Alguém
questionava recentemente a (quase) obsessão franco-belga pela retoma
das suas séries mais carismáticas - Spirou à cabeça, claro, mas
também
Blake & Mortimer, Astérix, Corto Maltese, Lucky
Luke
e um largo etc. - e dava como primeira resposta - sem questionar a
invejável qualidade de algumas dessas retomas - o dinheiro que cada
uma delas rende - às editoras e aos autores.
Amertume
Apache - com lançamento a preto e branco na próxima sexta-feira e e a cores a 6 de Dezembro - é mais um um exemplo - um dos cada vez mais numerosos exemplos - por
ter como protagonista um certo tenente Blueberry. ‘O’ tenente
Blueberry em que todos estamos a pensar? A resposta - difícil de dar
- variará de leitor para leitor…
...que
de certeza serão muitos e garantirão muito do tal dinheiro.
Comecemos pelo lado gráfico, o primeiro que é possível apreciar. Sfar e Blain são dois dos autores daquilo a que poderíamos genericamente chamar a ‘geração l’Association’. Autores que privilegiam a liberdade temática e narrativa - fugindo do espartilho das 48/64 páginas e do formato franco-belga - e que colocavam à frente do desenho a sua urgência narrativa.
Comecemos pelo lado gráfico, o primeiro que é possível apreciar. Sfar e Blain são dois dos autores daquilo a que poderíamos genericamente chamar a ‘geração l’Association’. Autores que privilegiam a liberdade temática e narrativa - fugindo do espartilho das 48/64 páginas e do formato franco-belga - e que colocavam à frente do desenho a sua urgência narrativa.
O
que não significa que estes dois em particular - e alguns mais
- sejam graficamente maus, apenas fogem
aos canônes da produção franco-belga. O que lhes garantia uma
cadência de produção absurdamente rápida, traduzida em vários
álbuns por ano.
Escrito
isto, fica já esclarecido que os que forem procurar em Amertume
Apache
o apuro técnico e o soberbo traço realista de Jean Giraud, vão ter
uma profunda desilusão. Por isso - com exceção do beberrão Jimmy
McClure - desistam de tentar identificar quem quer que seja. O que
não é sinónimo de falta de qualidade gráfica de Blain que,
assente no seu traço característico, simples, despojado e numa boa
planificação, em que os enquadramentos vão mudando segundo as
necessidades de ritmo e narrativas, para trazer até ao leitor o mais
possível, nos
oferece um sólido suporte narrativo.
Outra
diferença fundamental entre o Blueberry original de Charlier e
Giraud e este, de Sfar e Blain, é a diferença de ritmo. Charlier
narrava a um ritmo vertiginoso, contando numa ou duas páginas o que
para outros daria quase para meio álbum. Amertume
Apache
tem um ritmo lento - até quando se trata de tiroteios - que dá ao
leitor tempo para interiorizar tudo o que decorre perante os seus
olhos e
integrá-lo numa paisagem, quase sempre selvagem, mas de
representação contida.
Finalmente
- e talvez devesse ter começado por aqui… - falemos do
protagonista. O Mike Blueberry deste álbum
continua a ser (pouco) um militar, avesso a ordens, rotinas e
hierarquias e continua também a privilegiar o diálogo com
os índios,
recorrendo à força e às armas apenas em caso de extrema
necessidade. Mas… mesmo para ele,surge demasiado indolente,
demasiado desligado, demasiado distante do protagonismo a que é
obrigado e
mesmo com algumas escolhas que o afastam do Mike Blueberry que nós
(re)conhecemos. Pelo
que, se o protagonista não se apresentasse como o tenente Mike
Blueberry, mas tivesse um outro nome qualquer, a narrativa em si não
perdia nada - para além do (financeiramente agradável) efeito
mediático.
Posto
tudo isto, estamos
então perante um mau álbum de BD? Não, de forma nenhuma. Amertume
Apache
é uma história que prende, que nasceu com uma base - duas mulheres
índias mortas (mais ou menos) acidentalmente na sequência de uma
tentativa de violação por um (de três) jovens brancos - e que, na
boa linha de l’Association, ganha vida própria, cresce e começa a
incorporar outros argumentos: a vontade de Blueberry de deixar o
exército, uma comunidade com regras próprias que vive à parte do
exército e dos índios, a paixão (correspondida…) da mulher do
oficial que comanda o destacamento de Blueberry por este último, um
crescendo da violência entre índios e brancos e vice-versa… num
crescendo que se desenrola como o fio de uma meada que
parece interminável e
que faz com que cheguemos à última página sem respostas e fiquemos
pendurados da sua continuação.
O
que, conhecendo Sfar e Blain, tanto pode ser muito em breve, se se
dedicarem de imediato ao segundo tomo, como daqui a muito tempo, se
entretanto se dispersarem por (muitos) outros projectos!
Amertume Apache, tome I
Une aventure du Lieutenant
Blueberry
Joann Sfar e argumento)
Christophe Blain (desenho)
Dargaud
Edição a preto e branco
França, 22 de Novembro de 2019
240 x 320 mm, 64 p., pb, capa dura
EAN 9782205083798
19,99 €
Edição a cores
França, 6 de Dezembro de 2019
240 x 320 mm, 64 p., cor, capa dura
EAN 9782205077988
14,99 €
(imagens disponibilizadas pela
editora; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)
muito curioso com este album..será que será editado por Portugal..?
ResponderEliminarEmbora me pareça pouco provável, no actual momento editorial acho que tudo é possível!
EliminarBoas leituras!
é mesmo! estou também indeciso se compro o fora de coleção pelo Schuiten do B&M..
EliminarVasco, quando o B&M do Schuiten saiu em França, a ASA adiantou a hipótese de o lançar em português no final do primeiro trimestre de 2020...
EliminarBoas leituras!
Diria que é quase certo que será editado em Portugal, dado o interesse de várias editoras, e como já se viu com "O Homem que Matou Lucky Luke", a ASA já não consegue garantir que outros não editam caso não queira ela editar.
EliminarTalvez compre.
ResponderEliminarMas a preto e branco é intragável, a cor fica menos indigesta, atenua o desenho mal feitinho para quem estava habituado a Giraud.
Não é Giraud, de todo, mas também não acho que o preto e branco seja assim tão mau...
EliminarBoas leituras!
O desenho parece-me excelente. Para lá do Giraud nenhum dos desenhadores que se seguiram conseguiu a expressividade das personagens e o traço dinâmico que vemos nesta amostra.
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