Iniciada entre nós pela Vitamina BD há mais de uma década e continuada agora pela Ala dos Livros, a série Mattéo revisita alguns dos momentos mais
marcantes da História do século XX.
Fá-lo, não do ponto de vista dos eruditos ou
dos compêndios do género, privilegiando antes a ‘pequena’
História, aquela que foi vivida no local por tantos (meros)
figurantes anónimos - mas sem os quais nada do que conhecemos hoje
teria tido lugar.
Na Primeira
Época (1914-1915) revive a guerras
das trincheiras, enquanto que na Segunda
Época (1917-1918) se acerca da
revolução soviética.
O protagonista dos álbuns é quem dá título
à série, Mattéo, um espanhol cujos pais se refugiaram em França,
anarquista convicto e peão ou joguete nas mãos daqueles - ou mais
exactamente, daquelas - com quem se relaciona. A mãe, primeiramente,
severa e (falsamente) indiferente; a bela Juliette, sua paixão de
juventude - e de toda a vida… - por quem sacrifica a sua pacífica
existência quotidiana na sua pequena aldeia para se alistar no
exército francês; Léa, a revolucionária russa que brinca - a
vários níveis… - com o ‘seu francesinho’…
Através dele, vivendo os seus dramas e inseguranças, apaixonados
pelas belas e doces mulheres em que Gibrat é mestre, sentindo quase
como nossos as suas paixões, os seus desencantos, os seus sonhos e
os seus fracassos, vamos começar por vivenciar o horror das
trincheiras, uma guerra absurda que tantos mortos causou, que tantos
estropiados deixou, entre conhecidos e amigos de Mattéo - porque os
números só importam quando o seu gigantismo se torna real ao
assumir a pequenez que nos toca.
Depois, partimos para a Rússia em convulsão,
com anarquistas, bolcheviques e outros mais, mudando de campo
conforme as situações, sempre em luta pelo poder. E com as baixas,
as vítimas anónimas mais uma vez a ganharem rostos e nomes…
De um e outro livro, de uma e outra época, da
França em guerra à Rússia em revolução, fica em comum a
utilização indiscriminada dos mais pobres, dos mais desgraçados,
dos mais desfavorecidos, como carne para canhão, como carvão para a
máquina imparável da História que, depois de os trucidar, os
devolve em pior estado, em piores condições, para uma miséria
maior.
Mas, desta forma, graças
a Gibrat, ao seu talento de narrador de dramas humanos, ao seu traço
virtuoso, essa História, sem o
protagonismo das grandes figuras heróicas, sem a sua aura
inatingível, assume um cariz mais humano, mais próximo de nós,
mais ao alcance da nossa mão.
Mattéo
Primeira Época (1914-1915)
Segunda Época (1917-1918)
Jean-Pierre Gibrat
Vitamina BD
Portugal, 2009/2011
245 x 315 mm, 64/80 p., cor, capa dura
(capas
retiradas da base de dados Álbuns de BD ; pranchas (em francês) disponibilizadas pela editora Futuropolis;
clicar nas
imagens para
as aproveitar em toda a sua extensão)
Não faz lembrar um pouco o Luís Ma Sorte em termos de percurso?
ResponderEliminarÉ verdade que em termos históricos têm pontos comuns, mas as semelhanças ficam-se por aí, quer no tipo de abordagem, quer na arte.
EliminarBoas leituras... caseiras!
a titulo de curiosidade quem ler o livro 3 lançado pela Ala dos Livros não vai ficar perdido ou à toa por não ter lido estes 2 livros da VitaminaBD? ou cada livro acaba por ser uma historia fechada? É que estes 2 livros não são propriamente fáceis de se arranjar para comprar mesmo no mercado de usados.
ResponderEliminar(Ainda) não sei responder a essa questão, mas conto esclarecê-la quando escrever aqui sobre a Terceira Época de Mattéo, o que deverá acontecer durante a próxima semana...
EliminarMas posso dizer que comprei o volume dois, barato, há poucas semanas na Promobooks.
Boas leituras... caseiras!
Os 2 primeiros volumes ainda se conseguem/iam arranjar, com sorte, em alguns pontos de venda dos chamados "fundos de catálogo" (em Lisboa). No entanto, não deixa de ser uma opção editorial altamente questionável "recomeçar" uma série já descatalogada à mais de uma década. Será que a Ala dos Livros conta apenas com aqueles que, na época adquiriram os 2 primeiros volumes? Estará nos planos da Ala "repõr" os 2 primeiros volumes, dependendo do resultado de vendas? Qual a lógica editorial deste lançamento? Demasiadas questões nestes tempos de incertezas...
ResponderEliminarSim, os dois primeiros ainda se encontram com alguma facilidade.
EliminarPossivelmente, dada a diferença de tiragens - que acredito que existe - entre ambas as edições, os que compraram os dois primeiros, serão suficientes para garantir a viabilidade desta edição. Acredito, no entanto, que numa situação normal a Ala dos Livros acabaria por reeditar os volumes iniciais.
Boas leituras... caseiras!