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17/06/2021

Afghanistan

BD póstuma



Desde que a banda desenhada alcançou o estatuto de arte ou a ele foi elevado por pessoas com notórios intuitos comerciais, bem distantes e distintos de critérios artísticos - a discussão destes pontos de vista opostos mas nem sempre conflituosos poderia ser interessante mas levar-nos-ia longe do propósito desta crónica, cujo tema é, como eu pretendia escrever antes deste longo desvio, a edição póstuma de obras inacabadas.

24/02/2013

“O Mosquito” fechou asas há 60 anos















A 24 de Fevereiro de 1953 chegava aos quiosques portugueses “O Mosquito” n.º 1412, o último número da revista que tinha feito sonhar os jovens portugueses durante 17 anos.

A aventura de“O Mosquito”, encetada por Raúl Correia e António Cardoso Lopes (o célebre Tiotónio que muitos ainda recordarão) começara a 14 de Janeiro de 1936, de forma modesta, com apenas 8 páginas a uma cor e o preço de 50 centavos. No entanto, “0 semanário da rapaziada” como se autodenominava, rapidamente ganhou popularidade, aumentou o número de páginas, ganhou maior colorido, atingiu tiragens de 60 mil exemplares e chegou a ser publicado duas vezes por semana.
Esse tempo de glória ficou marcado por séries como “Pelo Mundo Fora”, “A Flecha de Ouro”, “O Gavião dos Mares”, “Os Náufragos do Barco sem Nome”, “O Voo da Águia”, “Cuto” ou “Serafim e Malacueco”, e pela arte de E.T. Coelho, Jayme Cortez, Vítor Péon, Jesus Blasco, Emílio Freixas, Walter Booth ou Reg Perrott, entre muitos outros. A par da banda desenhada, as páginas do “semanário mais bonito” encheram-se também de novelas e contos ilustrados, concursos, espaço para os leitores, separatas para as meninas (“A Formiga”) e construções de armar que divertiam enquanto educavam.
Na capa do número final, que ostentava um preço de 1$50, era anunciada “S. Cristóvam”, a adaptação aos quadradinhos de um conto de Eça de Queiroz. Deixada incompleta pelo fim da revista, esta banda desenhada da autoria de Eduardo Teixeira Coelho, sem dúvida o grande autor de “O Mosquito”, espelhava de alguma forma o que acontecera à publicação, presa ao passado e ultrapassada junto das preferências dos leitores pelos heróis norte-americanos do “Mundo de Aventuras” e pela banda desenhada franco-belga do “Cavaleiro Andante”, que prevaleceriam nos anos seguintes.

(Versão revista do texto publicado no Jornal de Notícias de 24 de Fevereiro de 2013)


16/01/2011

José Ruy: O Mosquito era uma janela aberta para um mundo que desconhecíamos!

Chama-se José Ruy Matias Pinto e nasceu a 9 de Maio de 1930, na Amadora. Ainda em actividade, é o autor português com mais álbuns publicados, tendo iniciado o seu percurso aos quadradinhos no Papagaio, com apenas 14 anos. Depois, passou por quase todas as publicações nacionais, entre as quais o Mosquito, de que é um dos últimos desenhadores vivos, cujas memórias agora evoca.

- Antes de ser autor, suponho que foi leitor do Mosquito. Essa experiência contribuiu para fazer de si um autor de BD?
José Ruy -
Foi fundamental, sem que na altura me tivesse apercebido disso. Tinha cinco anos quando tomei contacto com esse tipo de narrativa e fiquei fascinado. Nasceram aí as minhas primeiras garatujas.

- Como explica o fascínio que O Mosquito exercia sobre os seus leitores?
JR -
Todas as histórias tinham um particular interesse, não só pelos seus enredos como pela diversidade de temas. Naquela época era a janela que tínhamos aberta para o mundo que os miúdos como eu desconheciam.

- Quais as séries e autores do Mosquito que mais o marcaram?
JR -
Reportando-me aos primeiros números, «Pelo Mundo Fora», «Mik Mok Muk», «A Flecha de Ouro» e mais tarde, «Os Guerreiros do Lago Verde», «O Caminho do Oriente», «A Lei da Selva» e «Lobo Cinzento».
Autores, naturalmente Eduardo Teixeira Coelho, Emílio Freixas e Jesus Blasco no desenho, e na escrita Raul Correia e indiscutivelmente José Padiña que nunca viria a assinar com o seu verdadeiro nome.

