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08/10/2012

La dernière femme


 

 

 
 

 

Colecção écritures
Charles Masson
Casterman (França, Agosto de 2012)
170 x 240 mm, 176 p., pb, brochado com badanas
14,00 €

 

Este livro deixou-me uma sensação estranha. Apesar da leitura envolvente e bem disposta, passei o volume todo à espera do golpe de asa, da surpresa, do toque de génio. Que não aconteceu.
Assente num magnífico traço semi-caricatural, vivo e agradável, tingido com manchas de cinzento que definem volumes e ambientes, escrito com desenvoltura, algum humor, um toque erótico e um ritmo quase frenético, La dernière femme leva o leitor à boleia de Albert, na recordação das suas conquistas amorosas e das suas proezas sexuais - dos seus fracassos e separações dolorasas também - mais de duas dezenas de mulheres, mais exactamente, uma para cada letra do alfabeto, de A a Y, de Annie a Yolaine. Mas, apesar de tudo - apesar de todas - continua solteiro, solitário, com tendência para a melancolia e a auto-depreciação.
Uma vida inteira movida pela paixão pelo belo sexo, na procura deste mas também de relações mais ou menos estáveis e numa busca interior de si mesmo, sem nunca conseguir encontrar(-se verdadeiramente e à) sua “cara metade”.
A seu lado (estamos nós e) está Al, um jovem que viaja à boleia, que Albert recolhe como ouvinte privilegiado e confidente inesperado e com quem irá irá descobrir uma identificação quase total e intrigante – ou talvez não como o leitor acabará por (intuir ou) descortinar.
No final, qual sessão de psiquiatria concluída, após virar a última página deste road-movie existencial que questiona o mais interior do ser humano, sobra a tal sensação de copo meio cheio - ou vazio…

10/04/2012

Un americain en balade











Colecção écritures
Craig Thompson
Casterman (França, Janeiro de 2005)
170 x 240 mm, 224 p., pb, brochada com badanas
13,50 €




Às vezes é difícil escrever estas linhas. Especialmente se são sobre livros de que gostei muito. Talvez porque (mais ou menos) inconscientemente, sinto a obrigação de escrever “ao nível” do que li, para transmitir um pouco do que desfrutei, para convencer o (meu) leitor a lê-lo também.
Só que nem sempre a sofisticação da escrita parece suficiente para isso. Por isso, “Un americain en balade” (Casterman), esperou semanas pela minha inspiração. Quando a solução talvez pudesse ser simples: tão simples como é a escrita (em BD, entenda-se) de Craig Thompson, de uma limpidez e sinceridade desconcertantes, de um despojamento sem máscaras nem artifícios, na forma como se despe completamente perante os leitores, revelando gostos, influências, estados de espírito, desejos, ambições, medos e incertezas, o que de mais profundo há em si.
O que faz desta obra do autor canadiano, que já nos deslumbrara com o notável e emotivo “Blankets” (Casterman), mais do que o diário de uma viagem de dois meses à Europa e a Marrocos, um diário íntimo, escrito/desenhado maioritariamente em quartos de hotel, já que o autor se confessa um mau viajante e pouco dado à convivência e ao contacto com os outros.
Uma obra a ler, devagar, aos poucos, ao ritmo da própria criação de Thonmpson, para melhor a desfrutar. ´

(Texto publicado originalmente no Jornal de Notícias de 19 de Junho de 2005)

Curiosidade
Este é mais um tomo da colecção écrittures, já diversas vezes presente em As Leituras do Pedro, que completou 1o anos de bons serviços no passado dia 14 de Março. Conto voltar a ela, repetidamente, nas próximas semanas.



