21/08/2019

Bug

Um futuro sem tecnologia






Enki Bilal, autor de BD e cineasta, está de regresso com o primeiro tomo de Bug, no qual regressa a alguns dos seus temas recorrentes - mas que não põem em causa a sua qualidade algumas das suas obsessões? - como os sistemas totalitários, a destruição acelerada do nosso planeta ou a cada vez maior dependência das tecnologias.
[Jugoslavo de nascimento, é um dos raros autores com praticamente toda (?) a obra editada em português. Tal como Bourgeon ou Prado, por exemplo, por razões que nunca compreendi, o que não significa que questione a (muita) qualidade de cada um deles, só interrogo o que levou autores de qualidade similar inquestionável a não terem a mesma sorte...]
Mas adiante.
Bug, mais uma escolha editorial acertada da Arte de Autor, tem como ponto de partida, a 13 de Dezembro de 20141, um acontecimento de origem não explicada que apaga, literalmente, todos os sistemas informáticos e digitais. Discos duros, backups, cópias de segurança, tudo desaparece num mesmo instante, deixando a humanidade - então ainda mais dependente do que hoje de telemóveis, computadores e outros equipamentos - à beira do caos, com suicídios em massa, quase sem transportes, sistemas bancários, equipamento médico de ponta e muito mais. Ou sem a capacidade de os utilizar por não saber de cor coisas tão simples como números de telemóvel ou endereços de correio electrónico...
Recorrendo, num primeiro momento, à memória, parcial, dos mais velhos, num regresso condicional a um passado quase esquecido, os dirigentes das nações, que nesse futuro - distante apenas duas décadas - sofreram uma reorganização sensível, com a multiplicação de ditaduras e o aparecimento de um bloco islâmico, descobrem que um cosmonauta que na altura do apagão estava no espaço, aparentemente recebeu toda a informação em falta na sua própria memória.
A corrida para o alcançar primeiro, a par da tentativa de tornar refém os seus familiares próximos como formas de pressão, desencadeia um thriller de contornos futuristas ao mesmo tempo que levanta questões importantes sobre a forma como estamos a gerir a nossa relação com a tecnologia.
Combinando antecipação científica (possível, até provável) e ficção política e questionando o lugar do ser humano na sociedade, Enki Bilal - como em quase todas as suas obras a solo - consegue mais um ponto de partida estimulante e desafiador. A forma como o sustentará e como será capaz de dar resposta às situações e questões que criou, é que irão determinar o interesse global de Bug.

Bug - Livro Um
Enki Bilal
Arte de Autor
Portugal, Julho de 2018
234 x 312 mm, 88 p., cor, capa dura
19,90 €

(versão alargada do texto publicado no Jornal de Notícias de 18 de Agosto de 2019; imagens disponibilizadas pela editora; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)

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