- Tanto quanto sei, tinha apenas 14 anos quando começou a fazer histórias aos quadradinhos para o Papagaio.
JR -
Isso aconteceu em fins de 1944. Meu pai levou-me à redacção de O Papagaio, gostaram da minha bonecada e fiquei colaborador. No entanto desde muito cedo fui colhendo conselhos do Tiotónio, de quem meus pais tinham sido vizinhos, quando nasci. A certa altura apresentou-me a E. T. Coelho e a partir daí foram ele e o Mestre João Rodrigues Alves os meus grandes orientadores.

- Como chegou a colaborador do Mosquito?
JR -
Por acaso. Estava a terminar o curso de Artes Gráficas na Escola António Arroio, quando o Tiotónio pediu ao Mestre Rodrigues Alves que lhe indicasse um seu aluno mais adiantado para litografar as cores de O Mosquito, pois o Manuel Velez ia partir para a África. Fui eu o escolhido, independentemente da ligação que tinha já com o Tiotónio. Foi uma coincidência.

- No Mosquito, enquanto autor, teve colaboração limitada. Porquê?
JR
- Ao princípio a fasquia de qualidade estava elevada para mim. Depois quando melhorei o meu nível, a situação do jornal já não permitia compensar uma colaboração nacional, pois saía mais cara do que a estrangeira. Quando finalmente publiquei aí a minha primeira história, foi também por um mero acaso. Tinha sido lançado o Cavaleiro Andante que emitira um apelo para novos colaboradores. Levei uma história, com o aval de E. T. Coelho, mas passadas algumas semanas, nada me diziam. Fui saber da resposta e encontrei os originais colocados no mesmo sítio, num sofá, onde a secretária da redacção os tinha posto. Vendo o desinteresse em pelo menos olharem para os bonecos, trouxe-os de volta e o Coelho alvitrou publicá-la no Mosquito. A colaboração continuava a não ser bem paga, mas decidi-me. Chamou-se «O Reino Proibido» e acabei por fazer também capas, alusivas a outras histórias de origem estrangeira.

- Mas desenvolveu outras actividades na revista. Quais?
JR -
Tive a meu cargo a litografia das cores do jornal, fazia legendas e ilustrações para outras publicações realizadas nas Edições O Mosquito, como almanaques, cartazes e embalagens para produtos. Cheguei a ajudar o Tiotónio na máquina de impressão, quando era preciso trabalhar ao Domingo e já não dava para pagar a um turno extra aos impressores. Nos intervalos das cores dava uma ajuda na dobragem dos jornais.

- Como funcionava O Mosquito?
JR -
Era uma vertigem. A saída bi-semanal do jornal obrigava a um ritmo acelerado e eficaz de todos os operadores envolvidos. Era um trabalho «sem rede». Não dava para voltar atrás ou emendar algo. Havia periodicamente reuniões de «conselho» de redacção para criar novas rubricas, escolher as histórias seguintes ou ponderar sobre alguma sugestão. A máquina impressora trabalhava com dois turnos, das oito da manhã à meia-noite. Quando a urgência obrigava, eu ficava muito depois dessa hora a acabar a chapa de cor que na manhã seguinte precisava de estar pronta para entrar em funcionamento.

- Que memórias guarda dessa época?
JR -
Não só pela idade, pelo que estava a aprender e absorvi, pelas emoções criadas e vividas em tão prestigiado e mítico local, posso dizer que tenho as melhores recordações.

- De que maneira a sua experiência no Mosquito marcou o seu trajecto de autor?
JR -
Como uma «espinha dorsal» na minha carreira, tanto técnica como artística. Um verdadeiro alicerce implantado em rocha.

