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10/09/2012

Lance #4

Volume 4 (de 4)






Warren Tufts (argumento e desenho)
Libri Impressi (Portugal, Julho de 2012)
235 x 335 mm, 88 p., cor e pb, brochado com badanas
26,50 €


1.       Confesso que a leitura deste tomo me provocou sentimentos contraditórios. Daí, também o atraso na publicação deste texto.
2.      Que, de qualquer forma, recebe o destaque que merece, pois marca o regresso de As Leituras do Pedro ao seu ritmo normal, com predominância das recensões sobre as notícias e os fait-divers, ritmo esse que afrouxou durante o período de férias.
3.      (Por isso, esta semana – e possivelmente também na próxima – conto mostrar por aqui muitas e boas páginas de edições de BD que vale a pena ler).
4.      A primeira reacção, foi positiva, pois este volume encerra a publicação integral de Lance, iniciada por Manuel Caldas há meia dúzia de anos.
5.      Se o facto já merecia realce em Portugal, onde tal raramente tem acontecido, merece destaque maior sabendo-se as condições artesanais (mas apaixonadas) em que Manuel Caldas trabalha.
6.      Pois demorou apenas cerca de meia dúzia de anos para (em simultâneo com outros projectos) restaurar a pureza do traço original, o seu fabuloso colorido, o seu brilho e a capacidade de deslumbramento de quase três centenas de pranchas, reunidas numa edição que desse ponto de vista merece todos os encómios.
7.      (E cuja qualidade e excelência valeram a venda desta “sua” edição de Lance a editores alemães e noruegueses, estando em estudo a sua edição também nos Estados Unidos).
8.     Edição que é também uma bofetada de luva branca em todos aqueles – e são (sempre) demasiados – que até agora não compraram Lance temendo que a edição ficasse a meio.
9.      É a esses (e alguns mais) que se deve a minha primeira decepção com este livro, pois possivelmente trata-se do último que Caldas editará em português, dado o exíguo número de exemplares que vende no país.
10.  Que, como habitualmente, deverá preferencialmente ser pedido directamente ao editor Manuel Caldas , porque ainda não foi distribuído, porque lhe permite recuperar mais do seu investimento em cada volume (e quem sabe repensar novas edições em português) e ainda terá direito a alguns “brindes”.
11.   Posto isto, entremos então na obra em si, notoriamente crepúsculo de um western de contornos clássicos, embora marcado por um forte humanismo e uma invulgar predominância dos sentimentos sobre a acção (ou como influenciadores da acção).
12.  Nele, é visível algum cansaço de Tufts (possivelmente já com outros projectos em mente) na mudança da estrutura das pranchas, até agora com três tiras, que passam a ser quatro, aproximando-as de um esquema próximo da “montagem” de tiras diárias em detrimento dos imensos painéis em que as vinhetas, muitas vezes, atingiam proporções assinaláveis.
13.  Com isso, há uma evidente perda de pormenorização do desenho e, embora o traço pareça surgir mais conciso, perde-se o esplendor dos grandes planos e a imensidão que tantas vezes caracterizava os cenários naturais do velho oeste.
14.  Em termos de narrativa, cuja análise hoje será breve, pois já a detalhei aquando da leitura dos tomos #2 e #3, na qual contornos ficcionais e base histórica continuam a ombrear, esbate-se um pouco a noção de saga que (também) marcava significativamente a diferença, devido ao facto de os episódios se tornarem mais curtos, auto-conclusivos e praticamente independentes entre si.
15.   Apesar dessa quebra na uniformidade que a narrativa até então apresentava, o protagonista, que continua envolvido nas questões políticas e activas decorrentes do confronto (mais diplomático do que bélico) entre os Estados Unidos e o México pela posse do Texas, não perde as suas características, continuando impetuoso, justo, determinado e (involuntário) Don Juan.
16.  As personagens mulheres continuam a marcar forte presença o que, a par do seu tom dramático e da tensão emocional que perpasse por muitas das suas páginas, tornam este western distinto, mantendo-o afastado dos estereótipos do género e uma leitura altamente recomendável.
17.   Nesta edição integral portuguesa. 

Nota final
Este quarto tomo de Lance fecha (praticamente) com uma explicação de Manuel Caldas para a sua paixão pela obra e sobre o trabalho de restauro que ela exigiu.
Um retrato breve (não restaurado!) da imensa paixão do editor pelos quadradinhos – por alguns quadradinhos, por estes quadradinhos.
Um retrato de leitura obrigatória para perceber como se perdem – se ganham, o que ganhamos nós! – 20 horas de trabalho aturado por prancha.
A única forma de ter em mãos, com esta qualidade, estas 261 pranchas (5200 horas, mais de 200 dias…) hoje. Hoje, como  momento em que Tufts as desenhou, com a qualidade (melhorada pelas técnicas de edição actuais) com que chegaram às mãos dos que primeiro as descobriram nas páginas de jornais.
Por isso, também por isso, muito obrigado Manuel Caldas.
Com a certeza de que, terminada esta tarefa hercúlea, de certeza que outra de qualidade similar, para nova proposta de leitura estimulante, já foi iniciada.
Há-de ter eco aqui.

