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26/02/2015

Um contrato com Deus





Conforme As Leituras do Pedro divulgaram em primeira mão, é distribuído hoje com o jornal Público o primeiro volume da colecção Novela Gráfica - a melhor colecção de BD já publicada com um jornal em Portugal... - editada pela Levoir.
E, em abono da verdade, dificilmente poderia começar melhor. Porque Eisner não sendo o criador do termo ‘graphic novel’, foi o principal responsável pela sua difusão – começando exactamente com este livro, datado de 1978, quando aquele génio dos quadradinhos já contava 61 anos.
E, também, principalmente, porque Um contrato com Deus é – continua a ser - uma excelente obra.

02/08/2011

(Não) Envelhecer

"Não há nenhuma evidência científica que apoie o facto de que os quadradinhos mantêm as pessoas jovens. Mas há algo nesta profissão que nos faz sentir jovens. Já atingi um outro patamar. Não tenho tempo para envelhecer”. (Will Eisner, 1917-2005)
Descobri esta citação, já este texto estava semi-escrito. E sinto-me lisonjeado por, de alguma forma, partilhar a ideia expressa por um autor como Eisner.
Realmente, apesar de os anos passarem, não consigo sentir-me velho – aliás, a velhice é, quase sempre, um estado mental.
É verdade que me apercebo das marcas que ficam – que se vêem no invólucro – e também vou reparando que há cada vez mais futebolistas, músicos e… autores de BD mais novos do que eu!
A chegada do meu segundo filho – sê bem-vindo, André! – também não me traz essa sensação.
Pelo contrário.
Contigo, André, espero (re)descobrir progressivamente tantos dos heróis e dos quadradinhos que encheram – que enchem – os meus sonhos e que me mantêm jovem. De Tintin a Astérix, do Homem-Aranha a Ric Hochet, dos Peanuts a Calvin & Hobbes, assim como Franquin, Prado, Schuiten, Taniguchi ou Davodeau. E, claro, Eisner.
Contigo, André, espero voltar a beber (muitas vezes) nesta fonte. Não para rejuvenescer. Mas para continuar jovem.

(Texto publicado originalmente no Jornal de Notícias de 7 de Agosto de 2005)

Agora, André, no dia que fazes 6 anos – muitos parabéns! - a sensação é a mesma. Contigo já (re)descobri alguns daqueles heróis. Com prazer e orgulho, vejo-te já a ler alguns dos livros que me marca(ra)m. Continua assim, forte e determinado. Lê, lê muito, lê cada vez mais. Continua jovem, como eu, senão qualquer dia apanhas-me…!

21/05/2010

Fagin, o judeu

Will Eisner (argumento e desenho)
Gradiva (Portugal, Abril de 2007)
190 x 250 mm, 128 p., branco e sépia, brochado


E de repente, sem muito bem se saber porquê, a banda desenhada voltou a descobrir os clássicos da literatura. Quer no mercado franco-belga, onde editoras como a Delcourt, a Soleil, a Casterman e a Glénat estão a lançar títulos ou colecções dedicada às suas adaptações aos quadradinhos, quer nos EUA, onde a Marvel, detentora do Homem-Aranha ou do Quarteto Fantástico, anunciou também uma colecção com as mesmas premissas. Ou até no Brasil, onde se estão a multiplicar as versões “en quadrinhos” dos clássicos da literatura locais, muitos deles apontados ao “Plano Nacional de Leitura” de lá.
Mas estas adaptações não se anunciam como as maçudas e maçadoras versões de tempos idos, que muitas vezes nem BD eram, quando desenhadores anódinos ilustraram (mal) os textos integrais; hoje, elas estão entregues a autores de créditos firmados, que as escolheram como projectos pessoais, em que se empenharam, transmitindo através de uma forma de expressão diversa o espírito da obra original, os sentimentos e as emoções que a sua leitura lhes proporcionou.
É, apesar de tudo, o caso deste "Fagin, o judeu", obra da velhice (data de 2003, tinha o grande mestre norte-americano já 86 anos), na qual Eisner pretende desmontar a visão estereotipada dada dos judeus na versão original do romance clássico de Charles Dickens, "Oliver Twist". Para isso, não (re)conta aos quadradinhos aquele drama vitoriano, mas sim a vida (inventada…) do seu vilão, Fagin ("o judeu"). Sem intenção de o absolver dos crimes que cometeu nem sequer para o justificar; divergindo de Dickens, traça um retrato díspar de Fagin, mostrando-o não como a incarnação do mal mas como um ser humano como outro qualquer, com dúvidas, contradições e incertezas, empurrado para o crime pelas vicissitudes de uma vida que lhe foi por demais madrasta, equiparável, afinal, ao retrato delicodoce que Dickens nos deixou de Oliver Twist, com o senão de que a Fagin a fortuna nunca sorriu… ou sorriu demasiado tarde.
Para isso, aproveita a história base, num interessante diálogo com a literatura, para fazer um retrato expressivo da opressiva Londres vitoriana onde ela decorre e para onde transporta o leitor, das vielas lúgubres e esconsas às ricas mansões, através da riqueza, precisão e expressividade do seu traço, aqui servido por tons sépia, que nada retiram da força dos jogos de luz e sombra em que se mostra mais uma vez mestre incontestado, bem como no domínio do ritmo narrativo marcado à custa da forma como compõe as pranchas, construindo uma narrativa forte e bem estruturada através da qual defende o seu ponto de vista e tenta suavizar a imagem exageradamente anti-semita que o texto original de Dickens transmite, mesmo que involuntariamente.
E constrói, assim, uma obra de crítica social e de costumes e também histórica, na qual contextualiza a presença judaica numa Londres tolerante e liberal mas fechada, mostrando como os judeus da Europa Central (os asquenazitas, judeus de segunda, atrás dos (mais ricos) judeus ibéricos, sefarditas), eram empurrados para vidas feitas de esquemas e expedientes nada honestos, que estiveram na origem da imagem estereotipada dos judeus, ainda hoje comum.

(versão revista do texto publicado no Jornal de Notícias de 13 de Maio de 2007)
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