A recente publicação de O Elixir da Eterna Juventude - Uma Dança no Mundo de Sérgio Godinho, numa edição Kingpin Books, justificou esta conversa com o argumentista, Fernando Dordio, para conhecer a génese e o propósito deste livro.
O resultado, está já a seguir.
As Leituras do Pedro - Como surgiu a ideia
deste álbum? De quem partiu? Como foi composta a equipa argumentista/desenhador?
Fernando Dordio - O
Sérgio é um mito para a minha geração, uma figura que sempre esteve presente na
minha vida, inicialmente por ser uma figura muito admirada pela minha mãe (como
activista político e como músico) e também pelas músicas de séries da minha
infância.
No entanto, por volta de 2000 e pouco, eu estava em Évora no
25 de Abril e ouvi o “Primeiro Dia” seguido das “Fotos de Fogo” e aquilo bateu
forte em mim, essas músicas ajudaram-me a ver de toda uma nova perspectiva um
aspecto trágico da minha vida.
Desde essa altura comecei a ouvir o que estava para trás e
comecei a segui-lo com entusiasmo - tornei-me então mais um dos seus muitos
fãs.
A diferença é que descobri tantas personagens e conceitos
geniais e comecei a imaginar que seria interessante fazer uma história em que
elas interagissem entre elas.
As Leituras do Pedro
- De quem partiu a ideia deste livro?
Fernando Dordio - Foi
de mim e é um livro completamente pessoal. Estava a voltar para casa do
Concerto Liberdade em Lisboa, no Coliseu, fiquei irritado e disse para a minha
esposa “Tenho de fazer um livro com o Universo do Sérgio Godinho!”.
As Leituras do Pedro
- Como foi composta a equipa argumentista/desenhador?
Fernando Dordio - Neste
caso, diria que eu tive uma ideia para uma equipa que ou era conseguida, ou não
iria fazer o livro - Osvaldo Medina e Mário Freitas.
Primeiro, precisava do Osvaldo porque é para mim o melhor
storyteller português e sei tudo o que ele acrescenta pela sua inteligência e
talento a qualquer argumento - o Osvaldo é um contador de histórias magnífico e
pragmático, mesmo mais do que os argumentistas que trabalham com ele.
E o Mário porque abraçou desde logo o projecto sem hesitar,
admira muitíssimo o Sérgio e deu-me carta branca ainda nem argumento eu tinha.
O Mário define uma qualidade superlativa para os livros que edita, faz a
legendagem de forma 100% integrada no livro, o que no final dá um corpo e uma
consistência global perfeita. Sendo também argumentista, troca ideias e
preocupações sobre o guião, faz-me pensar, faz-me procurar sempre fazer melhor,
nem que seja para que no fim ele não me ponha defeitos no guião - isso puxa
pela exigência.
O Osvaldo e o Mário tem a minha idade e para um projecto
como este, era fundamental que a equipa tivesse já ouvido o Sérgio cantar, nem
que fosse ao longe.
A cor foi um processo complicado porque tínhamos uma pessoa
inicialmente e depois na impossibilidade dela continuar, o amigo brasileiro
José Aguiar, sugeriu-nos o seu colaborador do “A Infância do Brasil”, Joel De
Souza que veio dar uma ajuda com a cor.
As Leituras do Pedro
- Como o defines? Ficção, biografia ou algo mais?
Fernando Dordio - Ficção,
sem qualquer dúvida.
É um livro de aventuras para todo o público e que não
necessita quaisquer pré-requisitos, i.e. não é necessário saber nada da obra do
Sérgio para se apreciar a história.
No entanto, quanto mais o leitor conhecer a obra do Sérgio,
melhor será a experiência e irá ver as diversas camadas temáticas que estão no
livro.
As Leituras do Pedro
- Como desenvolveste o argumento e qual foi o teu método de trabalho com o
Osvaldo?
Fernando Dordio - Desenvolvi
uma sinopse bem detalhada com a história. Enviei ao Sérgio que gostou
globalmente e que disse que tinha grandes ideias, embora tivesse a precisar de
polimento.
Além disso, discutimos quais as músicas que eu iria focar -
o Sérgio gostava que houvesse referência a um pouco de tudo, desde temas mais
recentes aos mais antigos.
E assim foi feito - posso dizer que existe um tema do
primeiro álbum “Sobreviventes” e o tema original do espectáculo “Juntos” com o
Jorge Palma.
Fiz full-script sem orientação de ângulos ou perspectivas
para as vinhetas. O Osvaldo e o Mário reuniram-se várias vezes e fizeram
layouts esboçados das cenas - nunca me preocupei com esse campo, uma vez que
somos uma equipa a 100%.
