Inferno relativo
Sexto volume da oitava série da colecção Novela Gráfica, em curso, O desaparecimento de Josef Mengele é (mais) uma adaptação de um romance, no caso a obra homónima de Olivier Guez, e centra-se nos últimos anos de vida de Joseph Mengele e no seu estado de espírito.
Em determinada altura da minha juventude, li - devorei, talvez... - em grande quantidade obras de ficção ou históricas sobre a Segunda Guerra Mundial: os campos de extermínio nazis, as perseguições aos judeus, a ascensão de Hitler ao poder, aqueles que internamente tentaram lutar contra o estado de coisas criado pelo III Reich, a posterior criação do estado de Israel (cujas condicionantes tanto deviam pesar e influenciá-lo hoje)... e, claro, romances e bandas desenhadas em que os aliados eram os heróis e os nazis (os italianos, os japoneses...) os pérfidos vilões.
Por isso, nomes como Simon Wiesenthal, o caçador de nazis, ou Joseph Mengele, eram já sobejamente conhecidos por mim, bem como os pontos fulcrais da história que Guez aprofundou no seu romance. Desta forma, a leitura da adaptação assinada por Matz e Jörg Mailliet, teve, se não um sabor nostálgico, o condão de me fazer regressar ao passado e de recordar autores, momentos e situações que na altura me ocuparam e encheram muitas das minhas horas.
O desaparecimento de Josef Mengele parte da chegada do Anjo da Morte de Auschwitz, como fugitivo, à América do Sul, e as sucessivas iniciativas que tomou - ou tomaram por ele - para se instalar e desaparecer da circulação enquanto Joseph Mengele, entrecortada por alguns apontamentos do passado, e expõe um longo declínio que só o muito dinheiro disponível tornou menos penoso.
Da leitura deste romance gráfico, em que de certo modo, há uma tentativa de humanização do carrasco de tanto judeus, retive como aspecto marcante o facto de que os tempos conturbados que Mengele viveu nos seus refúgios sul-americanos, saltitando de um para outro, e em que desfrutou e (se) aproveitou muito mais que todas as suas vítimas (juntas?), se deveram menos ao arrependimento pela forma desumana como tratou milhares de pessoas e mais à perda de importância social e ao não reconhecimento do interesse e do alcance das suas aberrantes experiências pseudo-científicas levadas a cabo em seres humanos como ele.
A obra de Matz e Mailliet revela-se sólida, consistente e bastante pormenorizada, tratada com um traço eficiente mas com nada de belo ou atraente e um colorido enegrecido que acentua o tom global do livro, obrigando a uma leitura atenta e meditada, para evitar algumas conclusões mais apressadas ou até questionáveis.
O retrato que traça de Mengele apresenta-o como um ser humano egoísta, manipulador e insensível, vivendo apenas para si, segundo as suas vontades, sem sombra de arrependimento e sem renegar das suas acções, o que vinca a ideia de um ser humano (?) abjecto e vil, merecedor dos maus tempos que eventualmente passou e de muito mais que não chegou a sofrer.
O
desaparecimento de Josef Mengele
Segundo
o romance de Olivier
Guez
Matz
(argumento)
Jörg
Mailliet (desenho)
Olivier
Guez (prefácio)
Levoir/Público
Portugal,
13 de Setembro de 2024
195
x 270 mm, 192 p., pb, capa dura
15,90
€
(imagens disponibilizadas pela Levoir; clicar nesta ligação para ver mais pranchas ou nas aqui reproduzidas para as aproveitar em toda a sua extensão; clicar nos textos a cor diferente para saber mais sobre os temas destacados)
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