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01/12/2012

Camarada surgiu há 65 anos














Em 1947, estreava-se o Camarada, “O único jornal infantil para rapazes”, uma revista infanto-juvenil lançada a 1 de Dezembro, então ainda feriado (e ninguém de bom senso imaginava que alguma vez pudesse ser de outra forma) pois era dia da Restauração da Independência e também da Mocidade Portuguesa, que a patrocinava.

O Camarada fez parte do lote dos “quadradinhos do regime”, como os classifica Dias de Deus na obra “Os Comics em Portugal”, revistas para os mais novos nas quais “a doutrinação política estava subjacente”. Por isso ou porque as bandas desenhadas importadas pelo Mosquito, o Diabrete e, mais tarde, o Mundo de Aventuras eram mais apelativas, a nova publicação nunca se conseguiu impor verdadeiramente.
De formato ligeiramente inferior ao A4 e preço de 1$20, tinha como director Baltazar Rebelo de Sousa (pai do comentador televisivo) e, a par dos habituais contos, passatempos e curiosidades, apostou apenas em histórias aos quadradinhos de autores portugueses, destacando-se Júlio Gil, Carlos Alberto Santos (hoje pintor), José Garcês e José Ruy (ainda em actividade) ou Vítor Péon.
Ao fim de quatro anos, em 1951, suspendia a publicação quinzenal com 133 números editados. No ano seguinte promoveu Antes, em 1952 inaugurou a 1.ª Exposição Portuguesa de Histórias aos Quadradinhos, no Palácio da Independência, evento pioneiro, antecipado apenas pela primeira exposição mundial do género realizada em São Paulo um ano antes.
A 20 de Dezembro de 1957, o Camarada ressurgiria numa segunda série, mais infantil e colorida (um luxo para a época), com Marcello de Morais como editor e autores como Artur Correia e Ricardo Neto, que fariam carreira no cinema animado, ou Carlos Roque, futuro colaborador da revista belga Spirou. Embora a aposta se mantivesse nos autores lusos, após um ano de publicação abriria as suas portas a dois gigantes da BD europeia, Franquin e Macherot, estreando em Portugal os seus heróis, Spirou e Clorifila.
Ambos estariam presentes na colecção cartonada Álbuns do Camarada, o primeiro em “O feiticeiro de Vila Nova de Milfungos” (com capa original desenhada para o efeito por Franquin) e Clorofila em “Os Quebra-Ossos”, hoje em dia uma das edições mais raras da BD nacional. “O Cruzeiro do Caranguejo”, de Carlos Roque, “Brés, a ilha afortunada”, de Júlio Gil, e “Uma aventura em Paris/O Signo do Centauro”, de Marcello de Morais foram os restantes títulos editados.
Em Maio de 1965, após quase oito anos e 193 números, o Camarada dizia definitivamente adeus aos seus leitores.

(Versão revista do texto publicado no Jornal de Notícias de 1 de Dezembro de 2012)

