05/10/2011

Une nuit de pleine lune

Yves H. (argumento)
Hermann (desenho)
Sébastien Gérard (cor)
Glénat (França, Setembro de 2011)
240 x 320 mm, 56 p., cor, cartonado
13,50 €

Resumo
Cinco jovens decidem assaltar um casal idoso que vive numa casa isolada, atraídos por um cofre supostamente bem recheado.

Desenvolvimento
Surpresa: o abrir do álbum deu a sensação de um regresso ao passado, ao tempo (já algo distante) em que Hermann não trabalhava em cor directa, fazendo o desenho a tinta-da-china, posteriormente colorido. Opção que o autor me tinha referido numa conversa no Festival de Beja, em 2010, que de imediato me veio à mente.
Por isso, o grafismo surge algo estranho, diferente, evocando em parte os últimos tomos de “Comanche” ou os primeiros de “Jeremiah”. Apesar da cor, aplicada por Sébastien Gérard, surgir menos exuberante, baseada em tons mais frios e sombrios, evidentemente ajustados ao tom da narrativa e à penumbra, apenas parcialmente quebrada pela lua cheia, em que quase toda ela decorre.
O relato começa de forma lenta, dando a conhecer os cinco jovens envolvidos no golpe. Cinco jovens – quatro rapazes e uma rapariga; quatro brancos e um negro; um inadaptado e quatro acomodados… – com razões e motivos diferentes para estarem ali: o regresso ao Marrocos natal, o desejo de uma vida com luxo, álcool e mulheres, o jeito para a electrónica, o conhecimento do local…
Cinco jovens cujas diferenças vêm de imediato ao de cima, revelando pontos de atrito, desentendimentos, formas de estar e de agir que farão com que rapidamente entrem em choque, pondo em causa o objectivo (que devia ser) comum mas que, afinal não os move a todos de igual modo. Num retrato ajustado de uma certa realidade comum a (quase) todos os países ocidentais, o que confere a “Une nuit de pleine lune” uma incómoda actualidade.
Depois, após cerca de um terço do livro que serve então como introdução e apresentação dos principais (serão?) intervenientes, o ritmo torna-se mais intenso, ao mesmo tempo que a tensão sobe, com a chegada à casa (já invadida) do casal idoso. Momento em que o plano, aparentemente tão bem traçado, começa a descarrilar.
Primeiro, porque as divergências quanto ao modo de acção vêm claramente ao de cima; depois, porque um infeliz acidente (será?) provoca uma morte e desencadeia um banho de sangue de consequências de todo inesperadas; finalmente, porque afinal o casal – o homem – não era tão dócil e submisso quanto os cinco jovens esperavam…
Thriller de acção, intenso e dramático, “Une nuit de pleine lune”, escrito de forma competente e muito legível (o que nem sempre tem acontecido…) por Yves H., revela mais uma vez Hermann como um dos grandes desenhadores de BD da actualidade, mesmo neste seu regresso (gráfico) ao passado.

A reter
- A surpresa do registo gráfico de Hermann.
- A boa adequação da cor à narrativa.

Menos conseguido
- Alguma previsibilidade do desfecho final.
- A “falta de páginas” para aprofundar as motivações individuais e as tensões entre os cinco jovens.
Curiosidade
- O álbum encontra-se também disponível numa edição a preto e branco, com capa diferente com aplicações de verniz em zonas seleccionadas, lombada em tela e tiragem limitada, que inclui um caderno extra com 8 páginas de esboços, cujo preço é de 25,00 €. E que permite admirar melhor o magnífico traço de Hermann.






04/10/2011

Dick Tracy, 80 anos

O primeiro detective da história dos comics americanos nasceu há exactamente 80 anos, nas páginas do "Chicago Tribune", na forma de prancha dominical. Era a concretização de quase uma década de esforços por parte do seu criador, Chester Gould (1900-1985) que pretendera chamá-lo Painclothes Tracy (algo como "agente à paisana" Tracy) mas que foi rebaptizado pelo editor com o nome – Dick Tracy - com que se tornou uma das obras de referência da chamada Época de Ouro dos comics americanos.
Mas a originalidade da série não se ficava pela profissão do herói - assumida logo à 10ª tira, para encontrar os raptores da sua noiva e assassinos do seu futuro sogro - vinha também da sua fonte de inspiração, as notícias dos jornais que reflectiam a criminalidade crescente num país que tentava a todo o custo deixar para trás os efeitos da Grande Depressão, ocorrida dois anos antes.