- Quer partilhar algum episódio curioso dessa época?
JR -
Lembro-me de um que tem tanto de humor como de inusitado.
Como sabe, sempre gostei de desenhar do natural, em certa altura precisei de fazer para a revista Flama uma história em quadrinhos à volta de uma ratazana. E estes bichos não faltavam no Bairro Alto e n’O Mosquito. Arranjei uma ratoeira de caixa de arame, para captar um exemplar vivo, para poder estudar em pormenor. Numa manhã lá estava o meu modelo. Desenhei afincadamente em todas as atitudes e quando terminei levantou-se a questão: que destino dar à bicha. Não tive coragem de a matar, depois de alguns dias de convívio. Resolvemos pintar-lhe a cauda com tinta de impressão encarnada, para ver se a voltávamos a ver, e soltámo-la na rua. Nunca mais tive notícias.

- Anos mais tarde tentou fazer renascer o Mosquito. Porquê?
JR -
Depois de algumas tentativas, que não seria bem com esse título, surgiu a oportunidade, com o Ezequiel Carradinha de editarmos este jornal dos meus sonhos. Passados alguns números, 14, como o meu parceiro não se encontrava em condições de continuar, mas o jornal não dava prejuízo, já com bastantes assinaturas, fiquei sozinho, responsável pela continuidade.

- Porque foi tão curta essa experiência?
JR -
Estávamos em 1960 e o frequente embarque de contingentes de jovens para a guerra nas colónias, destabilizou os potenciais leitores do jornal. Tenho essa indicação pelos pedidos para transferir o envio do jornal para Angola e outros pontos de África. Começou a dar um pequeno prejuízo, que multiplicado pelo número de semanas entre a produção e a prestação de contas da distribuidora transformou-se numa «bola de neve».

- Acha possível criar um “novo” Mosquito nos nossos dias? Porquê?
JR -
Acho indispensável. Não o velho Mosquito, litografado e com o lote de histórias dessa época, mas uma revista que mesmo modesta de aspecto (e de despesa) desse oportunidade a iniciados ombrearem com profissionais e assim poderem ser lançados e conhecidos pelo público. Este também precisa de uma «sacudidela» para voltar a interessar-se pelas Histórias em Quadrinhos, principalmente nacionais.

- Tem a colecção de O Mosquito?
JR -
Tenho realmente a colecção de O Mosquito, até à altura em que fui trabalhar para a redacção. É assim, casa de ferreiro, espeto de pau.
Também conservo uma da minha edição e do Carradinha.



- Tem algum projecto de banda desenhada em curso? Qual? Quando e onde será publicado?
JR -
Estou a fazer a vida de Leonardo Coimbra, o grande filósofo do princípio do século XX e da República Portuguesa, onde o documento histórico se funde com a ficção, de resto como em todos os trabalhos deste género que tenho realizado. Vai sair em livro pela Âncora Editora, em meados deste ano. A seguir prosseguirei na execução da minha agenda que está preenchida até 2012.

(Versão integral da entrevista que serviu de base ao texto publicado no Jornal de Notícias de 14 de Janeiro de 2011)

15/01/2011

José Garcês: Entrar para O Mosquito, era entrar pela porta grande do jornalismo infantil.

Chama-se José dos Santos Garcês e nasceu em Lisboa em 1928. Depois de uma passagem pelo Pluto, estreou-se em O Mosquito em 1946, tendo depois passado por quase todos os títulos de banda desenhada criados em Portugal.
Hoje, quase 70 anos depois da sua estreia, continua a fazer dos quadradinhos o seu dia-a-dia.

- Antes de ser autor, suponho que foi leitor do Mosquito. Essa experiência contribuiu para fazer de si um autor de BD?
José Garcês -
A partir dos 7 anos (1936) tornei-me leitor de O Mosquito. Lembro-me que o descobri porque me deram uma construção de armar que ele tinha publicado e a partir daí passei a ser seu leitor.

- Como explica o fascínio que O Mosquito exercia sobre os seus leitores?
JG -
O Mosquito tinha um material muito bom, as bandas desenhadas inglesas. O Cardoso Lopes era um grande conhecedor desse ambiente e escolheu o melhor que havia na altura para O Mosquito. Eram histórias de encantar, espantosas, ficção muito bem contada e desenhada.

- Quais as séries e autores d’O Mosquito que mais o marcaram?
JG
- Assim de repente recordo “Rob the Rover – Pelo mundo fora”, “O Capitão Bill, o grumete Bell e o cozinheiro Ball”, “O Voo da Águia”… Depois vieram os espanhóis, em especial Jesus Blasco, que tive oportunidade de conhecer e com quem convivi muitos anos, autor do Cuto, que marcou uma época.

