02/12/2021

Pardalita

Misto



Se há mérito que se deve atribuir à colecção Dois Passos e um Salto, da Planeta Tangerina, é a capacidade de surpreender os leitores regulares de banda desenhada, de cujo ‘círculo íntimo’ - leia-se ‘editoras habituais de BD’ - ela não faz parte.
Pardalita, de Joana Estrela, é o exemplo mais recente.

Para os mais distraídos, houve duas outras edições já aqui referenciadas: Desvio, de Ana Pessoa e Bernardo P. Carvalho, e A Época das Rosas, de Chloé Wary.

Se para lá da editora e de ambas serem banda desenhada, nada - ou pouco mais - as une, para muitos, Pardalita nem este último quesito terá em comum, já que a narrativa é um misto de texto, ilustração e BD, com os vários registos a sucederem-se ao longo das páginas. Compreendendo as reticências de alguns, este ‘estilo misto’ não foi de forma alguma um incómodo, e a forma como a narrativa se encadeia através deles - apesar deles? -proporcionando uma leitura fluída e bem estruturada, prova que nem sempre os ‘canônes’ são absolutos e que na ‘escrita desenhada’ ainda há muito para experimentar ou caminhos alternativos para trilhar.

Aliás, sendo Pardalita, de alguma forma, uma espécie de um diário íntimo de uma adolescente - ideia reforçada pelos cantos arredondados do livro - pode até interpretar-se este ‘estilo misto’ como um reflexo da inconstância de uma idade em que sentimentos, ideais, descobertas, inseguranças, medos e hormonas aos saltos, se atropelam numa constante roda-viva, que torna bom amanhã o que hoje era mau, ou faz odiar hoje o que ontem era amado.

A história de Raquel - parte dessa história, uma pequena parte correspondente aos poucos meses que a acompanhamos e de que nos fica ainda tanto por conhecer - não será diferente da de muitos adolescentes portugueses (ou não): vive nos subúrbios, tem pais separados, vê a mãe a refugiar-se n(a descoberta d)as redes sociais e a tornar-se activista pelo planeta, nem tudo corre bem na escola, descobre outras formas de se expressar, as amizades vão evoluindo, surgem os primeiros namorados, há sentimentos contraditórios em ebulição.

Com a credibilidade e o bom ritmo já referidos, Joana Estrela, com um traço nervoso, pouco elaborado mas de grande legibilidade e ao serviço da narrativa, conduz-nos por esse ‘vulcão em actividade’ de forma serena e com grande sensibilidade, sugerindo mais do que dizendo, quase que de forma exterior ao que narra, embora se compreenda - se sinta… - o seu envolvimento e ligação ao relato.



Pardalita
Joana Estrela
Plante Tangerina
Portugal, Novembro de 2021
150 x 215 mm, 244 p., pb, capa cartão, com cantos redondos
18,90 €

(imagens disponibilizadas pela editora; clicar nesta ligação para ver maispranchas ou nas aqui mostradas para as aproveitar em toda a sua extensão)

3 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Boa crítica Pedro. Gostei da arte da Joana Estrela, apesar da sua (aparente) simplicidade. A capa poderia ser mais mais apelativa e trabalhada (trata-se afinal de um livro que aposta na faixa etária da juventude/adolescência). Deixo os meus parabéns á Planeta Tangerina por continuar a apostar num segmento de mercado de BD pouco explorado em Portugal.

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