A seu favor "Dick Tracy" tinha ainda mais dois aspectos inovadores. Por um lado, um grafismo original, baseado num estilo caricatural feito de preto e branco contrastante, expressionista e brutal, apresentando o herói o célebre "queixo quadrado" e os vilões quase sempre um aspecto aberrante devido às faces disformes. Por outro lado, as histórias eram bem urdidas e traziam para as tiras de jornal um realismo até então desconhecido neste suporte, alicerçado num ambiente de tensão e suspense - por vezes, mesmo terror - e em doses generosas de violência, revelada especialmente no fim dos criminosos, raramente julgados, antes quase sempre abatidos pela polícia ou falecidos em estranhos e brutais acidentes de percurso, em especial durante a década de 40, na qual alguns dos mais notórios gangsters da série perderam a vida.
Chester Gould, sem qualquer formação artística, dotou Dick Tracy com uma rica galeria de personagens secundárias (Tess Trueheart, com quem casaria em 1949, Bonny Braids, a filha de ambos, o Chefe da polícia Brandon, Pat Patton, o seu fiel assistente, Júnior, o seu filho adoptivo, ou a longa lista de marcantes vilões entre os quais Big Boy, Pruneface ou Mumbles. Nos anos 60, a tira entrou na “era espacial”, tendo o herói pilotado naves, encontrado extraterrestres e ido até à Lua.
O criador do detective à paisana, adepto das técnicas forenses e utilizador de um famoso rádio-relógio-transmissor de pulso, manter-se-ia ao leme da sua criação até 1977, tendo assinado a série pela última vez no Dia de Natal. Rick Fletcher, seu assistente desde 1961, assumiria o desenho, e Max Allan Colins o argumento. Actualmente o detective continua a viver aventuras – de traço menos agreste e bem menos violentas do que na sua melhor fase - diariamente nos jornais, sendo os seus responsáveis Joe Staton e Mike Curtis que ontem começaram a recontar o primeiro caso do detective, como pode ser acompanhado aqui.
A partir de 1942, Dick Tracy seria alvo de uma bem conseguida e divertida paródia, na pele do também detective Fearless Fosdick, personagem de uma outra série famosa, "Li'l Abner", criada por Al Capp em 1934.
Graças às suas características originais, Dick Tracy, que em Portugal foi publicado principalmnete pelo Mundo de Aventuras, mas também no suplemento Quadradinhos de A Capital e no Lobo Mau, rapidamente granjeou uma forte popularidade, o que levou a que fosse transposto para um folhetim radiofónico, entre 1934 e 1948, e para o cinema, logo em 1937, quando estreou o primeiro de diversos filmes protagonizados por Ralph Byrd que assumiria a pele do detective até falecer, em 1952. Seria no entanto esperar até 1990, durante a primeira onda de adaptações de BD para a 7ª arte, para encontrar a mais fiel versão de celulóide da obra de Gould, num filme da Disney, realizado e interpretado por Warren Beaty, que contava ainda com Madonna, Al Pacino e Dustin Hoffman nos principais papéis.
As bodas de diamante de "Dick Tracy", há cinco anos, foram assinaladas nos Estados Unidos com a edição do primeiro volume de “The Complete Chester Gould’s Dick Tracy”, pela IDW Publishing, que entretanto já editou mais 11 tomos, estando o 12º já anunciado. 





(Versão revista e actualizada do texto publicado no Jornal de Notícias 4 de Outubro de 2006)