- Como chegou a autor de O Mosquito?
JG -
Eu tinha colaborado com o Pluto, um jornal dirigido pelo Roussado Pinto, que era mais ou menos uma cópia de O Mosquito, no qual fazia grafismos e ilustrações.
Quando o Pluto acabou, eu tinha desenhado uma história para a revista que, soube mais tarde, o Roussado Pinto apadrinhou junto do Cardoso Lopes, que a aceitou e publicou.
Estreei-me assim, n’O Mosquito, o jornal da minha infância, que marcou uma época, a 12 de Outubro de 1946, com “O Inferno Verde”.

- Como funcionava O Mosquito?
JG -
Eu apresentava o projecto da história. Depois de aprovado, entregava as páginas desenhadas, por vezes com um pequeno texto, sendo depois o texto final escrito pelo Raul Correia, com a sua verve literária, como era hábito então.

- Que memórias guarda dessa época?
JG -
Lembro-me perfei-tamente que havia um grande interesse pel’O Mosquito, porque ainda não havia televisão.
O Mosquito e, depois, O Diabrete, tinham muita importância na época. Entrar para O Mosquito, naquele tempo, era entrar pela porta grande do jornalismo infantil. N’O Mosquito havia um convívio estupendo. Tive a oportunidade de conhecer e trabalhar com o Cardoso Lopes, o Raul Correia, o Vítor Péon, o Eduardo Teixeira Coelho…

- De que maneira a sua experiência no Mosquito marcou o seu trajecto de autor?
JG -
Em primeiro lugar, pelo que já apontei: o contacto com grandes autores.
E também porque ganhei alguma disciplina, que era muito necessária na nossa arte, aprendi a trabalhar com a censura… Aprendi muito n’O Mosquito.

- Quer partilhar algum episódio curioso dessa época?
JG -
Lembro-me de uma visita que fizemos às oficinas de O Mosquito, quando ainda era estudante da António Arroio, na qual nos foi pedido que fizéssemos um desenho para ser passado para uma chapa de offset. Uma vez o desenho terminado, foi feita uma prova do mesmo que me foi entregue e que ainda hoje guardo como recordação da minha primeira visita a O Mosquito, quando eu ainda nem sequer sonhava vir a publicar na revista.

- Tem a colecção de O Mosquito?
JG -
Tive a colecção de O Mosquito, mas agora só tenho alguns números soltos, princi-palmente da sua fase final. Mas tenho as folhas das minhas colaborações n’O Mosquito.

- Tem algum projecto de banda desenhada em curso? Qual? Quando e onde será publicado?
JG -
Estou a terminar algo que estava engatilhado desde anos anteriores, um trabalho sobre o lince ibérico, que vai ser editado pela Liga da Protecção da Natureza, com apoio de fundos europeus. São apenas 22 páginas, baseadas num texto de um biólogo. O livro deverá sair no primeiro semestre de 2011, eventualmente no Festival de BD de Moura, uma vez que esta zona está incluída na área do lince ibérico.
Entretanto, tenho também praticamente pronta a História de Silves, que a câmara local deverá editar durante este ano.

(Versão integral da entrevista que serviu de base ao texto publicado no Jornal de Notícias de 14 de Janeiro de 2011)

14/01/2011

O Mosquito abriu asas há 75 anos


A 14 de Janeiro de 1936 chegava aos quiosques portugueses um novo jornal infanto-juvenil. Era o primeiro voo de O Mosquito, “O semanário da rapaziada”, que duraria 17 anos e 1412 números e marcaria de forma indelével os quadradinhos portugueses.