O Osvaldo depois desenhava a versão final. Salvo duas
excepções, a ideia para as personagens foi concebida (e de forma perfeita),
pelo que o Osvaldo interpretou do guião.
Este processo foi iterativo ao longo de mais de dois anos.
As Leituras do Pedro
- O Sérgio Godinho teve alguma participação na sua concepção/execução?
Fernando Dordio - Além
do que disse anteriormente, fui enviando imagens dos principais plot-points e
personagens ao Sérgio.
O Sérgio é uma pessoa muito ocupada e por isso mesmo, acho
eu, directa, pragmática. Dessa forma o processo foi simples. Outro aspecto,
importante. Só voltei a falar com o Sérgio pessoalmente depois de ter escrito o
guião todo, uma vez que queria colocar no livro a personagem Sérgio Godinho da
minha perspectiva e não um Sérgio Godinho que eu já conhecesse pessoalmente.
As Leituras do Pedro
- Já tiveste alguma reacção dele ao trabalho finalizado?
Fernando Dordio - Fui
dar-lhe um exemplar assim que tive o livro. Em relação ao livro objecto o
Sérgio gostou bastante e ficou entusiasmado por estar numa banda-desenhada.
E mesmo há pouco tempo ele disse-me que gostou, mas havemos
de falar melhor quando nos encontrarmos novamente. Até agora tudo bastante
positivo e ainda bem.
As Leituras do Pedro
- Como avalias o álbum impresso? O que ias já mudar se ainda pudesses?
Fernando Dordio - Perfeito.
O Mário trabalha há algum tempo com um gráfica polaca e com eles o trabalho tem
sido muito bom e o livro impresso está exactamente como concebido. Há livros em
que se pode apontar alguma perda de brilho, ou páginas mais baças que outras.
Tudo foi preparado para o livro demorar mais de um mês a vir
da Polónia, uma vez que tínhamos mais garantias da qualidade final.
As Leituras do Pedro
- O álbum foi impresso com duas capas diferentes, a de Osvaldo Medina para a
edição ‘normal’ que sai com o Público, e a ‘variante’ de Nuno Saraiva, para
venda nas lojas FNAC e na Kingpin Books. Que destacas em cada uma delas?
Fernando Dordio - A
banca e a livraria são dois mundos distintos. Eu gosto igualmente das duas
capas e o objectivo foi apelar a dois públicos distintos.
A capa do Nuno a meu ver, é mais destinada a um público que
está na livraria a ver o que pretende comprar, olha ao detalhe e normalmente
está mais informado sobre o que pretende comprar.
O Osvaldo concebeu uma capa para ter mais punch, porque na
banca tudo é mais imediato e é preciso chamar a atenção do potencial leitor -
ainda por cima numa altura em que há tanta variedade nas bancas procuramos algo
meio Kirbyano, para captar a atenção do leitor.
As Leituras do Pedro
- Qual a tiragem deste álbum?
Fernando Dordio - 4500
unidades, sendo 4000 para o Público, 350 para a Fnac e 150 para a Kingpin
Books.
As Leituras do Pedro
- A distribuição do álbum com o Público dá-lhe uma visibilidade acrescida. Qual
a importância disso?
Fernando Dordio - Enquanto
fã do Sérgio e sabendo que existem muitos por aí, esta forma é a mais fácil
para chegar a qualquer pessoa em qualquer ponto do País. Desta forma,
democratiza mais o acesso a um livro que é sobre uma das figuras mais
importantes da cultura portuguesa.
As Leituras do Pedro
- Qual a importância deste álbum no actual momento da edição de BD em Portugal?
Fernando Dordio - Penso
que é mais um álbum Nacional numa altura em que existem dezenas de álbuns nas
bancas. Pode existir a possibilidade de atrair pessoas que normalmente não
compram BD, mas isso é uma incógnita - esperamos naturalmente que isso se
verifique.
A BD portuguesa tem sempre a difícil concorrência de
publicações estrangeiras com um maior número de páginas e difíceis de superar.
Para mim, por exemplo, o facto de ter brincado com a Sandbox
do Sérgio, mais do que vale todo o trabalho dispensado. Mas, retirando isso,
espero que o livro venda e que quem sabe, possa fazer com que interessados em
BD possam descobrir a música e obra do Sérgio.
As Leituras do Pedro
- Estão previstas sessões de apresentação/autógrafos?
Fernando Dordio - Serão
as seguintes embora sem data definidas:
- Lançamento no auditório
do Público [no passado dia 25 de Outubro]
- Amadora BD - possivelmente estaremos presentes todos os
fins-de-semana
- Diversas FNAC pelo País (Lisboa, Coimbra e Porto pelo
menos)
- Comic Con Portugal 2017
(imagens disponibilizadas pela editora e pelo entrevistado; clicar
nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)
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