03/10/2011

Dylan Dog, 25 anos

Há 25 anos, chegava ao fim o mês de Setembro, aparecia nas bancas italianas uma nova revista de BD, editada pela Sergio Bonelli Editore. Mais uma aposta na banda desenhada popular de qualidade, estreava um novo herói, Dylan Dog, que dava nome à publicação que vinha fazer companhia a títulos de sucesso como Tex, Zagor ou Martin Mystère.
Intitulado “detective do pesadelo” ou do “impossível”, distinguia-se por (tentar) solucionar casos em que imperava o fantástico e o paranormal, numa hábil combinação entre o tom policial tradicional, com muito mistério e acção, e o terror, sendo por isso comum a aparição de fantasmas, monstros, lobisomens, mortos-vivos, assombrações, extraterrestres e o mais que se possa imaginar, a própria Morte incluída.
Como condi-mentos extra, trazia um toque de erotismo – como qualquer bom detective, Dylan Dog relaciona-se intima-mente com (quase) todas as suas belas e sensuais clientes – e um irresistível non-sense, fruto das tiradas do detective e, em especial, da actuação do seu ajudante, Groucho, cara chapada do irmão Marx homónimo, tagarela insuportável que se distingue por lançar uma pistola a Dylan nas situações mais aflitivas, mesmo quando aparentemente se encontra longe.
O seu criador foi Tiziano Sclavi, que o dotou de argumentos bem escritos, inteligentes e atractivos, com múltiplas referências à literatura, ao cinema, à pintura e à própria BD, ficando a imagem gráfica a cargo de Claudio Villa que o criou à imagem e semelhança do actor inglês Rupert Everett. Angelo Stano, Gustavo Trigo, Montanari e Grassani e Corrado Roi foram os primeiros desenhadores da série, por onde já passaram alguns dos grandes nomes dos quadradinhos italianos.
Filho de Morgana e de Xabaras, um alter ego de Abraxas, o seu maior inimigo, Dylan Dog é vegetariano, ex-alcoólico e ex-inspector da Scotland Yard e mora no nº 7 de Craven Road, cuja campainha grita em vez de tocar. Amante do clarinete, que toca em busca de inspiração para resolver os mistérios que se lhe deparam ao mesmo tempo que constrói um galeão em miniatura, sempre incompleto, o novo heróis dos fumetti (BD italiana) sofria de claustrofobia, não se dando igualmente bem com morcegos ou alturas, o que não impediu que granjeasse um enorme sucesso, tendo chegado a vender mensalmente mais de um milhão de exemplares, entre novidades e reedições, e chegando mesmo a superar Tex, o sustentáculo do impérios aos quadradinhos Bonelli.
A par disso, saltando para lá do papel, deu nome ao Dylan Dog Horror Festival, uma mostra de cinema fantástico onde apareciam muitos “clones” seus, trajados a rigor com camisa vermelha, casaco preto e calças de ganga azuis. Ainda no cinema, há poucas semanas estreou entre nós “Dylan Dog: Guardião da Noite”, uma película infeliz e falha de inspiração, dirigida por Kevin Monroe e protagonizada por Brandon Routh.
O detective marcou presença nas bancas portuguesas através das revistas das editoras brasileiras que o publicaram, a última das quais, a Mythos distribuiu em Portugal os 40 números que editou, o último dos quais distribuído no final de 2007.
Em Itália os 25 anos ficam assinalados pela publicação de Dylan Dog #300, a cores como é timbre da editora para os números centenários, numa história escrita por Pasquale Ruju e desenhada por Angelo Stano, que mostra um dos seus possíveis futuros.







02/10/2011

Selos & Quadradinhos (65)

Stamps & Comics / Timbres & BD (65)

Tema/subject/sujet: As viagens de Tintin / Tintin’s travels / Les voyages de Tintin
País/country/pays: França / France
Data de Emissão/Date of issue/date d'émission: 2007

01/10/2011

As Figuras do Pedro (IX)

Tintin

Figura: Tintin
Colecção: Tintin, Haddock et la Licorne
Ano : 2011
Altura : 7 cm
Material: resina
Preço: 1,99 €
Proveniência: oferta com o primeiro fascículo da colecção francesa Tintin, Haddock et la Licorne.

Mês Tintin

Este vai ser um mês dedicado a Tintin aqui, nas minhas leituras.
Porque há muito que a obra de Hergé é uma referência incon-tornável para mim, seria justificação suficiente, mas, no caso presente, também devido à estreia, no final de Outubro, do (tão esperado) filme de Steven Spielberg e Peter Jackson - sobre o qual, confesso, tenho ainda reservas -, o que mediatizará (mais uma vez) o “repórter que nunca escreveu uma linha”.
Por isso, os espaços que regularmente dedico a figuras e selos e também alguns dos outros textos abordarão diversas facetas de Tintin, Haddock, Milu e os outros, sem que isso implique, de forma alguma, que outras leituras e a actualidade deixem de marcar presença, no ritmo diário a que As Leituras do Pedro já habituaram os visitantes deste blog.
Assim, este mês, o meu voto é: boas leituras… especialmente de Tintin!

