Volume 4
(de 4)
Warren
Tufts (argumento e desenho)
Libri
Impressi (Portugal, Julho de 2012)
235
x 335 mm, 88 p., cor e pb, brochado com badanas
26,50
€
1. Confesso
que a leitura deste tomo me provocou sentimentos contraditórios. Daí, também o
atraso na publicação deste texto.
2. Que, de
qualquer forma, recebe o destaque que merece, pois marca o regresso de As Leituras
do Pedro ao seu ritmo normal, com predominância das recensões sobre as notícias
e os fait-divers, ritmo esse que afrouxou durante o período de férias.
3. (Por
isso, esta semana – e possivelmente também na próxima – conto mostrar por aqui
muitas e boas páginas de edições de BD que vale a pena ler).
4. A
primeira reacção, foi positiva, pois este volume encerra a publicação integral
de Lance, iniciada por Manuel Caldas há meia dúzia de anos.
5. Se o
facto já merecia realce em Portugal, onde tal raramente tem acontecido, merece
destaque maior sabendo-se as condições artesanais (mas apaixonadas) em que Manuel
Caldas trabalha.
6. Pois demorou
apenas cerca de meia dúzia de anos para (em simultâneo com outros projectos) restaurar
a pureza do traço original, o seu fabuloso colorido, o seu brilho e a capacidade
de deslumbramento de quase três centenas de pranchas, reunidas numa edição que
desse ponto de vista merece todos os encómios.
7. (E cuja
qualidade e excelência valeram a venda desta “sua” edição de Lance a editores
alemães e noruegueses, estando em estudo a sua edição também nos Estados Unidos).
8. Edição
que é também uma bofetada de luva branca em todos aqueles – e são (sempre)
demasiados – que até agora não compraram Lance temendo que a edição ficasse a
meio.
9. É a esses
(e alguns mais) que se deve a minha primeira decepção com este livro, pois
possivelmente trata-se do último que Caldas editará em português, dado o exíguo
número de exemplares que vende no país.
10. Que,
como habitualmente, deverá preferencialmente ser pedido directamente ao editor
Manuel Caldas
, porque ainda não foi distribuído, porque lhe permite recuperar mais do seu
investimento em cada volume (e quem sabe repensar novas edições em português) e
ainda terá direito a alguns “brindes”.
11. Posto
isto, entremos então na obra em si, notoriamente crepúsculo de um western de
contornos clássicos, embora marcado por um forte humanismo e uma invulgar predominância
dos sentimentos sobre a acção (ou como influenciadores da acção).
12. Nele, é
visível algum cansaço de Tufts (possivelmente já com outros projectos em mente)
na mudança da estrutura das pranchas, até agora com três tiras, que passam a ser
quatro, aproximando-as de um esquema próximo da “montagem” de tiras diárias em
detrimento dos imensos painéis em que as vinhetas, muitas vezes, atingiam proporções
assinaláveis.
13. Com isso,
há uma evidente perda de pormenorização do desenho e, embora o traço pareça surgir
mais conciso, perde-se o esplendor dos grandes planos e a imensidão que tantas
vezes caracterizava os cenários naturais do velho oeste.
14. Em termos
de narrativa, cuja análise hoje será
breve, pois já a detalhei aquando da leitura dos tomos #2
e #3, na qual contornos ficcionais e base histórica continuam a ombrear,
esbate-se um pouco a noção de saga que (também) marcava significativamente a diferença,
devido ao facto de os episódios se tornarem mais curtos, auto-conclusivos e praticamente
independentes entre si.
15. Apesar
dessa quebra na uniformidade que a narrativa até então apresentava, o
protagonista, que continua envolvido nas questões políticas e activas decorrentes
do confronto (mais diplomático do que bélico) entre os Estados Unidos e o México
pela posse do Texas, não perde as suas características, continuando impetuoso,
justo, determinado e (involuntário) Don Juan.
16. As
personagens mulheres continuam a marcar forte presença o que, a par do seu tom
dramático e da tensão emocional que perpasse por muitas das suas páginas, tornam
este western distinto, mantendo-o afastado dos estereótipos do género e uma
leitura altamente recomendável.
17. Nesta edição
integral portuguesa.
Nota final
Este
quarto tomo de Lance fecha (praticamente) com uma explicação de Manuel Caldas
para a sua paixão pela obra e sobre o trabalho de restauro que ela exigiu.
Um
retrato breve (não restaurado!) da imensa paixão do editor pelos quadradinhos –
por alguns quadradinhos, por estes quadradinhos.
Um
retrato de leitura obrigatória para perceber como se perdem – se ganham, o que
ganhamos nós! – 20 horas de trabalho aturado por prancha.
A
única forma de ter em mãos, com esta qualidade, estas 261 pranchas (5200 horas,
mais de 200 dias…) hoje. Hoje, como
momento em que Tufts as desenhou, com a qualidade (melhorada pelas
técnicas de edição actuais) com que chegaram às mãos dos que primeiro as
descobriram nas páginas de jornais.
Por
isso, também por isso, muito obrigado Manuel Caldas.
Com
a certeza de que, terminada esta tarefa hercúlea, de certeza que outra de
qualidade similar, para nova proposta de leitura estimulante, já foi iniciada.
Há-de
ter eco aqui.