Em
2010, a banda desenhada portuguesa era surpreendida com o lançamento
de As Incríveis Aventuras de Dog Mendonça e Pizzaboy, que viriam a
demonstrar - mais três livros e quatro anos depois - que os
quadradinhos nacionais eram capazes de chegar a leitores fora do
habitual nicho de consumidores do género e podiam ter como
protagonistas heróis recorrentes e marcantes.
Filipe Melo (argumento) Juan Cavia (desenho) Santiago Villa (cor) Martin Tejada (adaptação sequencial) George A. Romero (prefácio) Tinta-da-China (Portugal, 1 de Novembro de 2011) 170 x 240 mm, cor, 112 p., brochado com badanas 16,90 € Resumo Depois de evitarem o fim do mundo. Dog Mendonça, o lobisomem de meia-idade, PizzaBoy, agora operador de call-center, o demónio Pazuul e a gárgula falante são obrigados a juntar-se novamente, desta vez para evitar o Apocalipse… E para além deste quarteto fantástico, numa catástrofe de proporções bíblicas, até a Virgem de Fátima faz uma perninha!
Desenvolvimento Neste novo livro, a história começa cinco anos após os acontecimentos marcantes do primeiro volume, em belos cenários desenhados por Juan Cavia, servidos por cores mais claras e um traço bem mais definido que muito valorizam a obra, embora custe a acreditar que numa país chamado Portugal, num intervalo de tempo tão curto, Lisboa fosse tão rapidamente reconstruída…! PizzaBoy trabalha agora num call-center, onde presta ajuda informática. A atitude enfadada, o desinteresse pela tarefa, a falta de atenção dada a quem telefona, os conselhos factuais – “tente desligar o router e reiniciar o computador” - mostram que afinal estamos no mundo real! Quanto à trama, ela é espoletada por um padre perseguido pelo Vaticano que recorre a Dog Mendonça e à sua equipa para deterem o Apocalipse… iniciado “há quinze minutos e dez segundos”. E se a ética impede o detective de salvar “o mundo à borla”, a precipitação dos acontecimentos não lhe dará outra hipótese, levando ao reencontro dos quatro protagonistas. Desencadeia-se então a acção, em grande estilo e em ritmo acelerado, que, entre pragas, confrontos monumentais, perseguições e a análise da previsão bíblica através de uma edição… infantil (!), vai levar os protagonistas a Fátima – onde, tal como Jacinta, Francisco e Lúcia, terão direito à respectiva aparição. Num volume, mais uma vez recheado de referências a uma certa cultura pop, da música, do cinema, da televisão, da própria BD e até auto-citações (!), consubstanciada em zombies, monstros fofinhos, bestas do apocalipse, teorias da perseguição, conspirações religiosas e o mais que os leitores se vão divertir a descobrir, Filipe Melo cria uma obra plena de bom humor, bem escrita e cativante que o leitor não tem outro remédio do que ler num só fôlego. Aos diálogos, escritos como poucas pessoas o fazem em Portugal – na BD, para além de Arlindo Fagundes não me ocorre mais ninguém – ritmados, vivos, credíveis, divertidos, repletos de alusões e trocadilhos, Melo e os seus companheiros acrescentam também uma planificação muito dinâmica, com múltiplas tomadas de pontos de vista e alguns efeitos bem conseguidos em termos narrativos, como a mudança de cenas mantendo os planos e dando sequência às frases, logo nas páginas iniciais, uma melhoria evidente na aplicação da cor e na iluminação das cenas, bem mais claras e legíveis, e um aprimoramento do traço ágil, caricatural e expressivo, mostrando-se Juan cavia completamente à vontade tanto com a figura humana como nos cenários - naturais ou dantescos - com os quais vão prendendo e surpreendendo o leitor, página após página. Desta forma, este livro confirma tudo o que o primeiro já tinha mostrado e prometido, indo ainda mais além, com o refinamento da escrita, a melhoria gráfica e a melhor colorização, tendo tudo para ser mais um sucesso em Portugal (à dimensão do nosso mercado, claro) e para passar além-fronteiras, como aliás já está a acontecer com uma nova história, a ser actualmente publicada na revista norte-americana Dark Horse Presents, de que hei-de falar proximamente. No final, com Lisboa mais uma vez destruída (o que não indicaria um daqueles estudos psicológicos de pacotilha…?), fica a inevitável ponta solta que promete uma continuação para as aventuras de Dog Mendonça e PizzaBoy. Que, já antevejo, terão no título algo como “assombrosas” ou “espantosas” e um “III” no final…
A reter - A escrita de Filipe Melo: incisiva, divertida, fluente. - A significativa melhoria da iluminação, da cor, que realçam ainda mais o traço - melhorado com a prática - de Juan Cavia. - As boas recordações que as muitas referências trazem a quem foi passando por elas. - O dossier final com o making-of do livro. - A mais-valia do prefácio de George A. Romero.