26/07/2011

Lance

Volume 3 (de 4)
Warren Tufts (argumento e desenho)
Libri Impressi (Portugal, Julho de 2011)
235 x 335 mm, 88 p., cor e pb, brochado com badanas
26,50 €

Resumo
Terceiro dos quatro tomos previstos com a reedição integral de Lance, um western criado por Warren Tufts na década de 1950.

Desenvolvimento
Há dias, num site francês, num comentário a um artigo eram criticados os magníficos integrais francófonos – várias vezes referenciados aqui em As Leituras do Pedro - em que têm sido recuperadas obras desde os anos 1940, considerando-os um artifício de marketing para aproveitar os “últimos estertores” da geração que na infância e adolescência leu Jerry Spring, Buck Danny, Gil Jourdan ou Johan et Pirlouit, entre muitos outros.
Em resposta a esse comentário, alguém – acertadamente - contestava que obras como as citadas terão sempre público.
É óbvio que quem assim respondeu tem a noção exacta do que é um “clássico” – não apenas algo antigo (o que significa velho, ultrapassado, para alguns) – mas algo intemporal que, pelas suas características intrínsecas proporcionará sempre prazer e descoberta em cada nova (re)leitura (audição, visualização…).
De certa forma, é o caso deste Lance, uma das paixões de Manuel Caldas. Não de forma tão absoluta – se esta é uma “classificação” possível – como, por exemplo, o “seu” Príncipe Valente, mas uma obra intemporal, que se (re)lê com evidente prazer – e proveito – mais a mais tratando-se de (mais) uma (soberba) edição como esta.
Porque, sendo, na sua base, um western, é um western atípico, protagonizado por um soldado e não um cowboy, com menos cenas de acção do que é habitual do género. Não pelo facto em si, mas pelo que essa factor implica em termos de argumento, por onde passa uma forte componente política e militar, até porque Tufts introduz uma assinalável vertente histórica na sua ficção.
Também – mais ainda – porque Lance é um western humanista, no qual tiroteios, perseguições ou combates, mais do que procurar justiça, vingança ou glória, têm que ver com sentimentos, emoções, restabelecimento de relações. Quase sempre entre homens e mulher ou familiares.
Por isso, em vez de um pistoleiro, um xerife, um ranger, um caçador de prémios ou um cowboy solitário, os protagonistas – ao lado de Lance, por vezes em vez de Lance – são a sua bela e determinada mulher – mesmo quando cega – um bando de colonos perdidos na neve, uma índia branca, um bebé que chora – chora sempre…
As mulheres, aliás, têm um grande protagonismo em Lance. Não de armas na mão, embora as empunhem por vezes. Não como seres belos, sensuais e apetecíveis, como Valle, a esposa de Lance – outra prova da atipicidade deste western – ou a californiana Maria, embora muitas delas o sejam. Não, ainda, como seres frágeis e dependentes, constantes vítimas de raptos e maus-tratos que dêem ao herói a oportunidade de brilhar. Não. Em Lance, as mulheres surgem muitas vezes como desencadeadoras – e continuadoras – da acção ou mesmo no seu centro, como verdadeiras mulheres, firmes, fortes, determinadas. Humanas. Credíveis. Preponderantes, quase sempre, sejam protagonistas de primeiro plano ou quase anónimas, como a mãe do bebé já citado. Por elas, por causa delas, também, Lance é às vezes mais espectador do que actor, mais seguidor do que comandante.
Os episódios narrados, mesmo quando há perseguições, tiroteios ou combates, mesmo quando se articulam com a realidade histórica – como no caso da Guerra dos Estados Unidos com o México pela posse da Califórnia, que será mostrada no último tomo de Lance – têm mais ponderação do que acção, mais diálogos – ou pensamento – do que movimento…
Em Lance, ainda – também – a Natureza – selvagem, imparcial, poderosa, dominadora – tem um papel fundamental. Não é apenas simples cenário – se é que podemos apelidar de simples as paisagens que Tufts traça com belas e intensas cores, de forma marcante e impressionista, em profunda calmaria ou assolada pelos elementos – mas, muitas vezes, decisora dos destinos daqueles que a ousaram afrontar, indiferente às suas razões, nacionalidade, idade, condição social.
Por isto, tudo isto – por mais do que isto, que aconselho cada um a descobrir - Lance é um clássico que merece ter sido (re)editado, cuja leitura se justifica.
A reter
- A composição de tantas pranchas, vigorosas, fortes, dinâmicas, de traço ágil, seguro e de cores intensas e belas.
- O tom humanista do relato.
- A dinâmica da narrativa, apesar de assentar em vinhetas com texto escrito por baixo, embora esta característica vá desaparecendo progressivamente ao longo deste volume.
- A qualidade da edição, assente numa restauração (quase) obsessiva dos traços e cores originais obtida a partir de várias reproduções, que chega ao pormenor de indicar “defeitos” originais e de repetir uma prancha que entretanto foi possível reproduzir melhor…

Menos conseguido
- … mas que falha redondamente na “legenda” solta no centro da prancha 182.

