13 anos depois, Laudo Ferreira (com Omar Viñole) conclui a
tarefa (hercúlea) a que se propôs: contar em quadr(ad)inhos uma versão
humanizada da vida de Jesus Cristo.
O resultado, lido já a seguir.
Antes de entrar propriamente na obra, não posso deixar de
lembrar que Laudo Ferreira é um dos autores convidados do X Festival Internacional de BD de Beja, pelo que estará naquela cidade alentejana no
próximo fim-de-semana – 31 de Maio e 1 de Junho – (também) para apresentar esta obra.
Onde tudo está,
tomo final da trilogia que inclui também Assim em cima assim embaixo e O círculo interno o círculo externo, aborda as últimas semanas da vida de Jesus,
nomeadamente a morte do seu pai, a ressurreição de Lázaro, a entrada triunfal
em Jerusalém e a sua prisão, condenação, crucificação e ressurreição.
Fá-lo, mais uma vez, com recurso a uma planificação muito
dinâmica e diversificada, onde se espraia a arte pormenorizada de Laudo e
Viñole que explode recorrentemente em grandes planos de uma enorme
expressividade que ajudam a pautar o ritmo narrativo e a marcar os momentos de
maior tensão.
Versão pessoal, que combina ficção, base bíblica, tradição e
informação recolhida em diversas fontes, mostra especialmente um homem (ou um
Deus?) consciente do peso da missão que tem a desempenhar. Peso que se torna
tão maior, quanto mais parece que todos os que o rodeiam não conseguem perceber
o alcance e a dimensão das suas palavras e dos seus actos.
Isso, faz de Yeshuah (ou Jesus) alguém sozinho e isolado –
quase abandonado – mesmo entre os seus amigos ou no meio de grandes multidões.
Mais próximos dele surgem Miriam (Maria) – com um papel
marcante e fundamental em todo o relato – e, surpreendentemente – ou talvez
não… - Yehudah ish Kirioth (Judas Iscariotes). Este último, arrisco-me a
escrevê-lo, embora dividido quanto à sua própria interpretação das palavras do
Messias, é quem melhor entende a sua missão e, mais do que isso, quem
claramente vê como a incompreensão e a dúvida – provocadas pelo desejo de O
adaptar à vontade própria de cada um em vez de se abrirem a Ele - magoa Yeshuah. É, aliás, por isso, que tenta
intermediar um encontro entre Ele e os chefes religiosos judeus, que estes
acabarão por transformar numa armadilha para Yeshuah. Laudo, afasta, assim,
Yehudah/Judas do papel de traidor consciente que é apresentado na Bíblia,
tornando-o mero peão e (também) vítima de algo maior que (também) ele não
entendeu totalmente.
Apesar do propósito de humanização ser a base em que Laudo
trabalhou todos estes anos, pela forma aberta como conta a história e pelas
diversas pistas que fornece à interpretação dos leitores, a par do rigor que –
notoriamente - presidiu ao seu trabalho, a trilogia Yeshuah pode – e deve – ser
lida (mesmo) por aqueles que têm convicções profundas – e não falo dos que seguem
meras tradições – porque mesmo discordando – naturalmente - de algumas passagens
do livro, poderão descobrir uma outra dimensão para as suas crenças.
Laudo Ferreira (argumento e desenho)
Omar Viñole (arte-final)
Devir
Brasil, Maio de 2014
165 x 240 mm, 240 p., pb
brochada, R$ 30,00
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