30/03/2012

Mariko Parade





 



Colecção écritures
Frédéric Boilet e  Kan Takahama (argumento e desenho)
Casterman (França, 12 de Setembro de 2003)
173 x 240 mm, 184, pb e cor (12 p.), brochada com badanas
13,50 €




De que são feitas as relações? O que as alimenta? O que as mantém? O que as mina? O que as destrói?
“Mariko Parade”, de Frédéric Boilet e Kan Takahama, responde a estas perguntas. Ou melhor, indica pistas, adianta hipóteses. Boas ou más, depende de quem as lê e de como as interpreta.
Porque o livro, diga-se desde já, assume-o Takahama no prefácio, não conta nada, não tem princípio, meio e fim. Ou melhor, tem meio, pois apanhámos a história em andamento e somos apeados antes que ela acabe.
Por isso, também, “Mariko Parade” é um livro estranho. E também pela forma como são encadeadas na sua narrativa principal, as histórias curtas que Boilet foi publicando no Japão ao longo dos anos, como se assim tivessem sido concebidas.
Obra de contornos autobiográficos, conta a relação de um autor de BD (Boilet, francês, radicado no Japão há alguns anos) com a sua modelo (e companheira, Mariko) vinte anos mais nova. E conta-nos como esta, no seguimento de uns dias de férias anuncia que vai partir para os Estados Unidos, para estudar durante dois anos. Que vai partir no dia seguinte.
E o “nada” que nos é contado, são esses dias de férias. Calmos sossegados, aparentemente apaixonados às vezes, vazios outras. Um “nada” realçado pela forma lenta como a história flui. Lentidão consciente, que é acentuada pelos inúmeros pormenores que são objectos de vinhetas. Como um anúncio num jornal, uma folha, uma flor, um pé, descalço ou calçado, uma nuvem.
Tudo “nadas”, pequenos nadas, que às vezes se tornam tão importantes. Como os pequenos nadas que (também) mantêm as relações, embora possam parecer insignificantes. 

(Texto publicado no Jornal de Notícias de 18 de Outubro de 2003)


Curiosidade
- Este é mais um tomo da colecção écritures, já diversas vezes presente aqui As Leituras do Pedro, que completou 10 anos de bons serviços no passado dia 14 de Março. Conto voltar a ela, repetidamente, nas próximas semanas.


21/03/2012

L'Orme du Caucase













Colecção écritures
R. Utsumi (argumento)
Jirô Taniguchi (desenho)
Casterman, França, Junho de 2004)
173 x 240 mm, 224 p., pb, brochada com badanas
13,50 €




Pedaços de vidas.
Pedaços de vidas aos pedaços, feitas assim pelos acasos, pelo destino ou pela vontade de quem as viveu ou compartilhou.
Vidas aparentemente desfeitas, destruídas, sem rumo nem fim. Mas tornadas novas vidas, com sentido e objectivos, reconstruídas do (aparente) nada pelo (re)encontro com (outros) seres humanos. Pela (re)descoberta do amor, da amizade, do companheirismo. Pela percepção do que correu mal e, agora, há-de correr melhor. Porque - quando? - as provações fortalecem e preparam para viver. Outra vez.
É disto que nos fala L'Orme du Caucase, uma recolha de contos de R. Utsumi, magistralmente adaptados a banda desenhada pelo traço suave, fino e delicado de Jirô Taniguchi, um dos autores recorrentes nesta coluna, que em cada nova obra surpreende pela sua capacidade de falar de forma simples, mas chamativa e tocante - gentil, definiu alguém - das coisas simples da vida.
Seja o relato do respeito por um olmo imponente ou o da descoberta do amor na 3ª idade. Ou de reencontros após longas separações, entre irmãos ou pais e filhos ou até entre uma sogra e uma nora que quase não se conheceram.
Pela forma admirável como os rostos das suas personagens, extremamente expressivos, nos transmitem os seus sentimentos e emoções, quantas vezes contidos. Ou ainda pelas suas belas pranchas, composições a preto e branco, que os nossos olhos sonham em mil cores, em especial quando a natureza invade as imagens e nos faz ansiar pela fuga aos espaços (só aparentemente humanos, afinal opressivos) das grandes cidades.


(Texto publicado originalmente no Jornal de Notícias de 17 de Julho de 2004)

Curiosidade
- Este é mais um tomo da colecção écritures, já diversas vezes presente aqui As Leituras do Pedro, que este mês completa 10 anos de bons serviços. Conto voltar a ela, repetidamente, nas próximas semanas.
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