Curiosidade
- Neste tomo termina a reprodução das tiras diárias que durante algum tempo conviveram com as pranchas dominicais em que Lance se iniciou.

Urgente
- Dadas as fracas vendas – vá-se lá saber porquê… – dos dois tomos iniciais, que se devem repetir neste, para garantir a edição do quarto e último tomo (já em preparação), Manuel Caldas pede que este tomo lhe seja directamente adquirido – o que garante ao comprador portes gratuitos e um magnífico poster gigante com a reprodução de uma prancha no seu formato original e ao editor não perder a (grossa) fatia que a distribuição devora - e que seja feita uma “pré-subscrição” do volume 4. Para o efeito, fica o contacto: mcaldas59apo.pt

09/07/2009

Lance #2

Lance – Volume 2 (de 4)
Warren Tufts (argumento e desenho)
Libri Impressi (Maio de 2009)

234 x 333 mm, 96 p., cor e pb, brochado com badanas

Resumo

Lance St. Horn, tenente (indisciplinado) do exército norte-americano vive grandes aventuras que só têm paralelo nas paixões que provoca.

Desenvolvimento
O segundo tomo da reedição integral deste western clássico de recorte humano, datado de meados dos anos 50 do século passado e ambientado nos primeiros anos da expansão para o oeste selvagem, destaca-se mais uma vez pela superior qualidade da edição, da responsabilidade do português Manuel Caldas que gastou em média 15 horas no restauro de cada prancha da obra a partir de páginas de jornais da época, obtidas no Ebay, pois já não existem as provas originais.
Este segundo volume tem a particularidade de incluir não só as magníficas pranchas dominicais, coloridas, mas também as tiras diárias, a preto e branco, tendo estas sido de curta duração, pois publicaram-se apenas durante 16 meses, enquanto a série durou cinco anos.
Isto não retira interesse à narrativa, com a história dividida entre as proezas heróicas de Lance St. Lorne, um impetuoso e impulsivo (e por vezes indisciplinado) tenente do exército norte-americano, com uma visão muito pessoal do sentido do dever, sempre ao lado dos mais fracos e desfavorecidos, e as paixões amorosas que vai desencadeando. Neste volume, entre o combate à ofensiva desencadeada pelo chefe índio Nariz Partido e a tentativa de ajudar os caçadores montanheses ao lado da jovem e fogosa Valle, com quem acaba por casar, sobra tempo para um curto mas belíssimo interlúdio, compostos pelas pranchas 79 a 85, que revelam toda a mestria narrativa e gráfica do traço clássico de Tufts, a sua soberba aplicação de cores e a sua invulgar capacidade de emprestar emoções bem humanas aos seus heróis de papel.

A reter
- A edição em si.
- A paixão e o cuidado postos no restauro dos originais por Manuel Caldas.
- O episódio das pranchas 79 a 85.

Menos conseguido
- Eu sei que a edição integral obrigava à publicação como ela é feita, alternando as pranchas dominicais com as tiras diárias, mas a verdade é que a sua leitura conjunta, retira dinamismo à acção, tornando-a mesmo algo repetitiva, uma vez que a narrativa das tiras, embora aprofunde e acrescente pormenores ao todo, começa um pouco antes do fim da prancha dominical anterior e termina um pouco depois do início da prancha seguinte…
- É inacreditável que o primeiro volume de Lance não tenha vendido em Portugal os míseros 700 exemplares necessários para o pagar e garantir novo tomo. Depois queixem-se que não há banda desenhada em português. Quando há – e com esta qualidade - não a compram! Bem podemos agradecer aos nossos vizinhos espanhóis a possibilidade de ler este volume #2.

Curiosidades
- As pranchas dominicais de Lance foram publicadas entre 5 de Junho de 1955 e 29 de Maio de 1960, enquanto que as tiras diárias existiram de 4 de Janeiro de 1957 a 17 de Maio de 1958.
- Segundo (o especialista) Manuel Caldas, “o belíssimo interlúdio do episódio de Muitas Túnicas esteve para ser passado ao cinema na época em que a série se publicava”.

(Versão revista e actualizada do texto publicado a 20 de Junho de 2009 no suplemento In’ da revista NS, distribuída aos sábados com o Jornal de Notícias e o Diário de Notícias)
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