O Início
O começo – como toda a sua vida, aliás – foi modesto: apenas 8 páginas em formato A4, papel de jornal de fraca qualidade e a presença de uma única cor apenas nas capas e nas páginas centrais. E um preço a condizer: 5 tostões, os oficiais 50 centavos, qualquer coisa como 25 cêntimos nos tempos do euro que hoje vivemos, o que durante muitos anos lhe serviu de bandeira, apresentando-se como “o jornal infantil mais barato”.
Ao leme do insecto, estavam dois dos maiores nomes do jornalismo infanto-juvenil nacional, António Cardoso Lopes, o famoso Tiotónio, já com experiência similar de outras publicações, responsável pelo grafismo, e Raul Correia, que asseguraria grande parte da criação literária da nova publicação, bem como as traduções (livres, quase sempre autênticas novas versões) das bandas desenhadas publicadas. Juntos fizeram de O Mosquito “o primeiro movimento colectivo de rebeldia das crianças em Portugal”, escreve António Dias de Deus em “Os Comics em Portugal” (Cadernos da Bedeteca, Cotovia). Porque, acrescenta, o seu conteúdo fugia às “lindas e bem-formativas revistas, como O Senhor Doutor e O Papagaio”. Por isso, “O Mosquito foi perseguido, confiscado, rasgado, queimado, deitado para o caixote do lixo, anatemizado e esconjurado. Os pais, aparentemente, tinham a razão e a força (…) mas acabaram por perder a guerra”.

Altos voos
E o sucesso foi imediato. Iniciado com uma tiragem de apenas cinco mil exem-plares, no auge da sua popula-ridade atingiu 30 mil, era publicado duas vezes por semana e as máquinas onde era impresso, trabalhavam seis dias por semana, em dois turnos de oito horas!
Combinando novelas ilustradas, textos mais moralistas e bandas desenhadas, recortadas e remontadas, ocupando todos os espaços de cada página, O Mosquito, “o jornal mais bonito”, que ao longo da sua vida mudou de formato cinco vezes e chegou a ter 16 páginas, fez da interactividade com os leitores um dos seus grandes trunfos. Por isso, a par das cartas dos leitores e da publicação das suas fotografias, teve um emblema, multiplicaram-se os concursos, as separatas e as construções para armar. O sucesso crescente levou à criação de colecções paralelas, números especiais, um suplemento para meninas – A Formiga – e emissões radiofónicas, que o fizeram voar atravessando as mudanças de três décadas e de uma guerra mundial.

Histórias memoráveis
Quem leu O Mosquito – quando foi publicado ou anos mais tarde, herdado de pais ou tios – recorda com certeza “Pelo mundo fora…”, “Formidáveis aventuras do grumete Mick, do velho Mock e do cão Muck”, “Jovens Heróis”, “O Capitão Bill, o grumete Bell e o cozinheiro Ball”, “Águias da Lei”, “O Capitão Meia-Noite”, “O Gavião dos Mares”, “Pedro de Lemos, Tenente, e o ‘Manel’, Dez Reis de Gente”, “O Voo da Águia”, “Serafim e Malacueco”, “Anita Pequenita” e, sobretudo, possivelmente, as aventuras do Cuto. E desconhecendo, com certeza, que todas elas eram estrangeiras, a maior parte inglesa, com algumas espanholas à mistura. Quase no final, surgiriam também americanas: “Príncipe Valente”, “Terry e os Piratas”, “Tommy, o rapaz do circo”…
Mais tarde, esta colaboração estrangeira seria quase completamente substituída pela produção nacional. O grande sustentáculo da revista, foi então Eduardo Teixeira Coelho (o célebre ETC), que desenhou “Os Guerreiros do Lago Verde”, “Falcão Negro”, “Os Náufragos do Barco sem Nome” ou o mítico “O Caminho do Oriente” (considerado por muitos Os Lusíadas da BD nacional). “A Casa da Azenha” (de Vítor Péon), “Os Espíritos Assassinos” (Jayme Cortez), “O reino proibido” (José Ruy) ou “O Inferno Verde” (José Garcês) são outros títulos que deixaram marca nas páginas de O Mosquito

O último bater de asas
Com o correr dos anos, a chegada de novos concorrentes – O Diabrete, O Mundo de Aventuras, O Cavaleiro Andante -, a saída de Cardoso Lopes, “uma obcecação pela história pátria e pelos clássicos da língua portuguesa”, escreve António J. Ferreira, outro especialista da BD nacional (em O Mosquito nº 1, V série), a revista perde a rebeldia e “fala cada vez menos à imaginação infantil, tornando-se um prolongamento da escola”.
Chegaria ao fim, de forma discreta, já não era “o semanário infantil português de maior tiragem”, a 24 de Fevereiro de 1953. Mas deixara de tal forma a sua marca, que, escreve Leonardo de Sá no recém-lançado “Dicionário Universal da Banda Desenhada – Pequeno Léxico Disléxico”, o termo “mosquito” chegou a ser usado “para designar em Portugal qualquer revista de histórias aos quadradinhos”.