30/09/2011

As Melhores Leituras

Setembro de 2011

 Agencia de viajes Lemming (Astiberri), de José Carlos Fernandes

É de noite que faço as perguntas (Saída de Emergência), de David Soares (argumento), Jorge Coelho, João Maio Pinto, André Coelho, Daniel da Silva e Richard Câmara (desenho)

Kick Ass – integral (Norma Editorial), de Mark Millar (argumento) e John Romita Jr. (desenho)

J. Kendall – Aventuras de uma criminóloga #76 – A históriade Jason (Mythos Editora), de Giancarlo Berardi e Lorenzo Calza (argumento) e Ivan Calcaterra e Antonio Marinetti (desenho)

Le policier quirit (Casterman), de Roger Seiter (argumento) e Martin Viot (desenho)

Lucky Luke - Na pista dos Dalton (ASA), de René Goscinny (argumento) e Morris (desenho)

Une nuit de pleine lune (Glénat), de Yves H. (argumento) e Hermann (desenho)

Poulet aux prunnes (L’Association), de Marjane Satrapi

Sept personnages (Delcourt), de Fred Duval (argumento) e Florento Calvez (desenho)

29/09/2011

Le policier qui rit

Colecção: Rivages/Casterman/Noir
Roger Seiter (argumento, a partir do romance de Maj Sjöwall & Per Wahlöö)
Martin Viot (desenho)
Casterman (França, 21 de Setembro de 2011)
185 x 260 mm, 88 p., cor, brochado com badanas
18,00 €

Resumo
Estocolmo, 1967. Um massacre num autocarro, em que foram mortos o condutor e todos os seus passageiros, leva a polícia sueca a investigar o caso, até porque uma das vítimas era um dos seus inspectores…

Desenvolvimento
Esta banda desenhada, na sequência do que sucede com esta colecção, é uma adaptação do romance policial homónimo escrito nos anos 60 pelo casal Maj Sjöwall & Per Wahlöö. Quarto tomo dos dez protagonizados pelo inspector Martin Beck e a sua equipa, entre 1965 e 1975, nele encontramos a polícia sueca empenhada em prender o responsável pelo sucedido.
Se aparentemente nada justifica o acto tresloucado, nada foi roubado nem há qualquer ligação entre as vítimas, a presença de um detective no veículo causa estranheza, até porque ele deveria estar de férias embora a mulher afirme que raramente vinha a casa por se encontrar cheio de trabalho. Aos poucos, de forma lenta mas decidida, minuciosa e obstinada, com alguns avanços e muitos recuos, Beck vai desfiando a meada, com alguns resultados surpreendentes.
O traço de Martin Riot, algo rígido, demasiado preso a modelos (especialmente para os rostos), um pouco naif, revela-se pouco dinâmico e quase desprovido de movimento, o que acaba por o transformar no complemento adequado para o ritmo lento da narrativa, que acompanha os pequenos avanços e as contrariedades do dia-a-dia e é reflexo de uma época – há 40 anos – sem computadores, telemóveis e outros artefactos hoje essenciais no nosso quotidiano.
A par disso, face à imensa diversidade de séries televisivas, com a chancela CSI à cabeça, resulta estranha a lentidão de processos, a dificuldade em conseguir cópias, o estado primitivo da ciência forense na época, que perpassa por todo o romance (desenhado).
O que não retira interesse à história, bem pensada e desenvolvida, dentro da lógica do romance policial tradicional, com o leitor a acompanhar de perto os passos dos investigadores, descobrindo, ao mesmo tempo que eles, as pistas que vão conduzir a um final bem diverso daquele que o início parecia apontar.
O que faz da versão em BD de “Le policier qui rit”, uma obra especialmente atractiva para os apreciadores do género, mas com motivos suficientes para agradar a outros leitores, até pelo retrato que traça da sociedade sueca de então.

A reter
- O ritmo lento mas intenso do relato.
- O retrato da sociedade sueca dos anos 60.

Pré-publicação
- As primeiras páginas do álbum.

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