19/04/2010

Quadradinhos que valem milhares

Se em Portugal não há edições que atinjam o milhão e meio de dólares pagos há dias pela Action Comics #1 onde nasceu o Super-Homem, colecções de títulos marcantes como o Papagaio, o Mosquito, ou o Cavaleiro Andante podem render alguns milhares de euros.
Para fazer uma estimativa desses valores, o Jornal de Notícias contactou alguns dos principais livreiros do sector, que desde logo salvaguardam as devidas (e enormes) distâncias existentes entre o meio nacional e o norte-americano, a todos os níveis. O que não quer dizer que alguns títulos não façam alguns perder a cabeça em negócios que podem chegar às dezenas de milhares de euros. Por isso um coleccionador, para além de ter sempre disponíveis “uns trocos no bolso”, o que é complicado em tempos de crise, tem de ser dotado de grande paciência num negócio em que não há cotações fixas, pois estão dependentes do estado de conservação das peças, da oferta e da procura.
Assim, por exemplo, uma colecção completa do Papagaio (722 números), bastante difícil de se encontrar, pode valer uns 5 mil euros, revelou José Manuel Vilela, da Livraria do Duque, em Lisboa. No entanto, como esta revista, dirigida por Adolfo Simões Müller, foi a primeira a publicar em todo o mundo as aventuras de Tintin a cores, os números em que o repórter aparece na capa, muitas vezes desenhado por autores nacionais, ou com o colorido criado em Portugal e nunca mais utilizado, têm grande procura por parte de belgas e franceses de Hergé (uma procura potenciada por uma referência feita à revista por Durão Barroso numa entrevista a uma estação de televisão belga), podendo ser transaccionados por 20 ou 30 euros cada um, acrescenta Alberto Gonçalves da Timtimportimtim, no Porto. Nos últimos anos, são também bastante valorizados, por pessoas que vêm de fora da BD, de áreas como o design ou a pintura, as revistas que incluem histórias aos quadradinhos criadas por artistas agora conceituados como Júlio Resende, Stuart Carvalhais ou Júlio Gil. Aliás, geralmente, vendem-se mais números soltos para completar colecções ou substituir edições em pior estado, do que colecções completas, cada vez mais difíceis de aparecer, como refere a livraria Chaminé da Mota, no Porto, tornando mais difícil satisfazer as listas de pedidos em espera dos seus clientes. Por isso um coleccionador, para alem de ter “uns trocos no bolso”, o que é mais complicado em tempos de crise, tem de ser dotado de grande paciência. E, claro está, neste tipo de negócio não há cotações fixas, pois estão dependentes do estado de conservação das peças, da oferta e da procura.
Outras revistas das décadas de 30, 40 e 50 do século passado, a Época de Ouro das publicações infanto-juvenis em Portugal, atingem também valores considerados interessantes: é o caso do Diabrete (887 números) e do Cavaleiro Andante (556), transaccionados por cerca de 3000 €, ou do Camarada (194) por metade daquele valor. O Mundo de Aventuras, espalhado por quase quatro décadas, cinco séries e mais de 2 mil números é, por isso, difícil de cotar. Mais valorizada, é a mítica revista Mosquito (1412 edições), que fez as delícias dos miúdos nas décadas de 30 e 40, cujas cerca de 50 colecções existentes no país, na estimativa de José Vilela, podem valer até 7500 euros. Mas, segundo José Oliveira, do site BDPortugal, que tem listados cerca de metade dos 60 mil títulos de BD editados desde sempre no nosso país, estas colecções têm vindo a perder valor. Isto acontece porque grande parte dos coleccionadores procura os títulos que leu na sua infância e juventude e a geração do Mosquito, por exemplo, tem hoje para cima de 70 anos…
Por isso, compreende-se quando a livraria Paraíso dos Livros revela que as colecções mais procuradas actualmente são as do Tintin (728 números, cujo valor pode chegar aos 1500 €) e do Jornal do Cuto (174 números, 500 €), datadas dos anos 70; ou seja, correspondentes à geração que conta hoje 40 anos.
Claro que, quando se fala de colecções que por vezes duraram mais de uma dezena de anos e atingiram centenas de números, há exemplares mais raros do que outros, normalmente, os primeiros números, mais antigos, e os últimos, correspondentes à fase de declínio, de tiragem menor.
Mas há excepções como, por exemplo, o número de Natal de 1938 do Papagaio, devido à separata com uma BD completa de Júlio Resende, os Mundos de Aventuras #1 a #44, da 1ª série, devido ao seu formato tablóide de difícil conservação, ou o quinto volume da Colecção Audácia que, por razões desconhecidas, triplica os 500 € dos quatro tomos iniciais.
Mas para além destes, há dois casos paradigmáticos citados por todos. O mais antigo corresponde às edições #73 e #74 do Gafanhoto, dos anos 40, que foram impressos mas não distribuídos, por terem sido alvos de um auto de apreensão (cujas causas são desconhecidas) executado pela Polícia Judiciária e de que se conhecem pouquíssimos exemplares que, por esse motivo, não têm cotação. Outro exemplo é o da Fagulha #391, que deveria ter seguido para os quiosques logo após o dia 25 de Abril de 1974. Como era uma publicação da Mocidade Portuguesa, foi destruída juntamente com muitas outras edições, existindo apenas os exemplares que já tinham seguido por correio para os assinantes. Desta forma, se os números #1 a 390# são cotados em cerca de 1000 €, a colecção completa já foi vendida por 1500 euros. Valores semelhantes a estes podem ser encontrados na Internet, quer em sites especializados, quer nos de leilões, onde com alguma regularidade surgem números soltos destas e de outras revistas.
Numa época em que as revistas praticamente desapareceram, os valores atingidos pelos álbuns hoje tão em voga estão longe de ser tão atractivos. Mesmo assim, há alguns da Meribérica (Blueberry, Valérian), dos anos 80, que já ultrapassam os 100 euros, e as poucas edições do Camarada (anos 60) estão cotadas próximas dos 300 euros, pertencendo a uma desses álbuns – Clorofila e os Quebra Ossos – o recorde de venda de um livro de BD em Portugal: 575 euros.

(Versão revista e alargada do texto publicado no Jornal de Notícias de 14 de Abril de 2010)
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