Outros voos
Por isso, também, se compreende que ao longo dos tempos tenha havido várias tentativas de retomar o título – e o fantástico e o maravilhoso a ele associados. Em 1960, Eduardo Carradinha e José Ruy, autor na primeira série, deram-lhe uma segunda vida, similar à primeira, que durou apenas 30 números. Um ano depois, nova tentativa de renascimento, teve apenas quatro números, mais longa mesmo assim que o número único de prospecção lançado em 1975.
Já nos anos 80, albergando sob as suas asas o melhor da BD europeia de então a par da recuperação de alguns clássicos, O Mosquito voou de novo, durante uma dúzia de números e um Almanaque natalício, na sua última ressurreição. Até hoje.

Quanto vale O Mosquito?
Apesar da sua idade e longevidade, ainda hoje surgem colecções completas de O Mosquito, que podem valer até 7500 euros. O alfarrabista José Vilela, estima que existirão umas 50 no total, mas Alberto Gonçalves, da Timtim por Timtim, refere que, com alguma paciência, gastando mais um pouco, através da internet e procurando em alfarrabistas, é possível completar uma colecção num prazo de um ou dois anos.
Os números mais difíceis, para além dos primeiros, mais antigos, e dos últimos, que tiveram menor tiragem e distribuição, são os que correspondem às mudanças de formato, pois estragavam-se com mais facilidade. Quase impossível, é encontrar as diversas separatas e construções que a revista ofereceu.
De qualquer forma, como este tipo de coleccionismo está geralmente associado à recordação das leituras de infância, são cada vez menos aqueles que ainda procuram O Mosquito.

O Mosquito em números
17 anos (1936-1953)
1412 números
1512 bandas desenhadas curtas
250 bandas desenhadas em continuação
381 contos
425 cartas do Avozinho
180 números de A Formiga (suplemento para meninas)
Tiragem inicial: 5000 exemplares
Tiragem máxima: 30 000 exemplares (duas vezes por semana)
Tiragem no final: 7000 exemplares

(Texto publicado no Jornal de Notícias de 14 de Janeiro de 2011)

