Myrto Reiss e Sylvain Ricard (argumento)
Daniel Casanave (desenho)
Futuropolis
França, Abril de 2013
195 x 265 mm, 192 p., bicromia, cartonado
24,00 €
Resumo
Esta é uma adaptação do romance homónimo autobiográfico de
Chrònios Mìssios, comunista grego que, desde a adolescência, passou grande
parte da sua vida na prisão.
Desenvolvimento
Se em tempos a banda desenhada procurou a adaptação de obras
literárias como forma de credibilização
e para ganhar estatuto, hoje fá-lo – de novo – mas agora como afirmação dessa
mesma credibilidade e desse estatuto entretanto conquistado.
Por isso, quando há 50, 60, 70 anos recorria especialmente
aos romances de aventuras – nalguns casos com assinalável qualidade, como
aconteceu entre nós com Fernando Bento, por exemplo – hoje permite-se uma
selecção (muito) mais vasta e abrangente que, frequentemente, vai à procura – e
também ao encontro… - de outros leitores que não as crianças/adolescentes que
então tinha como público-alvo.
Por isso, mesmo que em muitos casos haja um “retorno às
origens” - recriando aos quadradinhos Verne, Stevenson e outros romancistas
juvenis – também recorre a adaptações policiais ("Le policier qui rit", ...), romances de sucesso
("Millenium", …) ou obras menos óbvias, autobiográficas e/ou política ou
ideologicamente engajadas, como é o caso deste “Toi au moins, tu est mort
avant.”
Nascido em 1930 e falecido em Novembro de 2012 - sem ter
chegado a ver esta banda desenhada - Chrònios Mìssios foi apanhado pelo
turbilhão que se instalou na Grécia após a Segunda Guerra Mundial e a arrastou
para uma guerra civil, tendo-se tornado comunista e sofrido – na pele e não só –
por essa decisão.
História de (uma) vida atribulada e sofrida pela decisão de,
antes de tudo, se manter fiel ao ideal que abraçou, este romance desenhado é um
retrato duro do dia-a-dia nas várias prisões por onde Mìssios foi passando ao
longo de mais de duas décadas e onde sofreu tortura física e psicológica,
isolamento e violência, falsas promessas e aliciamentos vários. E que o traço
semi-caricatural utilizado para a traçar faz surgir aos olhos do leitor com
redobrada força pelo contraste que provoca.
A solidariedade com os camaradas – nem sempre correspondida,
por vezes traída – a perda da primeira mulher que amou, o afastamento da mãe -
a única família que lhe sobrava – são outros momentos dolorosos que ajudam a compor
o retrato de uma forma de vida, que hoje, a muitos, pode soar estranha, mas que
nos deve fazer reflectir, pois esteve longe de ser caso único na Grécia, na
Europa – Portugal incluído – há não tanto tempo assim.
A reter
- A capacidade que os autores tiveram de transpor para um
registo diferente do original, todos os sentimentos e emoções inerentes a um relato
deste tipo.
- A afirmação da banda desenhada – mais uma vez, não que
houvesse necessidade – como arte narrativa maior, seja qual for a temática que
aborde.
- A qualidade das edições da Futuropolis, na linha de uma
(já) longa tradição. Manusear livros como este – capa dura, papel encorpado, bem
impresso, bom design, pesado… - é um verdadeiro prazer.
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