Há poucas semanas alguém questionava de forma crítica a
heterogeneidade das propostas deste blog - e consequentemente das minhas
leituras - perguntando como era possível coexistirem, por exemplo na lista dos
melhores títulos de um dado mês,
criações Bonelli, a Turma da Mônica, clássicos franco-belgas, heróis Disney,
super-heróis ou, deixem-me escrever assim, banda desenhada adulta.
A resposta para mim é simples: todas essas leituras me dão
prazer. De forma diferente, evidentemente, tal como diferente é o prazer que
podemos experimentar ao comer uma torrada com manteiga, uma francesinha ou de
um prato gourmet num restaurante de luxo. Cada um destes apela a distintos
aspectos do nosso palato, da mesma forma que bandas desenhadas daqueles
diversos géneros apelam a distintas partes do meu intelecto.
Deixo mais um exemplo, já a seguir.
E esse exemplo vem da Comix Record que, entre histórias curiosas
– a mais pequena do mundo em dimensão das vinhetas, a primeira BD muda ou outra
com vinhetas completamente negras, experiências inovadoras em termos de
quadradinhos Disney mas já recorrentes noutros géneros… - inclui igualmente uma
pequena grande pérola.
São 50 pranchas intituladas O rio do tempo, escritas por Francesco Artibani e (não por acaso?) por Tito Faraci, habitual
argumentista Bonelli, que faz uma bela viagem ao passado evocando Steamboat Willie,
a animação em que Mickey nasceu oficialmente (e que eu aconselho a visualizarem antes de lerem esta história).
Nesta BD, criada 70 anos mais tarde, Mickey e Bafo de Onça reencontram-se
- e também ao pequeno barco a vapor – numa aventura bem planificada com alguns
efeitos bem conseguidos, que vai alternando entre o presente e o passado e
explorando as razões para o distanciamento e as diferentes opções de vida
tomadas por um e outro. Estranhamente violenta para os padrões Disney actuais,
está desenhada de forma muito dinâmica e com mestria pelo grande Conrado Mastantuono, tendo diálogos certeiros e um argumento bem condimentada com aventura, humor,
suspense, nostalgia e uma (enorme) surpresa final.
Esta primeira sugestão de leitura do ano – se surge desde
logo pela sua qualidade intrínseca e pelo prazer que me proporcionou lê-la –
fica também com uma (pequena) provocação e como um desafio a todos que por aqui
passam para que, em 2014, se atrevam a descobrir outras bandas desenhadas –
aquelas de que normalmente desdenham… - para usufruírem diferentes prazeres.
Um bom ano (de descobertas) para todos!
O Rio do Tempo
In Comix Record
Tito Faraci e Francesco Artibani (argumento)
Corrado mastantuono (desenho)
Goody
Portugal, Dezembro 2013
135 x 190 mm, 132 p., cor, brochada
Edição promocional*
* A Comix Record – cujo melhor
papel e capa mais consistente do que a das edições semanais da Comix merecem
ser destacados – é uma edição promocional que não está à venda.
Pode ser obtida
mediante o registo num site onde devem ser inscritos seis dos códigos
publicados na Comix desde o seu número 44.
Com uma tiragem de (apenas?)
3000 exemplares, arrisca-se a tornar-se um alvo apetecível para coleccionadores.
Sem comentários:
Enviar um comentário