Há 90 anos, um novo herói chamado
Tintin, de partida para a Rússia, despedia-se à porta de uma
carruagem de comboio, prometendo enviar "postais, vodka e
caviar".
Era a primeira de muitas viagens, do
repórter mais famoso da BD, apesar de ter escrito uma única
reportagem, então para "Le Petit Vingtième", um
suplemento infantil de um jornal francês.
Da Rússia soviética aos Estados Unidos,
da China ao Peru, do Egipto à Austrália, das ficcionais Bordúria e
Sildávia à própria Lua (16 anos de Neil Armstrong), Tintin,
primeiro com Milu, depois também com o Capitão Haddock, o professor
Tournesol ou os detectives Dupond e Dupont, iria tornar num dos
símbolos mais populares do século XX.
Da ingenuidade das primeiras aventuras, influenciadas pelas posições de extrema-direita do seu mentor católico, à denúncia de todo o tipo de ditaduras e à afirmação de valores universais como a amizade e o direito à igualdade, Hergé tornou-se um dos mais destacados, apreciados e copiados autores de banda desenhada de sempre, com uma obra que continua a ser lida 90 anos depois da sua criação e 40 anos depois da última novidade, Tintin e os Pícaros, em 1976. A legibilidade do traço, a qualidade narrativa, as doses equilibradas de aventura, acção, suspense e emoção, e um herói intrépido, sincero e que privilegia a amizade, são algumas das razões desse sucesso.
Sem (reais) novidades há décadas, e
mesmo se a passagem ao cinema pelas mãos de Steven Sipelberg, fã
confesso da obra de Hergé, fazendo jus ao original, tarda a ter a
anunciada continuação com realização de Peter Jackson e não lhe
grangeou nos Estados Unidos a popularidade que desfruta no resto do
mundo, mais de 250 milhões de álbuns vendidos, com o mercado chinês
em crescendo nos últimos anos, dezenas de obras de análise e
centenas de produtos derivados de grande qualidade, revelam que a
popularidade ímpar do herói de poupa e calças de golfe se mantém.
Agora, a uma década do centenário, as
comemorações anunciam-se menos mediáticas do que seria esperado. A
Foundation Moulinsart, que gere os direitos da obra de Hergé,
anuncia o lançamento, apenas em formato digital, da primeira versão
de Tintin no Congo, digitalizada, remasterizada e colorida
para a efeméride (ver exemplos acima), que prossegue o que foi feito pela Casterman há
dois anos, quando editou Tintin au Pays des Soviets
a cores.
A aventura no Congo, tem sido uma das
mais questionadas nos últimos anos, com acusações de racismo e de
promoção de maus tratos a animais, quase sempre por parte de
organizações ou pessoas em busca dos seus "15 minutos de fama"
à custa da obra de Hergé. De certa forma em resposta a essas vozes,
surgiu nop final de 2018nas livrarias francófonas Les
Tribulations de Tintin au Congo, com uma versão comentada e
comparada dessa BD, tal e qual foi publicada em 1940-41, já com
algumas variações introduzidas por Hergé. O autor, Philippe Godin,
um dos maiores especialistas na obra do criador de Tintin, defende
que se trata apenas de uma obra ingénua e algo imatura que espelha a
mentalidade belga de 1930, mais a mais sabendo-se que em obras
posteriores Hergé demonstrou posições contrárias bem mais
determinadas.
A grande novidade dos 90 anos, é a
inauguração, no dia 13, de uma exposição de pranchas originais
desta obra, no Musée Hergé, na Bélgica.
Mesmo
não tendo desembarcado em Lisboa, quando o paquete que o conduzia ao
Congo passou ao largo da capital portuguesa (pelo menos na versão
original desta BD, datada de 1931), Portugal foi o primeiro país não
francófono a publicar Tintin.
Aconteceu
na revista O
Papagaio,
a partir do número 49, de 19 de Março de 1936,onde, pela primeira vez a nível mundial, foi visto colorido, porartistas da própria revista.
No
nosso país, onde continua inédita a versão colorida dos Sovietes,
não haverá qualquer edição para assinalar a efemériede, mas uma
edição daquela versão, única no mundo, já tentada mas nunca
autorizada, faria a delícia dos coleccionadores de Tintin em todo o
mundo.
(versão revista e aumentada do texto
publicado no Jornal de Notícias de 10 de Janeiro de 2019; clicar nas imagens para as aproveitar em toda a sua extensão)
O meu sonho seria ver a ultima história inacabada de Hergé "Tintin e a Alph-Art" finalmente acabada, pois como mostra muito bem a edição lançada pela ASA o seu criador já tinha muito material para trabalhar sobre as ideias deixadas pelo seu criador.
ResponderEliminarTintin, juntamente com Astérix e Lucky luke, são para mim personagens da BD eternas. Desde que estejam nas mãos competentes de artistas e argumentistas são bem vindas novas histórias.