Conhecendo já Victor Santos de relatos policiais de tom negro e violência a rodos, em que o grafismo, inevitavelmente, embora com todas as diferenças óbvias, evoca o de Frank Miller em Sin City, avancei para este Intachable ancorado em certezas que - para o bem e para o mal - se revelaram infundadas, com o que eu dava como certo a sair (mais ou menos) gorado num relato sobre o compadrio, as relações esconsas e a corrupção activa, existentes entre a política e o sector da construção. Em Espanha, no caso, como poderia ser em Portugal - ou, certamente, em diversas outras latitudes e/ou longitudes.
A
primeira constatação foi a existência de longos textos, algo
pesados,
geralmente os pensamentos em off do protagonista - e narrador - que
imprimem um ritmo lento e pausado à narrativa, quando Santos até
aqui se tinha distinguido - aos meus olhos - pela forma ágil e
dinâmica como o seu traço estilizado mas realista arrastava o
leitor em ritmos vertiginosos ao longo das páginas. Essas virtudes -
essa imagem de marca, afinal - estão patentes nalgumas sequências -
mudas ou quase - mostrando o domínio que o autor tem da
planificação, da sequenciação narrativa e da utilização de
diversos planos, mas são excepções no todo e deixam apetite (não
satisfeito) para mais.
Depois
- ou talvez antes - a opção por um relato (que se adivinha) espelho
do
real, que justifica o escrito na abertura do parágrafo anterior e no
qual se adivinha uma necessidade íntima de denúncia de uma situação
que todos (re)conhecemos - e que para muitos é inevitável: as
relações pouco claras entre a política e as
indústrias
da construção
e
imobiliário.
Intachable,
assim, é a história da ascensão de César Gallardo, (mais) um
pobre coitado a chegar a político da moda e membro de governo, feita
à custa do
aproveitamento de
oportunidades,
de mudanças de casaca quando os interesses o exigiam e da escolha
das amizades e alianças - sociais, familiares, políticas… - em
função dos objectivos. E apoiada - e de que forma - na ascensão
paralela - mas menos visível - de Gabriel Solís, empresário e
chefe do crime organizado, cuja ambição e interesses comuns, nasceu
nos bancos da escola e se prolongou ao longo da vida, assente numa
amizade (sempre) interesseira e numa visão do mundo em que só os
motivos
pessoais contam.
Essa
necessidade de realismo, naturalmente, reduz as surpresas narrativas
e confere a este relato um certo tom documental e de revelação -
com alguns pormenores sórdidos - daquilo que todos mais ou menos
(re)conhecemos
como um dos males das democracias...
Victor
Santos
Panini
Comics
selo
Evolution Comics
Espanha,
19 de Março de 2020
170
x 250
mm, 112 p., cor, capa mole
com badanas
ISBN:
9788413344683
15,00
€
(imagens
disponibilizadas pela Panini
Comics;
clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)
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