19/04/2010

Quadradinhos que valem milhares

Se em Portugal não há edições que atinjam o milhão e meio de dólares pagos há dias pela Action Comics #1 onde nasceu o Super-Homem, colecções de títulos marcantes como o Papagaio, o Mosquito, ou o Cavaleiro Andante podem render alguns milhares de euros.
Para fazer uma estimativa desses valores, o Jornal de Notícias contactou alguns dos principais livreiros do sector, que desde logo salvaguardam as devidas (e enormes) distâncias existentes entre o meio nacional e o norte-americano, a todos os níveis. O que não quer dizer que alguns títulos não façam alguns perder a cabeça em negócios que podem chegar às dezenas de milhares de euros. Por isso um coleccionador, para além de ter sempre disponíveis “uns trocos no bolso”, o que é complicado em tempos de crise, tem de ser dotado de grande paciência num negócio em que não há cotações fixas, pois estão dependentes do estado de conservação das peças, da oferta e da procura.
Assim, por exemplo, uma colecção completa do Papagaio (722 números), bastante difícil de se encontrar, pode valer uns 5 mil euros, revelou José Manuel Vilela, da Livraria do Duque, em Lisboa. No entanto, como esta revista, dirigida por Adolfo Simões Müller, foi a primeira a publicar em todo o mundo as aventuras de Tintin a cores, os números em que o repórter aparece na capa, muitas vezes desenhado por autores nacionais, ou com o colorido criado em Portugal e nunca mais utilizado, têm grande procura por parte de belgas e franceses de Hergé (uma procura potenciada por uma referência feita à revista por Durão Barroso numa entrevista a uma estação de televisão belga), podendo ser transaccionados por 20 ou 30 euros cada um, acrescenta Alberto Gonçalves da Timtimportimtim, no Porto. Nos últimos anos, são também bastante valorizados, por pessoas que vêm de fora da BD, de áreas como o design ou a pintura, as revistas que incluem histórias aos quadradinhos criadas por artistas agora conceituados como Júlio Resende, Stuart Carvalhais ou Júlio Gil. Aliás, geralmente, vendem-se mais números soltos para completar colecções ou substituir edições em pior estado, do que colecções completas, cada vez mais difíceis de aparecer, como refere a livraria Chaminé da Mota, no Porto, tornando mais difícil satisfazer as listas de pedidos em espera dos seus clientes. Por isso um coleccionador, para alem de ter “uns trocos no bolso”, o que é mais complicado em tempos de crise, tem de ser dotado de grande paciência. E, claro está, neste tipo de negócio não há cotações fixas, pois estão dependentes do estado de conservação das peças, da oferta e da procura.
Outras revistas das décadas de 30, 40 e 50 do século passado, a Época de Ouro das publicações infanto-juvenis em Portugal, atingem também valores considerados interessantes: é o caso do Diabrete (887 números) e do Cavaleiro Andante (556), transaccionados por cerca de 3000 €, ou do Camarada (194) por metade daquele valor. O Mundo de Aventuras, espalhado por quase quatro décadas, cinco séries e mais de 2 mil números é, por isso, difícil de cotar. Mais valorizada, é a mítica revista Mosquito (1412 edições), que fez as delícias dos miúdos nas décadas de 30 e 40, cujas cerca de 50 colecções existentes no país, na estimativa de José Vilela, podem valer até 7500 euros. Mas, segundo José Oliveira, do site BDPortugal, que tem listados cerca de metade dos 60 mil títulos de BD editados desde sempre no nosso país, estas colecções têm vindo a perder valor. Isto acontece porque grande parte dos coleccionadores procura os títulos que leu na sua infância e juventude e a geração do Mosquito, por exemplo, tem hoje para cima de 70 anos…
Por isso, compreende-se quando a livraria Paraíso dos Livros revela que as colecções mais procuradas actualmente são as do Tintin (728 números, cujo valor pode chegar aos 1500 €) e do Jornal do Cuto (174 números, 500 €), datadas dos anos 70; ou seja, correspondentes à geração que conta hoje 40 anos.
Claro que, quando se fala de colecções que por vezes duraram mais de uma dezena de anos e atingiram centenas de números, há exemplares mais raros do que outros, normalmente, os primeiros números, mais antigos, e os últimos, correspondentes à fase de declínio, de tiragem menor.
Mas há excepções como, por exemplo, o número de Natal de 1938 do Papagaio, devido à separata com uma BD completa de Júlio Resende, os Mundos de Aventuras #1 a #44, da 1ª série, devido ao seu formato tablóide de difícil conservação, ou o quinto volume da Colecção Audácia que, por razões desconhecidas, triplica os 500 € dos quatro tomos iniciais.
Mas para além destes, há dois casos paradigmáticos citados por todos. O mais antigo corresponde às edições #73 e #74 do Gafanhoto, dos anos 40, que foram impressos mas não distribuídos, por terem sido alvos de um auto de apreensão (cujas causas são desconhecidas) executado pela Polícia Judiciária e de que se conhecem pouquíssimos exemplares que, por esse motivo, não têm cotação. Outro exemplo é o da Fagulha #391, que deveria ter seguido para os quiosques logo após o dia 25 de Abril de 1974. Como era uma publicação da Mocidade Portuguesa, foi destruída juntamente com muitas outras edições, existindo apenas os exemplares que já tinham seguido por correio para os assinantes. Desta forma, se os números #1 a 390# são cotados em cerca de 1000 €, a colecção completa já foi vendida por 1500 euros. Valores semelhantes a estes podem ser encontrados na Internet, quer em sites especializados, quer nos de leilões, onde com alguma regularidade surgem números soltos destas e de outras revistas.
Numa época em que as revistas praticamente desapareceram, os valores atingidos pelos álbuns hoje tão em voga estão longe de ser tão atractivos. Mesmo assim, há alguns da Meribérica (Blueberry, Valérian), dos anos 80, que já ultrapassam os 100 euros, e as poucas edições do Camarada (anos 60) estão cotadas próximas dos 300 euros, pertencendo a uma desses álbuns – Clorofila e os Quebra Ossos – o recorde de venda de um livro de BD em Portugal: 575 euros.

(Versão revista e alargada do texto publicado no Jornal de Notícias de 14 de Abril de 2010)
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