódio doentio e profundo, que se reflectiu no
seu relacionamento mútuo e com os outros.
Mas, se Le ventre de
la hyène é um retrato duro e sofrido das vidas de Talino e Anouar – e
daqueles que com eles tiveram o azar de se cruzar – como reflexo de uma
situação cruel e inumana que a muitos (poderes) interessa manter, é também o
reconhecimento (desiludido) de como é quase impossível a quem vem de fora -
mesmo que movido das melhores intenções – entender tudo o que está subjacente a
uma realidade chocante mas que se eterniza num continente (tristemente)
habituado a sofrer.
Le ventre de la hyène
Clément Baloup (argumento)
Christophe Alliel (desenho)
Le Lombard, Bélgica, 20 de Junho de 2014
222 x 295 mm, 128 p.,
cartonado, 19,99 €
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