Lançamentos Tal como aconteceu com o primeiro volume, também este vai ser objecto de uma mini-tournée de apresentação e lançamento, sempre com a presença de Filipe Melo, Juan Cavia e Santiago Villa, numa promoção empenhada que não justifica por si só o sucesso que a obra inicial conquistou, até porque o seu valor e potencial são inegáveis, mas ajuda a explicá-lo. Por que em Portugal, poucas vezes a BD tem sido alvo da promoção que poderia alavancá-la para lá do nicho habitual de consumidores… Eis as datas já anunciadas: 1 de Novembro 16h – Lançamento oficial, AmadoraBD 2011 – Fórum Luís de Camões, à Brandoa 17h-19h – Sessão de autógrafos, AmadoraBD 2011 20h – Lançamento na Tertúlia de BD de Lisboa – Parque Mayer 23h – Lançamento no Shortcutz – Bicaense, Lisboa
2 de Novembro 22h – Lançamento no Shortcutz – Hardclub, Porto
3 de Novembro 18h30 – Lançamento na FNAC Chiado, Lisboa 4 de Novembro 18h00 – Lançamento na FNAC Santa Catarina, Porto 19h30 – Lançamento na Mundo Fantasma, Porto
5 de Novembro 15h – Lançamento na Bertrand, Caldas da Rainha
6 de Novembro 15h – Sessão de autógrafos, AmadoraBD 2011 16h – Lançamento “Dog na Dark Horse”, AmadoraBD2011 17h-19h – Sessão de autógrafos, AmadoraBD 2011
9 de Novembro 18h30 – Lançamento na Dr. Kartoon, Coimbra 21h – Lançamento na FNAC Coimbra
10 de Novembro 10h - Aula aberta de BD com João Lameiras, Guimarães
Filipe Melo (argumento) Juan Cavia (desenho) Santiago Villa (cor) Tinta da China (Portugal, Fevereiro de 2010) 165 x 240 mm, 120 p. cor, brochado com badanas
Resumo Vampiros, lobisomens, gárgulas e fantasmas vivem pacificamente, nas sombras, entre os humanos. Porém, no subsolo de Lisboa, o pior de todos os monstros ganha forças e prepara o seu regresso. Para isso, anda a raptar crianças na capital portuguesa. Um jovem distribuidor de pizzas, um ex-lobisomem de meia-idade, um demónio de seis mil anos e uma cabeça de gárgula com um estranho sentido de humor serão os únicos capazes de fazer frente às forças do mal que ameaçam a Humanidade.
Desenvolvimento E de repente, parece que a banda desenhada portuguesa descobriu que pode aliar a qualidade artística à vertente comercial, no bom sentido do termo, sem desvirtuar projectos nem fazer mais cedências do que as estritamente necessárias. Mais, assumindo o objectivo de constituir um (bom) divertimento (bem feito) e tendo como meta chegar ao máximo possível de leitores, não só ao (curto) nicho habitual. Exemplos recentes são BRK, de Filipe Pina e Filipe Andrade, Asteroid Fighter de Rui Lacas, e, agora, este livro. Que tem génese estranha, quase tanto como a história que narra. Porque nasceu em Tondela; porque na sua origem está Filipe Melo, músico e cineasta (I’ll see you in my dreams, Um mundo catita); porque resulta de uma parceria luso/argentina (nacionalidade do desenhador e também do colorista); porque esteve para ser um filme e acabou como BD (para benefício dos leitores de quadradinhos – de todos os que lerem estes quadradinhos). A história reúne um entregador de pizzas, um detective do oculto, um demónio que encarnou num corpo de criança e a cabeça duma gárgula, que percorrem as entranhas de Lisboa, para descobrirem quem anda a raptar as crianças lisboetas e, juntamente com um sem número de monstros e demónios, combaterem uma (nova) ameaça nazi. O tom é tão fantástico, rocambolesco e delirante quanto o resumo deixa entender, cruzando um sem número de referências e citações, de Jackie Chan aos Gremlins, de Casablanca a Howard, the Duck, de Hellboy a Dylan Dog, do policial negro ao cinema fantástico, numa narrativa de ritmo acelerado, de cortar o fôlego, em que as surpresas e o bom humor são recorrentes página após página, até ao desfecho final que deixa tudo em aberto para uma nova BD… pela qual se fica ansiosamente à espera. E se foi preciso ir à Argentina buscar o desenhador, ainda bem que assim foi, pois o traço de Juan Cavia, de volumes bem definidos, a um tempo semi-realista e caricatural, e de um grande dinamismo, onde se adivinha sem dificuldade a sua experiência cinematográfica, imprimiu ao relato o ritmo que ele pedia, através do uso dos mais variados planos e de uma planificação multifacetada, multiplicando vinhetas ou optando por páginas com um desenho só.
A reter - O desenho, o ritmo, o humor, as homenagens. Uma BD muito bem feita. - A magnífica edição da Tinta da China. - O making of escrito por Ana Markl que ocupa as últimas páginas do livro.
Menos conseguido - A capa, pouco chamativa, sem imagem…
Curiosidade - Afinal qual a alcunha de Eurico Catatau? Pizza Boy, PizzaBoy (como na capa do livro) ou Pizzaboy (como Filipe Melo escreve)…?
(Versão revista e aumentada do texto publicado originalmente a 13 de Março de 2010, na página de Livros do suplemento In’ da revista NS, distribuída aos sábados com o Jornal de Notícias e o Diário de Notícias)
Pergunta - Se lessem banda desenhada quais seriam as preferidas de Dog Mendonça, Pizzaboy, Pazuul e Gárgula?
Resposta – Dog Mendonça: Cavaleiro Andante e Mosquito; o Eurico Catatau (Pizzaboy) mantém-se informado por causa do seu colega Vasco, que colecciona BD. As BD´s favoritas dele são Hellblazer, Hellboy, Batman - Arham Asylum, Sandman (do Neil Gaiman), Swamp Thing (do Alan Moore), Ronin e Elektra (do Frank Miller), X-Men Dark Phoenix Saga e Blueberry (de Jean Giraud e Charlier); o Pazuul só gosta do José Carlos Fernandes e a Gárgula lê Tio Patinhas, Pato Donald, Turma da Mónica e Recruta Zero.