12/12/2014

Zombie




Depois do (aplaudido) Diário Rasgado e de Anos Dourados, Zombie marca o regresso de Marco Mendes, desta vez numa narrativa longa.
O livro, cuja minha leitura vem já a seguir, será apresentado amanhã, sábado, 13 de Dezembro, às 15h30, na Biblioteca Almeida Garrett, no Porto, no âmbito da exposição Sub 40.


Apesar do título poder ser enganador – porque não segue modas actuais, antes aponta para a existência (quase) vazia e sem objectivos, característica de (muitos) dos jovens actuais que, mais do que viver, se limitam a deambular pela vida - a mudança do registo, quase de tira diária para narrativa de maior fôlego, não implicou alterações a nível gráfico ou temático.
Na verdade, mantêm-se intactas – até mais depuradas pelo ganho de experiência e pela publicação mais regular? - aquelas que são as (reconhecidas) qualidades do autor portuense: o olhar atento sobre o (seu) quotidiano, uma capacidade invulgar de o transcrever através da linguagem gráfica que adoptou, quer pelos diálogos credíveis e consistentes, quer pelo traço algo rude mas realista – e o trabalho de cor - muito bem conseguido que sustenta o conjunto.
Podendo ser dividido em duas partes, Zombie, começa por revelar as dificuldades que o autor tem de assumir relacionamentos sérios com as mulheres, uma questão cada vez mais latente na nossa sociedade virada para si mesmo e para os ecrãs, com que se vai cruzando – não por acaso Elif, na sua loucura ‘juvenil’ é aquela com quem melhor interage, embora o leitor fique sempre à espera de um passo seguinte que não acontece, e é em Liliana, (mais uma mulher) de passagem, que encontra algum do carinho e proximidade de que está carente.
A meio, enganador episódio autónomo que não exorciza fantasmas antes soa como fuga provisória, surge uma abordagem a uma das nódoas e aberrações da actual vida académica portuguesa: as praxes e o comportamento abjecto de ‘doutores’ na humilhação crescente aos caloiros que só ambicionam substituí-los.
Este é também o tema base do (longo) texto do francês Samuel Buton que fecha o livro e que proporciona um olhar distanciado – mas não díspar… - sobre o mesmo (triste) fenómeno, na óptica da incompreensão de quem vem de longe.
A (dupla) denúncia, não sendo nova, no caso de Marco Mendes (também) professor universitário, ganha (os) novos contornos que a sua abordagem gráfica proporcionam, reforçada pelo tom caricato que a sustenta e torna mais ridícula a situação retratada.
Relato intimista e deprimido – com a (sua) vida e a forma como se vive actualmente no país (a vários níveis) - apesar de alguns traços de humor, fruto da loucura pós-adolescente que ainda co-existe com o adulto que há em Marco e nos seus amigos - que procuram nalguma militância de protesto, enganadoramente visível no carácter passageiro que Marco Mendes no final assume - Zombie é uma obra de forte actualidade, muito aconselhável que confirma um dos mais talentosos autores portugueses do momento.

Zombie
Marco Mendes (banda desenhada)
Quando Eu For Grande
Samuel Buton (texto)
Turbina/Mundo Fantasma
Portugal, Dezembro de 2014
290 x 215, 72 p., cor, cartonado
17,00 

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